17/12/2010

A propósito da WikiLeaks


Penso que a esquerda, através do meio que tem à sua disposição, que é principalmente a blogosfera, já disse quase tudo sobre a WikiLeaks e a direita já escreveu nos jornais de referência tudo aquilo que a indigna, ou seja, que se tem que preservar a diplomacia dos seus amigos americanos ou, muito mais bem dito, dos países ditos democráticos. Quanto aos que estão no meio, tudo que descredibiliza o seu “cavaleiro andante” José Sócrates e o seu aio Luís Amado provoca-lhe mau estar. Para estes dois últimos grupos a WikiLeaks é uma alvo a abater.

Veio-me à memória sobre este assunto um episódio histórico e um filme que eu acho que se aplicam muito bem a este caso. O primeiro refere-se à divulgação pelo Governo Bolchevique, depois da conquista o poder, em 1917, em plena I Guerra Mundial, de todos os tratados secretos que existiam entre a Entente (França e Inglaterra) e o defunto Governo czarista e que punham a nu os objectivos imperialistas daquelas potências, que em nome de elevados princípios lançavam para a morte milhões dos seus cidadãos. Hoje quando o Império arrasa e destrói dois países – o Iraque e o Afeganistão – é bom que alguém nos desvende os segredos desta diplomacia de morte.

O segundo é um filme muito antigo, que só os da minha idade se recordaram de ter visto, de Alexander Mackendrick, que em inglês se chamava Sweet Smell of Success, mas que passou nos nossos ecrãs com o nome de Mentira Maldita. O filme é de 1957, estreado em Portugal em 1959, e tinha como actores principais Burt Lancaster e Tony Curtis, recentemente falecido. Acusava-se aí um determinado músico de Jazz, não querido da personagem importante desempenhada por Burt Lencaster, de ser “vermelho” e estar na posse de droga, que previamente lhe tinha sido metida na algibeira do sobretudo. A primeira acusação arruína-lhe a carreira e a segunda leva-o à prisão, pela mão do FBI. Quando hoje vimos Assange, o homem do WikiLeaks, ser acusado de ter sexo não consentido com duas mulheres adultas e deste não ser seguro, e por isso ser vítima de um mandato de captura internacional, vem-me à memória aquele filme e como hoje, principalmente na Suécia, as acusações de ser comunista já não arruínam carreiras, nem ninguém vai para a prisão por fumar a sua dose individual de droga. Mas praticar sexo não seguro ou fazê-lo sem este ser previamente autorizado, pode acarretar prisão. Depois vêm os moralistas afirmar que dois juízes, o sueco e o inglês, não prescindiam da sua independência para acusarem Jules Assange. Quem sou eu para duvidar disso, bastava que, tal como no filme, as duas mulheres fossem pagas pela CIA para atestarem toda a veracidade da história, coisa que aos olhos de qualquer cidadão normal não é impossível de acontecer.

Restam duas questões e uma dúvida sobre os dois pesos e as duas medidas do Sr. Pacheco Pereira. A primeira questão dirige-se aos que acham bem que se divulguem as falcatruas dos governos, mas que se deve preservar o segredo diplomático, porque sem isso não havia vida diplomática. Eu diria que todo o segredo é por natureza para ser revelado e que não há telegramas de embaixadas bons e outros maus. Quem é que decide? Para mim é extremamente útil saber que o Sr. Cavaco Silva é um despeitado, que faz política conforme é recebido ou não na sala Oval da Casa Branca, o que só vem confirmar a mediocridade da personagem. Com certeza que o homem do Millennium BCP não gostaria que dissessem que ele se ofereceu como espião aos americanos. Contudo, é extremamente importante saber como actuam os nossos banqueiros. Por isso a fronteira entre diplomacia séria e desonesta é muito ténue. Ao menos que eu possa escolher aquilo que me interessa. Por outro lado, estas revelações aconteceram agora, o Governo americano tomará de certeza as precauções devidas para evitar no futuro situações semelhantes. Não se apoquentem que o mundo não viverá no permanente sobressalto sobre as revelações constantes do segredo diplomático.

A segunda é a crítica de que a WikiLeaks não divulga nada sobre as ditaduras. Já se sabe que certos senhores gostariam de ter informação sobre as ditaduras que não gostam, porque relativamente às amigas dispensavam essa informação. Mas não há todos os dias, para aqueles países que são objecto da raiva do “ocidente”, informação abundante? Quem é que não sabe o que se passa em Cuba, na Venezuela, na Birmânia, na China, na Coreia do Norte ou no Irão? A informação que desconhecemos é sobre o que é que os Estados Unidos ou a UE andam a fazer nas nossas costas, pois sobre aqueles países tudo nos é dito e algumas coisas são mesmo inventadas. Nós sabemos é pouco sobre o que se passa na Arábia Saudita e noutros principados amigos do “ocidente”.

Por último os dois pesos e as duas medidas do Sr. Pacheco Pereira. Não foi ele que mais se entusiasmou com a revelação das escutas telefónicas a José Sócrates? Não achava ele, ao contrário dos socialistas, que sendo elas do domínio público podiam ser discutidas e comentadas? Porque é que agora se amofina tanto, escrevendo um artigo descabido sobre o acesso das massas ao conhecimento generalizado dos segredos diplomáticos? É porque a sua idolatrada América está em causa? É por isso eu falo da duplicidade daquele Sr.
PS. (28/12/10). Mão amiga informou-me, com toda a razão, que não era Entende, mas sim Entente (Entente Cordiale). Já está corrigido. Desculpem qualquer coisinha.

14/12/2010

Uma biografia pouco íntima


Saiu recentemente o livro Álvaro Cunhal, retrato pessoal e íntimo. Biografia, do jornalista Adelino Cunha, da Esfera dos Livros. O seu lançamento revestiu-se de alguma pompa e circunstância: foi apresentado por António Vitorino e na net encontram-se várias referências a esse lançamento, com o discurso do seu apresentador (ver aqui e aqui), e ao acolhimento que o livro teve na imprensa. Chega-se mesmo a mostrar vídeos de alguns dos testemunhos orais que foram recolhidos pelo autor (ver aqui e aqui). No entanto, que eu reparasse, numa consulta provavelmente apressada, ainda não li nenhuma recensão crítica ao mesmo. Sem pretender ser único, aqui vai a minha opinião sobre o mesmo.

Quanto a mim o livro é bastante desigual, notando-se que o autor conseguiu obter informação sobre alguns factos concretos da vida de Cunhal e que sobre outros teve que passar por cima, recorrendo a descrições vagas sobre o movimento comunista internacional, sobre a URSS ou mesmo sobre o PCP. Podemos mesmo dizer que quando falta tema ao autor este se desloca vários anos para a frente ou para trás na vida do Álvaro, pondo-nos um pouco à nora sobre o seu encadeado.
Os primeiros passos de Cunhal na Juventude Comunista e depois no PCP e os primeiros contactos internacionais são fracos e pouco documentados. O mesmo se verifica com a sua estadia em Paris, nos últimos anos que antecederam o 25 de Abril. A parte mais conseguida é a sua terceira prisão que se verificou em 1949, quando residia clandestino no Luso, a fuga de Peniche, em 1960, a vida em Moscovo, com a companheira e a filha, quando o seu partido e ele próprio resolveram que devia sair definitivamente do país, e depois os tempos pós 25 de Abril, mais fáceis de documentar. Mesmo assim, estes muito falhos de informação sobre as últimas conspirações em que se envolve para recuperar o partido e correr com os renovadores, que ameaçavam a sua visão do mesmo.

Os objectivos do livro são traçar o retrato pessoal e íntimo do biografado, mais do que perspectivar a sua vida política, o que não é inteiramente verdade como se verá mais adiante. Para concretizar aquele desiderato socorre-se dos depoimentos da irmã, Eugénia Cunhal, da mãe da sua filha, Isaura Moreira, da própria filha, Ana Cunhal, e de Cândida Ventura, mas isto é um caso à parte, que será examinado posteriormente. No entanto, já na biografia de Pacheco Pereira, com que esta inevitavelmente terá que se confrontar, essa parte íntima também é relatada através do retrato psicológico do Álvaro feitos por aquele autor, simplesmente este pára na fuga de Peniche, não tendo ainda publicado a parte referente ao nascimento da filha e à vida em Moscovo e em Paris e ao pós-25 de Abril. Por outro lado, aquilo que é apontado como novidade neste livro, já Pacheco Pereira o tinha feito, que é a interpretação dos seus romances, assinados com o nome de Manuel Tiago, como sendo, em parte, autobiográficos.

Pode-se dizer que há uma grande empatia entre o autor e Álvaro Cunhal, apesar de estabelecer uma diferença entre o Cunhal da clandestinidade e o dirigente que vive no exílio, na alta-roda do movimento comunista. Já se sabe que, para Adelino Cunha, o primeiro é muito mais genuíno que o segundo. No entanto, verdade seja dita, Cunhal nunca é apresentado como sedento de poder, que teve que destronar Pavel (Francisco Paula de Oliveira), nos anos 30, ou Júlio Fogaça nos anos 50, para poder ser secretário-geral, como é frequentemente referido. E mais, os anos mais negros do partido, com acusação de assassínios de “traidores”, são aqueles em que Álvaro está ausente, por estar preso.

Há em todo o livro uma clara oposição entre o que foram os propósitos do movimento comunista internacional e da própria URSS e os do Cunhal, enquanto os primeiros são sempre criticados utilizando um certo anti-comunismo de pacotilha, o segundo prossegue com objectivos que, mesmo que sendo errados, são suficientemente nobres para poderem ser seguidos pelo biografado. É esta a parte que de certo modo mais confunde no livro e o torna desse ponto de vista desinteressante e, quer queira ou não o autor, ocupam grande parte da sua espessa biografia, de mais de 600 páginas.
Convém realçar, porque é verdade, que na parte final relativa à ascensão de Gorbachev e depois de Ieltsin o autor não se perde em rodriguinhos elogiosos e dá uma visão bastante desencantada deste último período da URSS e depois já da Rússia.

Destaco também os depoimentos de Cândida Ventura e de Santiago Carrillo. A primeira é um caso espantoso, que antes do o ser já o era. Segundo as palavras da própria e do autor, parece que desde sempre (anos 50) já era dissidente, e só se manteve no Partido para ver como é que era, tendo saído unicamente em 1976. Chega mesmo a ser apresentada como agente dupla, não se sabe de quê. Em post anterior já tinha feito referências pouco abonatórias em relação a esta antiga militante do PCP, que na altura da invasão da Checoslováquia pelo Pacto de Varsóvia, em Agosto de 1968, era designada por Flausino Torres, no seu livro póstumo chamado Diário da Batalha de Praga, como a “responsável”. Há uma história pouco clara em relação ao papel desempenhado nessa altura por Álvaro Cunhal. Segundo Cândida Ventura este tê-la-ia avisado de que queriam matar o renovador checo Alexandre Dubcek. Flausino Torres é muito mais peremptório no papel negativo e perfeitamente ditatorial do Álvaro. Acredito muito mais na versão de Flausino Torres.
Quanto a Santiago Carrillo, aparece aqui e acolá, a propósito e a despropósito, fazendo declarações sobre Álvaro Cunhal e o PCP. O autor por possuir essas declarações achou por bem que as tinha que incluir e daí polvilhar o livro com elas.

Restam duas críticas que me parecem importantes. A primeira é a recusa do autor em incluir em notas de rodapé ou no final de cada capítulo a referência de onde foram retiradas as abundantes citações transcritas no livro. Apresenta uma bibliografia final que quanto a mim não é suficiente.
A segunda é a forma descuidada, a carecer de revisão, de algumas referências a datas e a pessoas. O 28 de Maio não foi a 26. O levantamento da Marinha Grande não foi em 1944, mas sim em 34. Do Pacto Germano-Soviético não resultou a anexação da Bielo-Rússia e da Ucrânia. Vasco Gonçalves não foi substituir Otelo no Comando da Região Militar de Lisboa, mas sim Vasco Lourenço. Fala-se da terceira prisão do Álvaro a seguir refere-se a segunda. Buenos Aires em dois parágrafos quase seguidos aparece referida como uma cidade cosmopolita, etc., etc.

Para terminar e para que não digo que só faço crítica negativa, podemos dizer que é um livro agradável de se ler e que facilmente se percorrem as 600 páginas sem especial cansaço ou maçada.

04/12/2010

A minha alma está parva! A Propósito de um comentário do PCG sobre o PCC


Ainda não há muito tempo, a propósito da atribuição do prémio Nobel da Paz a um chinês que estava na prisão por motivos políticos, fiz aqui referência a um artigo de Albano Nunes, publicado no jornal Avante! Esse artigo continha algumas pérolas, das quais destaco: “E a verdade é que a atribuição deste Prémio Nobel é realmente «inseparável das pressões económicas e políticas» sobre a República Popular da China, e a opinião do PCP é a de que essa escolha não tem nada de inocente, antes se insere numa escalada de pressões contra este país que, pense-se o que se pensar sobre a sua política interna e externa, está a resolver colossais problemas de desenvolvimento económico, social e cultural e desempenha um papel crescente positivo na cena internacional.” E continuava: “E é óbvio que não vão no sentido da Paz pressões como as que têm sido exercidas sobre a China para que escancare às multinacionais o seu mercado interno, valorize a sua moeda, aceite normas ambientais que considere incompatíveis com o seu desenvolvimento, limite as suas relações internacionais.
E não é que através de um post de alguém que eu penso que está ligado ao PCP, não vou ter a um comentário do Partido Comunista Grego (KKE) sobre as opiniões de um homem importante do Departamento Internacional do Comité Central do Partido Comunista Chinês (PCC) sobre a Internacional Socialista e o PASOK, o partido socialista que neste momento governa a Grécia e que, tal como cá, é responsável pelas terríveis medidas de austeridade que se abateram sobre aquele país. Esse comentário estava incluído no site Resistir.info, fortemente ligado ao PCP
Este comentário começava logo assim: “É bem sabido que o KKE chegou à conclusão de que estão a desenvolver-se relações capitalistas na China de hoje, com a peculiaridade de que isto está a acontecer sob a liderança política do partido governante o qual usa o título "comunista". E depois continuava “As consequências deste desenvolvimento são bem conhecidas: a elevação da China ao topo dos países com as taxas mais aceleradas de desenvolvimento capitalista e o maior número de multimilionários, a abolição de importantes conquistas dos trabalhadores, tais como cuidados de saúde e educação gratuitas, os quais os trabalhadores têm agora de pagar, e a existência de milhões de desempregados e trabalhadores com baixa remuneração.” E a meio do comentário tinha esta afirmação “As opções anti-povo do governo PASOK são saudadas e apoiadas por responsáveis chineses, na medida em que são combinadas com a abertura da estrada para os monopólios chineses.” E terminava deste modo “Depois de tudo isto, alguém poderia perguntar-se se o PC da China está a ficar pronto para abandonar a sua última "folha de parreira" – o seu título.
Meios bem informados costumam garantir que o nosso PCP está muito próximo do PCG. Pelos vistos não alinham pela mesma cartilha em relação ao PCC e neste caso até me parece que o PCG, ao contrário de muitas outras coisas que afirma, tem toda a razão. Albano Nunes tem que fazer alguma reciclagem, pois pelos vistos as pressões para que a China “escancare às multinacionais o seu mercado interno”, não seriam sobre este país, mas sim deste sobre a Grécia, para que abra a as suas estradas aos “monopólios chineses”.
E para que não se diga que entre os comunistas não há alguma diversidade de pensamento, recomendo-vos o site ODiario.info, onde foi publicado este texto do comunista italiano Domenico Losurdo, que faz grandes encómios à China.
Pelos vistos ODiari.info e o Resistir.info não alinham pela mesma cartilha e o pior é que as opiniões do PCG também não coincidem com a voz avisada de um dirigente destacado do PCP. Que grande bagunça já vai por aquela casa!

02/12/2010

Como o PS, o PCP e a CGTP servem de válvula de escape para a tensão social – Conclusão


As trocas e baldrocas dos partidos do “arco governamental” são conhecidas. No entanto, o CDS ao propor ao PS que este faça parte da possível maioria governamental que se venha a formar, para além de interesses próprios, visa não só forçar este partido a assumir os custos das medidas draconianas que estão para vir, como evita que ele fique à rédea solta na oposição. O PS seria assim um factor de controlo do descontentamento popular, permitindo o isolamento dos chamados partidos do protesto. Mas situações destas têm-se vindo a suceder, com pequenas alterações, desde o 25 de Abril

O que é novo nas declarações referidas no post anterior é o papel que alguns comentadores de direita atribuem agora ao PCP e à CGTP. Os parabéns dados àquele partido são, quanto a mim, bastante embaraçosos. Mas apreciemos a manifestação anti-NATO e a Greve Geral separadamente. Comecemos pela primeira.

De um artigo (parcialmente transcrito aqui) bastante interessante de São José Almeida, publicado no mesmo jornal e no mesmo dia em que Pacheco Pereira escreve o seu, destacamos, porque está relacionado com aquilo que temos vindo a afirmar, esta parte: “É cristalino que está em curso a adopção de um discurso de propaganda que pretende criar um clima de temor às forças de segurança e de isolamento do que pode ser o protesto. Esta estratégia de intimidação é transparente e consiste em passar a mensagem – que é de forma estranhamente acrítica reproduzida pelos jornalistas – de que há manifestantes perigosos e, por isso, é preciso fechar num quadrado sob escolta de polícia de intervenção uma manifestação que é feita pela Marcha Mundial das Mulheres, a ATTAC, as Panteras Rosa, um grupo de rastafári (para quem não saiba é um movimento religioso pacifista) e um grupo de anarquistas, mais um deputado do BE, José Soeiro (um dos mais preparados deputados em exercício) e um militar de Abril (Mário Tomé).” E termina, fazendo eu uma ligação da manifestação anti-NATO à Greve Geral: “A greve geral foi um sinal político do descontentamento que existe já e de como a revolta pode estar latente. É esse medo da rua que leva à deriva securitária que se assiste em Portugal. E que, por mais ridícula que seja, é grave e põe em risco as regras da democracia tal como a conhecemos até hoje.
Ora bem, este artigo, que tem a ver unicamente com a acção securitária da polícia, permite no entanto que se infira que ao se isolar e entregar aos cuidados da polícia a repressão ou a marginalização de “manifestantes perigosos”, está-se a consentir que no futuro seja fácil atacar trabalhadores em greve ou que muito legitimamente façam a sua propaganda ou que organizem piquetes para a mesma. Por isso, faz sentido que José Neves, no Vias de Facto retome, adaptando, o poema sempre atribuído a Brecht, mas que parece não ser dele:

Primeiro levaram os anarquistas,
Mas eu não me importei
Porque não era nada comigo.

Agora levaram-me a mim
E quando percebi,
Já era tarde.


Ora no Avante, de 26/11/10, lê-se isto: “Ao contrário do que muitos anunciaram e outros tantos desejaram, a manifestação decorreu sem incidentes. Não houve sangue, nem distúrbios, nem violência. Não se partiu vidros nem houve carros incendiados, apesar de uns ânimos mais exaltados terem concentrado as atenções de quem, consciente ou inconscientemente, tem por missão transformar o episódio no acontecimento, mostrar a árvore para que não se veja a floresta.
Não é de surpreender que assim tivesse sido. A centena de organizações que promoveu a jornada estava bem identificada, desde a maré rubra das bandeiras comunistas às organizações sindicais, do movimento das mulheres às organizações de reformados, de imigrantes, agricultores, colectividades..., a mostrar que ali estava gente que luta, sim, mas para construir um mundo de paz.
” Como se pode concluir, este texto permite não só que os comentadores de direita agradeçam ao PCP não ter havido distúrbios, nem violência, como favorece o isolamento daqueles que "consciente ou inconscientemente" têm por missão provocá-los. Pode o PCP sentir-se muito incomodado com afirmações daqueles comentadores, não pode é fugir à triste realidade de ser considerado como uma válvula de escapa para a tensão social, colaborando assim "consciente ou inconscientemente" com a direita.

Quanto à Greve Geral podemos dizer que a situação já é diferente. Não tenho dúvidas que os sindicalistas da CGTP se esforçaram ao máximo para que ela tivesse êxito, simplesmente, a manutenção da tradição de no fim de uma greve geral não se fazer qualquer acção de protesto ou de massas, parece-me ser um grave erro, a corrigir em futuras paralisações gerais. Recordo-me que no final dos anos 70 ou início de 80, uma greve da função pública, que acompanhei de perto como sindicalista, terminaria com uma manifestação em S. Bento, que foi desconvocada há última da hora por não se ter comunicado a tempo ao Governo Civil a sua realização. Este facto provocou uma enorme desilusão entre os trabalhadores.
Penso que os agradecimentos à CGTP pelo desenrolar ordeiro da greve se deve bastante à maturidade dos trabalhadores e também ao desejo do Governo de não se intrometer demasiado. Recordo-me também duma greve em que o Ângelo Correia interveio como Ministro da Administração Interna, que ficou conhecida como a revolução dos pregos, já que ele se socorreu de meia dúzia de pregos, inventados ou reais, espalhados numa estrada para acusar os grevistas de intuitos revolucionários. Nesta, a tensão esteve ao rubro e aí a CGTP não foi apontada como o cordeiro manso como agora se verificou, também a força sindical era outra e talvez os dirigentes do PCP tivessem outra têmpera.

Tal como já afirmei em outros posts o que se passou na manifestação anti-NATO e nas acções desencadeadas pela polícia nas fronteiras não auguram nada de bom quer para a esquerda, quer para as liberdades democráticas.

01/12/2010

Como o PS, o PCP e a CGTP servem de válvula de escape para a tensão social – II


Analisadas as declarações sobre o PS, inseridas no post anterior, passemos às que se referem ao PCP e, por tabela, as relativas à CGTP, de interpretação um pouco mais complicada.

Tudo começa quando Pacheco Pereira (PP), na Quadratura do Círculo, de quinta-feira da semana passada (ainda sem link), afirma que foi devido ao PCP que a manifestação anti-NATO e a Greve Geral correram de forma tão pacífica. Não me recordo das palavras exactas, mas este tema foi retomado na crónica que escreve para o jornal Público ao Sábado.
Que afirma PP?
O tónus da luta política não pode contrariar a emergência em que vivemos. Um bom exemplo dessa atitude tem sido tomado pelo PCP, mesmo que não o admita ou enuncie. Na verdade, quer o que se passou na cimeira da NATO, quer o modo como foi conduzida a greve geral mostra que o PCP não pretende radicalizar a conflitualidade, e, bem pelo contrário, actua de forma decisiva, se preciso for, para a conter. Na cimeira da NATO só o comportamento da manifestação do PCP-CGTP e do seu serviço de ordem, em colaboração com a polícia, permitiu o isolamento dos sectores mais radicais que pretendiam aproveitar a presença de um grande número de manifestantes para proceder a violências e destruições. Isolados e cercados pela polícia, que actuou também com grande profissionalismo, os manifestantes violentos não conseguiram provocar qualquer distúrbio significativo, mesmo quando forçaram uma manifestação ilegal. Este facto é excepcional e não se verificava já há vários anos, numa cimeira com esta dimensão e projecção”.
Depois o artigo espraia-se sobre a Greve Geral, e também sobre o papel desempenhado pelo PCP para lhe retirar a conflitualidade social.
Lançado este mote por PP, foi ver de seguida uma série de comentadores a retomarem o mesmo tema. Com alguma malícia Clara Ferreira Alves diz o mesmo, no Eixo do Mal (ver minuto 27,49), “gostaríamos todos que no futuro o descontentamento social seja canalizado desta forma civilizada e organizada e absolutamente decente em que os trabalhadores se limitam, como é seu direito, … a organizarem uma forma de protesto e portanto estamos todos muito descansados enquanto isto for assim, … porque daqui para o futuro as coisas vão ser diferentes”.
Marcelo Rebelo de Sousa, no seu comentário semanal, na TVI, diz claramente que tem que se dar uma palavra de agradecimento ao PCP e à CGTP. “O PCP tem uma coisa boa é um partido disciplinado, certinho. Com o PCP não há arruaças, nem com a CGTP”. Depois, compara o que se verificou em Portugal com o que se passou na Grécia e em França, em que houve desacatos. Por último lembra que a participação da UGT na Greve Geral é indicativo daquilo que espera um governo de centro direita que aí venha, uma união entre o PS, a esquerda moderada, com a esquerda PCP e Bloco de Esquerda, traduzida na acção conjunta da UGT e CGTP.

Este é o tom geral com que a direita, e não estou a incluir aí Clara Ferreira Alves, aprecia a acção “civilizada” do PCP. Em próximos episódios retirarei algumas conclusões que destas declarações e que, segundo constato, não foram ainda comentadas por ninguém.

Como o PS, o PCP e a CGTP servem de válvula de escape para a tensão social – I


Alguns dos links aqui incluídos já estão um pouco envelhecidos, no entanto, achei oportuno mostrá-los para vos dar conta de um conjunto de afirmações feitas ultimamente por comentadores da direita, que a esquerda não pode ignorar.

A 6 de Novembro fazia referência, num post, a três opiniões que, durante aquela semana, mereceram os meus comentários. Fiz dois sobre elas e nunca tive vagar para fazer o terceiro. – Não há nada como ser reformado para se ter falta de tempo. – O último referir-se-ia a declarações de António Lobo Xavier (ALX) e de António Costa, na Quadratura do Círculo (ver minuto 36,45), sobre a indispensável participação do PS na execução de um orçamento tão terrível para o povo português como aquele que na altura tinha sido aprovado na generalidade. Disse António Costa: “o PS tem melhores condições político e sociais para conduzir este processo de consolidação do que o PSD”, e ALX acrescenta: “contra o PS é que é difícil”. Já antes (ver a partir do minuto 31,15) ALX justificava a necessidade de ser o PS a cumprir este orçamento: “é que é muito melhor, inclusivamente do ponto de vista político, fazer tudo o que é possível em articulação com o PS, para que pelos menos este orçamento seja executado”.
Dias depois, no Vias de Facto, João Tunes (JT) chamava a atenção para este artigo de Diogo Feio, do CDS, no Jornal de Notícias. A JT só interessava a sugestão daquele deputado centrista de ser “com recato” que se deviam processar as negociações entre os três partidos do “arco governamental” (PS, PSD e CDS), a mim interessava-me mais esta parte do artigo: “Terão de ser eles a assumir, de forma duradoura e em conjunto, o caderno de encargos. Para isso é necessário que com recato se entendam sobre um conjunto de linhas gerais.
Ninguém pode pensar que uma expectável futura derrota eleitoral do PS leve à exclusão deste partido do arco da responsabilidade. Essa será sempre uma decisão sua, mas também dos restantes partidos do arco de Governo. Esses têm de reflectir hoje sobre a melhor forma de permitir essa inclusão futura, porque nas ruas deverão apenas ficar os partidos de protesto
."

Em todas estas declarações é notório, por um lado, o CDS a puxar pelo PS para ser ele a aguentar as previsíveis dificuldades da governação e, por outro, o PS a oferecer os seus préstimos para essa função.
Aqui temos uma clara união de esforços, uns impõem restrições e outros oferecem-se para as pôr em prática.
Neste cenário o PSD, esquecendo os conselhos avisados do CDS e do patronato, no desejo de abocanhar todo o poder, é provável que dispense o PS desta colaboração.
Tem um próximo capítulo.

26/11/2010

Algumas conclusões políticas para a esquerda da Manifestação anti-NATO e da Greve Geral


Hoje, na sociedade portuguesa, verifica-se um claro fenómeno de crise social, com a pauperização das classes trabalhadoras, de crise económica, com a destruição da indústria produtiva, e política, com a incapacidade do principal partido do Parlamento de governar. Este facto tem acarretado uma crescente radicalização à esquerda. Acresce ainda o clima social vivido em alguns países da EU, tais como a Grécia, a França e a Grã-Bretanha, que tem alimentado o imaginário de certa esquerda. É pois neste clima que se movem os principais actores da esquerda.

Tendo em atenção este facto, torna-se impossível os principais partidos à esquerda do PS poderem contemporizar com este, principalmente com o seu Governo e com o seu chefe incontestado, José Sócrates. O PS pela política defendida e pelas propostas de Orçamento e de PECs apresentadas tem-se vindo a isolar cada vez mais da sua esquerda, praticando uma clara política de colaboração com a direita. Apesar de algumas vozes, que não chegam aos céus dos media, virem regularmente apelar para que se faça mais um esforço de diálogo entre o PS e as forças à sua esquerda, nunca isso esteve tão distante. Daí as dificuldades que a candidatura de Alegre enfrenta.

Como têm o Bloco e o PCP reagido a esta situação? O Bloco apresentando-se cada vez mais como um partido da esquerda não conciliadora, tentando sempre apresentar alternativas que forcem a sociedade portuguesa a evoluir para a esquerda. Há muito que ficaram para trás as causas fracturantes, que facilmente foram recuperadas pelo PS, e se virou para as preocupações sociais e do desenvolvimento económico. Recorrendo a certos chavões da gíria política, tornou-se um partido responsável, reformista e integrado no sistema, apesar de recusar, e bem, qualquer colaboração com o PS chefiado por Sócrates, mas apoiando um candidato da ala esquerda daquele partido, que em tempo oportuno soube dialogar com ele.

O PCP, seguindo na prática uma política semelhante, utiliza na sua definição ideológica e no seu convívio com as demais forças políticas um acentuado sectarismo e esquerdismo verbal, que o arrastam permanentemente para o isolamento, que de um modo geral é procurado, e que no campo internacional o levam a defender as coisas mais indefensáveis. Dai a apresentação de um candidato próprio à presidência da República, sem carisma e sem qualquer relevância política, a não ser dentro do seu partido. Deste facto resulta que na prática as votações do Bloco e do PCP sejam semelhantes na Assembleia da República, mas que depois na vida real não haja quaisquer consequências unitárias ou de acção comum, excepto aquelas que se desenvolvem no âmbito sindical, mesmo aí depois de muitas negociações e de pequenas escaramuças.

A radicalização da sociedade portuguesa acarretou o aparecimento, cada vez com maior visibilidade, do velho esquerdismo, sempre latente desde os anos 60 e 70 na sociedade portuguesa. Hoje simplesmente ele manifesta-se de maneira diferente. Não temos partidos a reivindicarem-se do passado do PCP, mesmo a tentar refundá-lo ou a criar um novo. Temos jovens anarquistas a lutarem contra o sistema ou alguns esquerdistas a assumirem que a luta é contra o capitalismo e não pela sua reforma. Mas temos também, e não tínhamos, ecologistas, mais ou menos radicais, ou apologistas de um viver alternativo à actual sociedade capitalista. Não sendo iguais, conservam igual radicalidade dos tempos antigos. E a crise social e económica do capitalismo tem os vindo a alimentar e a fazer progredir. Em que é que isto se reflecte nas relações destes grupos com os partidos de esquerda com representação parlamentar? Em primeiro lugar, o afastamento de alguma desta gente, os anarquistas nunca lá estiveram, do Bloco. Em segundo, uma recusa total em apoiar Manuel Alegre, o candidato também de Sócrates, como dizem. Em terceiro, uma certa aproximação ao PCP, com a esperança nunca verificada, de que este partido apoiasse um candidato unitário não comprometido com o PS, ou que, dado o seu esquerdismo verbal, os viesse a secundar na sua crescente radicalização social e política.

Em que é que as últimas lutas: manifestação anti-NATO e da Greve Geral, alteraram esta situação? Um maior afastamento dos movimentos radicais do Bloco, considerado um partido do sistema, ao aceitar integrar a parte da frente da manifestação anti-NATO e ao distanciar-se dos grupos que integravam a PAGAN, outra das plataformas que se propunha lutar contra a cimeira daquela organização militar, apesar de alguns dos seus aderentes continuarem a participar nela. E de não terem defendido uma manifestação no final da Greve Geral e terem-se ficado por um espectáculo de variedades na Praça da Figueira. Mas acima de tudo, e anterior àqueles factos, por ser um partido que concentra grande parte de sua actuação no Parlamento e apoia Manuel Alegre.
Em relação ao PCP, apesar de nunca terem morrido de amores pelos comunistas, achavam que teriam alguns pontos em comum. Rapidamente, na manifestação anti-NATO, verificaram o que é a acção trauliteira e sectária do PCP e é vê-los na net a desenterrar todo o conjunto de adjectivos que os seus pais espirituais de há cerca de quarenta anos despejavam sobre aquele partido. Por último organizaram uma manifestação anti-capitalista no dia Greve Geral, que garantem que foi um êxito, seguida de ocupação de uma casa da Câmara que estava devoluta . Tudo acções que não contaram com o apoio da CGTP e por tabela do PCP. A defesa do Francisco Lopes, como candidato à Presidência da República pelo PCP, também não tem contribuído para a sua aproximação àquele partido.

A esquerda está hoje profundamente dividida. Verifica-se de facto uma crescente esquerdização de sectores minoritários da sociedade portuguesa. Espero, no entanto, que isto seja o sinal de que alguma coisa está a mudar, que a correlação de forças será diferente no futuro e que possamos um dia ter a esperança de ter uma “esquerda grande” a governar este país.

25/11/2010

Quinteto Académico



Depois da Greve Geral, não há nada como festejarmos o seu êxito com humor. Descobri esta pequena pérola no blog Blogre

24/11/2010

Ainda as manifestações anti-Nato, algumas reflexões avulsas


Gostaria de começar por uma aforismo inventado por mim: quem anda metido em casa alheia dificilmente trata da sua. Vem isto a propósito de, depois de ter tratado com algum desenvolvimento a prisão de um espanhol e de uma portuguesa na fronteira do Caia e as notícias que sobre o assunto apareceram nos media, deixei por alguns dias de escrever sobre as prisões, a repressão e as manifestações ligadas à cimeira da NATO, em Lisboa. Tudo isto porque andei a consultar blogs alheios e a escrever comentários numa série deles. Quase parecia o Vítor Dias que, apesar de ter o seu sempre actualizado, não perdeu nenhuma ocasião de combater os “heréticos” que se pronunciaram sobre o assunto.

Podemos dizer que os dias que antecederam a cimeira só vieram confirmar aquilo que eu escrevi anteriormente. A fonte da contra-informação foi a polícia, que não perdeu nenhuma oportunidade de se pronunciar e de impedir a entrada de manifestantes estrangeiros só porque traziam comunicados anti-NATO (ver aqui), e a comunicação social que reproduziu passivamente os pontos de vista daquela força, quando não açulava a sua intervenção. Como Glórias do Jornalismo Português, retirando aqui o título ao Vítor Dias, há que destacar, não por mim, mas num comentário ao post do José Neves, esta reportagem de Sandra Felgueiras para o Telejornal da RTP (ver minuto 32.28) que, com grande acinte, dizia, no final da mesma, que os manifestantes, não “oficiais” (digo eu), já estavam “embriagados” ou ainda a reportagem de Paulo Moura, no Público, saborosamente comentada por José Neves.
Há que destacar igualmente as actividades de José Manuel Anes, já por mim referenciado em vários posts, que na TVI, na 6º feira ao almoço, teve o desplante de afirmar, depois de ter garantido que os Black Bloc já cá estavam todos, afinal não tinham vindo por falta de fundos, reproduzindo uma notícia do Público desse dia.

Dito isto gostava de relembrar como é que terminava um dos meus posts anteriores: “mas o que é verdadeiramente grave e atentatório das liberdades é a recomendação” – de um major da polícia – “de que os manifestantes devem evitar a "associação a grupos com cariz anarco-libertário". Então já é o major que decide quem é que participa na manifestação?
E não é que decidiu mesmo. E pior ainda, com a colaboração do serviço de ordem da manifestação do grupo Paz sim! NATO Não!. Sem querer relatar nada, porque não estive lá, por razões que não vêm ao caso, remeto para as descrições de dois jovens amigos em quem deposito toda a confiança, uma é a do José Neves, já por mim atrás referida, e outra do Ricardo Noronha.

Para terminar gostava de fazer algumas reflexões finais. O Bloco de Esquerda foi muito criticado por ter participado na parte da manifestação que se agrupava debaixo da plataforma Paz Sim! NATO Não!, ficando assim “credenciado”, segundo a expressão de um dos membros do serviço de ordem daquele grupo, para poder descer a Avenida. Se é certo que nem todo o Bloco esteve aí. Foi referido publicamente, que o Mário Tomé, o deputado José Soeiro e outros, que eu vi na reportagem da SIC, foram na manifestação enquadrada pela polícia, a direcção do Bloco, no entanto, estava na da frente. José Neves e também outros, fazem referências depreciativas ao seu local de participação. José Neves descreve mesmo com alguma ironia o que foi a história do PSR, um dos grupos fundadores do Bloco. Eu, e porque ouvi o Louçã falar sobre este assunto, compreendo um pouco a posição do Bloco. Há alguns tempos para cá que nas manifestações ditas unitárias ou organizadas pela CGTP começa a haver a preocupação de tentar impedir a entrada do Bloco ou deste só desfilar quando os organizadores entendem. Ou seja, correspondendo ao agravamento sectário do PCP, há cada vez maior preocupação em escorraçar o Bloco, de o atirar para fora das manifestações. É nesse sentido, que o Bloco não pode de modo algum tolerar que haja donos das manifestações, por isso força a sua participação e evita isolar-se do conjunto dos manifestantes. Tenho quase a certeza que foi este o caso. No entanto, há quem ache que isto é uma cedência. Eu penso o contrário.

Por último discordo profundamente deste tipo de prosa publicada no blog Arrastão: “… o braço sindical do PCP, a CGTP, se tornou a central sindical do regime, institucionalizada e pronta a pegar em armas de forma controlada e ordeira, quais cordeiros arrebanhados pela força das circunstâncias.” Para além de revelar algum esquerdismo sectário, permite placidamente que se instale nas pessoas a ideia que a CGTP é do PCP, quando ela é a arma sindical dos trabalhadores e é a única força unitária de que dispõem. Quanto mais se disser que ela é do PCP mais este se convence que é verdade. A nossa luta é para que ela se transforme numa verdadeira Central Sindical de todas as forças que nela participam.

Pensava também fazer uma crítica aos “belos” pedaços de prosa que o Vítor Dias foi espalhando por diferentes blogs em comentários aos vários posts “heréticos”, mas como a nossa caturrice não leva a lado nenhum, por aqui me fico

23/11/2010

Greve Geral


Eu não posso fazer, porque já estou reformado. Mas fiz muitas e organizei, no meu local de trabalho, algumas. Há todas as razões para ser feita. Que seja um êxito!

18/11/2010

Quando as polícias são a fonte da contra-informação e os jornalistas os seus divulgadores passivos


Depois de ter escrito o post anterior sobre a detenção de um espanhol e de uma portuguesa que transportavam “armas brancas” e “panfletos anarquistas e anti-polícia”, segundo as próprias palavras de quem os deteve – facto que eu desconhecia –, resolvi perder umas boas horas a fazer uma pesquisa no Google para saber o que é que os media tinham de facto dito, já que me baseei unicamente no que vi na TV, em algumas notícias do Público, as mais inócuas, e numa notícia da TSF, que transcrevi.

A primeira conclusão que tirei é que, com pequenas variações, todos as notícias repetem o mesmo, tendo sido provavelmente cozinhadas com a ajuda dos faxes da Agência Lusa. Depois, percebe-se que a principal fonte de informação é a GNR, até posso citar um oficial que deu as informações (ver TSF ) e provavelmente do SEF (ver vídeo da TVI 24). Aquilo que eu no post anterior denominei acções de contra-informação do Governo e da Nato são de facto destas duas polícias. As TVs têm mais informação porque enviaram ao local, neste caso à fronteira de Caia, jornalistas que relatam in loco, entrevistando os oficiais da GNR ou do CEF, as informações ou desinformações que estes queiram prestar.
Fica claro que na noite de segunda para terça-feira, por volta das 4h00 da manhã, foram presos um espanhol e uma portuguesa, que se dirigiam para Portugal por aquela fronteira. Há uma reportagem da SIC (a mais completa que conheço e que vale a pena ver) em que se diz que eles vinham no Expresso Madrid Lisboa, quase todas as outras garantem que vinham num carro. Uma tal jornalista do Diário de Notícias, chamada Valentina Marcelino, afirma que foi por encontrarem roupas negras no porta-bagagens que a polícia desconfiou que eles pertencessem ao Black Bloc e os recambiou para o outro lado da fronteira. Esta jornalista manifesta uma clara imaginação, parece que já é contumaz, pois a sua descrição não corresponde ao que foi declarado pelas polícias.
É provável que Valentina, de mãos dadas com José Manuel Anes, queira confirmar a tese daquele de que eles já estavam todos cá.
Portanto, o que se sabe é que depois de uma revista ao porta-bagagens do carro, foram encontradas armas brancas. Na reportagem da SIC já referida vêem-se as armas, a tal catana de 40 cm - se alguém souber o que é uma catana, uma que só tenha 40 cm é bem pequena - depois uma navalha tipo borboleta, que eu não sei bem o que seja, e um estilete, também pequeno. Foi por isto que a maioria das notícias afirma, e provavelmente de acordo com a rádio Elvas, que estes cidadãos foram levados a tribunal e numa acção sumária foram condenados a pagar 1800 euros, cada um, e às custas judiciais, que ficaram pelos 500 euros. O tribunal recusou-se a confirmar esta notícia. Logo a seguir o cidadão espanhol foi expulso para Espanha e, de acordo com as declarações de um GNR feitas para uma televisão, estas já escutadas por mim, a cidadã portuguesa acompanhou-o.
Resta no meio disto tudo a informação prestada pela GNR e pelo CEF sobre os panfletos. Alguns jornais chamam lhes cartazes, mas aquilo que foi mostrado na tal reportagem da SIC são panfletos, que eram de má qualidade porque eram fotocópias, o que não é razão, e estavam escritos em espanhol – óptimo para convencer portugueses. Naquele que nos é mostrado vê-se um polícia, mas não se consegue ler o que lá está escrito, no entanto a SIC sublinhou duas frases, uma: “torturam, maltratam e gozam de impunidade”- veja-se o caso do cantor negro rapper que foi assassinado numa operação stop - a outra “eles expulsam emigrantes” - parece que não é verdade -. Já se sabe que, pela voz das tais entidades, os panfletos são de cariz anarquista – esta do cariz é minha – e anti-polícia a que alguns acrescentam com apelos à violência. Como eu já vos tinha afirmado no post anterior, quer numa reportagem da SIC Notícias, quer na TSF, desaparece o termo anarquista e os panfletos passam a ser só anti-polícia. Hoje reparo que isso se verifica em mais locais.
Concluindo, desconheço qual a legislação que impede a entrada de cidadãos estrangeiros indesejáveis e o que é que está estabelecido nos acordos que aboliram as fronteiras em alguns países da EU. Não sei também o que é que a lei estabelece sobre o que se considera armas brancas que não se podem transportar, penso que também deve haver definições para isso. Se eu levar para um piquenique uma faca, posso ser acusado de transportar uma arma branca? Se a polícia embirrar comigo provavelmente sou. Ou se tiver um canivete suíço, daqueles que têm múltiplas funções, também estarei ao abrigo de tal legislação? De avião sei que nos impedem de transportar as coisas mais mirabolantes.
Agora o que não se pode acusar ninguém é de transportar panfletos anarquistas, e dessa coisa indefinida, que é ser anti-polícia. Ainda ontem na SIC um cidadão se queixou que tinha sido barbaramente agredido numa esquadra, porque o confundiram com um ladrão. Isso não será propaganda anti-polícia. E mesmo que o panfleto fizesse apelo à violência, coisa muito discutível, só um tribunal e de acordo com a lei, se ela existir, poderá definir e julgar se isso é ou não crime.
Tudo o que foi dito e escrito é um exemplo, dos velhos métodos da PIDE, de que a polícia nunca se libertou, e de um jornalismo vendido e passivo capaz de aceitar como boas as justificações das polícias. Ou seja, se a polícia prende um cidadão e o recambia para o seu país de origem por transportar cartazes anarquistas e o diz publicamente está a socorrer-se dos velhos métodos de prender alguém por transportar propaganda subversiva. Compete aos jornalistas quando dão a notícia dizer que isso não é crime e que essa nunca poderá ser uma boa razão para prender alguém. Algum jornalista disse isso?

Gostaria de terminar com estas afirmações de um major da PSP que em relação às manifestações que estão previstas, e que obedecem ao que está estipulado na lei, recomenda que ninguém pode andar de cara e cabeça tapadas. Esta última é uma exigência perfeitamente absurda, porque eu tenho frio na cabeça e preciso de usar boné ou chapéu. Também não se pode levar objectos cortantes ou contundentes, admito. Mas o que é verdadeiramente grave e atentatório das liberdades é a recomendação de que os manifestantes devem evitar a "associação a grupos com cariz anarco-libertário". Então já é o major que decide quem é que participa na manifestação?

É por estas e por outras que é necessário defender a todo o custo a legalidade democrática e poder a todo o momento dizer ao major, e a todos os GNRs e SEFs de Portugal, que a PIDE já foi extinta e que não toleramos métodos semelhantes.

17/11/2010

Lisboa em Estado de Sítio ou a maior manobra de manipulação dos media


Vai realizar-se em Lisboa uma cimeira da NATO nos dias 19 e 20 próximos. Não vou discutir aqui, será fácil perceber a minha opinião, a razão da existência da NATO e o porquê desta cimeira em território nacional, quero só abordar as medidas tomadas e o controlo estrito da informação que tem sido realizado.

Em primeiro lugar as medidas que vão ser tomadas parecem colocar o país, e particularmente Lisboa, em Estado de Sítio. Não me sentia assim desde o 25 de Novembro, quando a partir de certas horas era proibido circular em Lisboa.
Mas não é só isso. Hoje foi noticiado que tinham sido detidos na nossa fronteira um espanhol e uma portuguesa, por transportarem armas brancas e comunicados anarquistas. Quanto às armas, pela descrição feita, pareceram-me canivetes de limpar as unhas, quanto aos comunicados, de repente pareceu-me voltar aos tempos dos comunicados da PIDE, que afirmavam que uns tantos indivíduos tinham sido apanhados na posse de propaganda subversiva. Verdadeiramente, não há nenhum jornalista que confronte o oficial da GNR que fazia estas declarações, se neste pais está proibida a propaganda anarquista – é mais fácil confrontar o primeiro-ministro com perguntas parvas do que um oficial da GNR –. Não podemos tolerar situações deste género. O regime democrático garante a liberdade de expressão. Os meios de informação, especialmente as televisões, transformaram este atentado às nossas liberdades numa situação banal, que merece repressão por parte das autoridades.

O segundo ponto, tem sido, além da constante exibição dos treinos das polícias, a espantosa subserviência dos jornalistas, pelos menos da RTP, ao irem interrogar os lojista da Baixa e da Avenida da Liberdade se não têm medo das manifestações, nem que lhes partam as montras. Nenhum jornalista sério foi capaz de dizer que há uma manifestação que foi comunicada à polícia, e que portanto se pode realizar, marcada para o dia 20, que decorre entre o Marquês de Pombal e o Rossio. Mais, nenhum jornalista, pelo menos da RTP, foi interrogar os promotores desta manifestação, perguntando-lhe as razões da mesma e se eles não têm um serviço de ordem que assegure o bom desenrolar da mesma. Não houve, que eu tenha conhecimento qualquer contraditório em relação à NATO e à realização da cimeira em Lisboa. Mais, tem-se insistido até à exaustão na possibilidade de desacatos e de haver manifestantes anti-globalização e anti-NATO que provoquem distúrbios.

Tal como eu já tinha alertado José Manuel Anes, que na juventude era uma marxista convicto, e que actualmente, além de pertencer a essa associação secreta chamada maçonaria, é presidente da direcção do Observatório de Segurança Criminalidade Organizada e Terrorismo (OSCOT), veio mais uma vez dizer uns dislates para a televisão e não só (ver aqui e aqui), e o pior é que lhe deram tempo de antena. Garantiu que já estavam no nosso país militantes anarquistas prontos a fazerem distúrbios. Há quem me garante que o “rapaz” é simpático, eu quando era jovem também o achava, hoje não passa de um mero provocador, pronto a colaborar com o terror instalado.

Quero ver se ainda se vai realizar algum programa na televisão de debate entre quem é pró-NATO e anti-NATO – que belo tema para o Prós e Contras, de 2º feira. Pelo que se está a ver, todo o mundo sensato é a favor da NATO, o resto são uns desordeiros prontos a atentar contra ordem estabelecida, que até transportam comunicados anarquista. Estamos pois perante a maior operação de desinformação que tenho assistido. A isto o Sr. Pacheco Pereira nada diz.

PS. (às 16h15): já hoje, no noticiário das 11h00, da SIC Notícias, uma locutora depois do GNR ter dito que duas pessoas tinham sido detidas por posse de arma branca, perguntou de seguida se também pelos comunicados anti-polícia. Aqui o GNR resolveu desconversar e dizer que serão detidos todos aqueles que viessem com objectivos de provocar distúrbios – não sei como os distinguem. Portanto, os panfletos anarquistas já se transformaram em anti-polícia: coisa que verdadeiramente eu não sei o que seja. Deve ser de algum sindicato de GNR que não gosta dos seus comandantes. Mas o que é mais espantoso é que esta pergunta, que eu pensei que resultasse da alta congeminação da jornalista, estava também incluída numa notícia da TSF. Portanto, vem provavelmente via Agência Lusa. Ou seja, o Governo ou a sua Central de Contra-Informação, achando ridículo que se prendesse alguém por transportar comunicados anarquistas, transformou-os em anti-polícia. Temos portanto jornalistas que puseram a sua independência informativa ao serviço da contra-informação governamental e da NATO.

15/11/2010

Um blog a seguir: A Essência da Pólvora


Estou em dívida para com os meus leitores sobre uma terceira questão que queria abordar há duas semanas atrás. Depois meteu-se esta minha participação no colóquio que vos referi e no presente, com a evolução rápida dos acontecimentos, já não faz grande sentido.
Quero-vos falar hoje numa actualização que fiz na lista dos Blogs que consulto quase diariamente. Acrescentei o blog A Essência da Pólvora, em que colabora um antigo companheiro das lides do Cine-Clube Universitário de Lisboa, o Brissos (J. Eduardo Brissos), que apesar de me parecer estar um bocado focado para as questões de Loures, tem textos sobre política geral com interesse. Tal como eu, inseriu uma pequena homenagem à Revolução de Outubro. Numa altura em que só o PCP, por questões institucionais, comemora Outubro, é já raro a outra esquerda fazê-lo. Uns até já lhe chamam golpe de estado e outros limitam-se a comemorar a Queda do Muro de Berlim.
Aproveitei para limpar dois blogs que por razões várias não funcionavam, um referente à Esquerda.net, provavelmente porque mudou de endereço electrónico e eu não me actualizei, e o outro, o blog ligado ao Não Apaguem a Memória, que já há muito tinha deixado de existir. É evidente que o primeiro será mantido na zona dos Sites e revistas de esquerda.
PS. (17/11/10)
: Provavelmente por ter Memória no seu título, distraí-me e apaguei dos Blogs que consulto quase diariamente o da Joana Lopes, Entre as Brumas da Memória. À autora as minhas desculpas. Já está reposto.

14/11/2010

O PCP e a Revolução Democrática Nacional

Texto da minha comunicação ao 3º Colóquio Comunistas em Portugal, 1921-2010

Resumo:
Pretende-se provar que o PCP ao inscrever no seu Programa, aprovado em 1965, os oito objectivos da Revolução Democrática e Nacional, que visavam derrubar o fascismo e instalar um regime democrático, sem monopólios e sem a subordinação ao capital estrangeiro, se socorreu do conceito de “etapas intermédias”, que foi inicialmente formulado no VII Congresso da Internacional Comunista (1935) e pelo movimento comunista internacional, ao defender a formação de Frentes Populares e depois, já durante a II Guerra Mundial, de Frentes Nacionais. Este conceito abandonava ou relegava para mais tarde a ideia leninista de revolução socialista imediata. O abandono deste conceito trouxe sem dúvida consequências ao nível da actuação do PCP durante a revolução de Abril e que estão expressas na presente intervenção nas declarações iniciais de Lenine ao chegar a Petrogrado e de Álvaro Cunhal, a Lisboa. Por outro lado, confronta-se esta posição anteriormente assumida pelo PCP com a divulgação recente entre os militantes daquele partido de um texto do PC Grego (KKE) muito crítico da defesa daquelas etapas intermédias e das alianças de classe que daí resultam.


I – Agradecimentos e Esclarecimentos

Antes se mais queria agradecer à Ana Barradas e ao grupo da Política Operária o amável convite que me fizeram para intervir neste 3º Colóquio sobre os Comunistas em Portugal, 1921 – 2010.

Queria começar por fazer alguns esclarecimentos prévios:

Primeiro – não sou historiador profissional, nem me arrogo a sê-lo. Tenho lido e reflectido sobre os temas ligados ao movimento comunista internacional, ao Partido Comunista Português, onde militei mais de 40 anos, e principalmente sobre a Revolução de Abril, que vivi intensamente, quer no PCP, quer no meu local de trabalho. A minha profissão de toda a vida foi a de biólogo. Estou hoje reformado dela, mas não da política.

Segundo – quando me pediram para colaborar neste colóquio disse logo, que não iria fazer nenhum trabalho original, mas sim socorrer-me de um post em duas partes que tinha feito para o meu blog, Trix-Nitrix, e que depois publiquei, quase na íntegra, no site Comunistas.info, do movimento Renovação Comunista. O texto original chamava-se O PCP, a Revolução Democrática e Nacional e o rumo ao socialismo – Algumas contribuições para a caracterização do 25 de Abril.
Os organizadores deste colóquio entenderam, e bem, dada a extensão do meu texto original, resumir a minha intervenção unicamente a O PCP e a Revolução Democrática e Nacional. Nesse sentido, refiz o texto original na parte dedicada àquela Revolução, tendo-lhe acrescentado algumas opiniões e informações recentes. Porque inicialmente foi divulgado um resumo do meu texto que, socorrendo-se de palavras minhas, não correspondia à comunicação que eu acabei por elaborar, pedi, há última da hora, a sua alteração, o que fui prontamente atendido. Quero pois agradecer à Ana Barradas e à Política Operária este seu último esforço.

I – A chegada de Lenine e Cunhal do exílio

O texto inicial de que me estou a socorrer começava por estabelecer uma clara diferença entre a chegada de Lenine à Estação da Finlândia, regressado do exílio, depois da Revolução de Fevereiro de 1917, que tinha tido lugar na Rússia, e a chegada de Álvaro Cunhal ao aeroporto da Portela, em Lisboa, pouco depois do 25 de Abril de 1974. Se para muitos de vós é clara a diferença, além de alguma semelhança formal, resultante de serem dois exilados que regressavam depois de transformações revolucionárias nos seus países, já para a reacção e especificamente para Zita Seabra e Vasco Pulido Valente, isso não sucede. Fazem comparações descabidas. Afirmam, que os discursos de Lenine e Cunhal foram pronunciados de cima de tanques e que eram um claro apelo à revolução comunista. Isto poder-vos-á fazer sorrir, mas estes senhores andam há anos a difundir esta balela.
Lenine, ao contrário do que é correntemente escrito, fez dois discursos, um ainda dentro da estação e outro no largo exterior, aí de facto em cima de um tanque. Cunhal só falou no exterior do aeroporto, de cima de um tanque, por sugestão, segundo Victor Dias, no seu blog, de Jaime Neves, e depois de ter obtido por troca de olhares e de acenares de cabeça o consentimento de Direcção do PCP, que estava no Interior (declarações de Carlos Brito). Simplesmente, enquanto que Lenine, que estava incomodado com a delegação que o estava a receber, pois além de camaradas, era gente do Governo Provisório, que ele não apoiava, e do Soviete de Petrogrado, na altura dominado ainda pelos mencheviques, proclamou logo no seu discurso a transformação da guerra imperialista (a I Guerra Mundial) em guerra civil dos povos contra os seus exploradores capitalistas e deu vivas à revolução mundial socialista. Álvaro Cunhal, pelo contrário, não só defendeu alguns dos pontos da Revolução Democrática e Nacional, como outros ligados ao momento que então se estava a viver: como a defesa da acção legal dos partidos políticos e o fim da guerra colonial, terminando o seu discurso com uma saudação ao MFA e à Junta de Salvação Nacional. É evidente que as situações eram completamente diferentes e a vontade dos seus intervenientes também era diferente, simplesmente é uma completa mentira falar do apelo de Cunhal à revolução Comunista.

II – Revolução Democrática e Nacional

A Revolução Democrática e Nacional (RDeN), com este nome e com as características a seguir definidas, foi inicialmente defendida por Álvaro Cunhal no relatório denominado Rumo à Vitória – As tarefas do Partido na RDeN e que foi apresentado ao Comité Central do PCP, em Abril de 1964, com vista à preparação do VI Congresso PCP, que teria lugar no ano seguinte. A RDeN seria incluída no novo Programa do Partido, aprovado naquele Congresso.
Eram oito os objectivos fundamentais da RDeN: “instaurar as liberdades democráticas destruindo o Estado fascista e instaurando um regime democrático, liquidar o poder dos monopólios, realizar a reforma agrária, realizar uma política social que garanta a elevação do nível de vida das classes trabalhadoras, democratizar a instrução e a cultura, libertar Portugal do domínio imperialista, reconhecer e assegurar aos povos das colónias o direito à autodeterminação e à independência, adoptar uma política de paz e amizade com todos os povos”.
Assim, segundo Álvaro Cunhal a revolução antifascista seria sinónimo de democrática e nacional e esta só seria alcançada quando todos aqueles objectivos fossem realizados. Por outro lado, e isso é importante, considerava-se que na etapa actual (1965) a revolução era democrática e nacional, que é uma etapa primeira e necessária para a revolução socialista.
É evidente que esta caracterização resultava em primeiro lugar da definição do que se entendia por fascismo: “ditadura terrorista dos monopólios (associados ao capital estrangeiro) e dos latifundiários”. E em segundo lugar de uma análise de classes que opunha “os grandes grupos monopolistas e latifundiários dominantes às restantes camadas e classes da população”. Daí a designação da RDeN como “anti-monopolista e anti-imperialista”.
É evidente que a definição de fascismo não é nova, nem a caracterização das classes em confronto. No VII Congresso da Internacional Comunista (1935) a definição de fascismo tem contornos semelhantes: “ditadura terrorista declarada (aberta) dos elementos mais reaccionários, chauvinistas e imperialistas do capital financeiro”, a que alguns partidos com maior peso de camponeses, acrescentaram “e dos latifundiários”.
Para iniciar a concretização da RDeN e derrubar o fascismo o Programa do PCP apontava para o levantamento nacional, a insurreição popular armada, que no Prefácio à Acção Revolucionária, Capitulação e Aventura, de Cunhal, e mais de acordo como que se tinha sucedido no 25 de Abril, passa a ser uma insurreição militar e popular.
Álvaro Cunhal considera ainda em A Verdade e a Mentira na Revolução de Abril (A contra-revolução confessa-se) que “a RDeN não estava prevista nos manuais de ciência política, nem na história das revoluções. O programa do PCP foi de facto o programa de uma revolução original, porque original era a situação do país”.
Esta última afirmação parece-me um nítido exagero vinda de quem, como Álvaro Cunhal, conheceu bem, porque delas teve conhecimento directo, ao participar VI Congresso da Internacional Juvenil Comunista, em Moscovo (Setembro-Outubro de 1935), das discussões travadas, no mês anterior, no VII Congresso da Internacional Comunista (IC), que se realizou entre Julho e Agosto de 1935, igualmente em Moscovo. Mas mais do que isso, integrou, como o próprio afirma, a delegação portuguesa, chefiada por Bento Gonçalves (à época secretário-geral do PCP) que discutiu com o Comité Executivo da Internacional Comunista algumas das questões principais desse Congresso. Nele foram assinalados, com o devido relevo, os perigos da ameaça fascista, que até aí tinham sido minimizados pela IC, e foi proposta uma aliança com a social-democracia, com vista à formação daquilo que depois se viria a denominar por Frentes Populares. Esta nova orientação, encabeçada por Dimitrov, veio a suceder a um período ultra-esquedista da IC (1929-1934).
Já na preparação daquele Congresso, e recorrendo a um texto oficial da altura, é afirmado “que a palavra de ordem de luta directa pela ditadura do proletariado não se adequava às condições reinantes em muitos países capitalistas. O socialismo continua a ser a meta final do movimento, mas devemos ter um programa de luta mais concreto, que não aponte logo para a ditadura proletária e o socialismo, mas que leve as massas à luta por esses objectivos finais”. E mais adiante torna-se a afirmar “que o processo revolucionário nos países capitalistas não avançaria imediatamente e directamente através da revolução socialista, mas que se aproximaria dela através da etapa da luta democrática geral contra o fascismo”.
Como vemos, e devido à implantação do fascismo numa série de países com diferentes graus de desenvolvimento capitalistas, a ideia de uma etapa intermédia entre a situação de ditadura fascista e o socialismo, que ainda nessa época era sinónimo de ditadura do proletariado, foi desenvolvida e explanada no VII Congresso da IC.
A própria experiência histórica do PCP permite-nos afirmar que, no início dos anos 30, a prática defendida tinha muito ver com a via insurreccional para concretizar a revolução socialista e a instauração da ditadura do proletariado, de acordo com a orientação seguida então pela IC e aplicada por todo os partidos aderentes. A greve geral de 18 de Janeiro de 1934, contra a fascização dos sindicatos, e a ocupação insurreccional da Marinha Grande pelos grevistas, eram devedoras desses objectivos, que resultavam igualmente da influência do movimento anarco-sindicalista no movimento operário. A Revolta dos Marinheiros que se registou em Setembro de 1936, e que foi prontamente subjugada pelo fascismo, é o último reflexo entre nós dessa concepção. Com o regresso de Bento Gonçalves, que foi preso logo a seguir à sua chegada do VII Congresso da IC, a nova estratégia aí defendida é encarada pelo PCP, com todas as dificuldades que resultavam da prisão do seu secretário-geral, chegando a propor-se a formação de um Frente Popular em Portugal, que não teve sucesso. As propostas unitárias de luta contra o fascismo, com a aplicação das novas orientações, só foram levadas à prática com êxito, primeiro, com a criação do MUNAF (1943) e depois do MUD (1945).

Posteriormente, durante a II Guerra Mundial, a experiência das “frentes populares” foi enriquecida com a formação das “frentes nacionais” nos diversos países onde se lutava contra o fascismo. Recordo que as “frentes nacionais” estiveram posteriormente na origem dos países de “democracia popular”, que se formaram no final da Guerra, dentro da área de influência da União Soviética. As “frentes nacionais” englobavam os movimentos comunista, socialista e social-democrata, mas igualmente forças mais à direita e que se opunham ao nazi-fascismo, como o degaullismo em França.

Para uma melhor caracterização do que temos vindo a dizer, mas de outro ponto de vista, gostaria de transcrever uma declaração do Partido Comunista da Grécia, a propósito do 90º aniversário da Grande Revolução Socialista de Outubro (2007), em que se afirmava: “No Ocidente capitalista, os partidos comunistas não puderam elaborar uma estratégia de transformação da guerra imperialista ou da luta de libertação numa luta pela conquista do poder operário. Eles remeteram o objectivo do socialismo para mais tarde e definiram tarefas que se limitavam à luta na frente contra o fascismo. O ponto de vista que prevalecia na altura, sustentava que era possível a existência de uma forma intermédia de poder, entre o poder burguês e o poder da classe operária revolucionária, com a possibilidade de vir a evoluir para um poder operário.” Ou então, esta outra: “A política seguida por um bom número de partidos comunistas que consistia em colaborar com a social-democracia, fez parte da estratégia da «governação anti monopolista», uma espécie de estado intermédio entre o capitalismo e o socialismo, que se expressava igualmente através de governos que tentaram administrar o sistema capitalista.
Esta declaração mereceu, já na nossa década, ampla divulgação em alguns blogs de militantes do PCP, e serviu mesmo de texto de formação ideológica dentro do próprio partido. É um fenómeno estranho a sua actual popularidade, porque não só critica, mesmo que indirectamente, as posições assumidas pelo PCP em defesa da RDeN, como parece ser a reprodução ipsis verbis das afirmações de Francisco Martins Rodrigues, um dissidente do PCP dos anos 60, já falecido, no seu livro Anti Dimitrov – 1935-1985: meio século de derrotas da revolução. Como se vê, a vida dá muitas voltas.

É interessante que, depois de já eu ter escrito o post inicialmente referido, fui encontrar no livro de Carlos Brito, “Álvaro Cunhal, sete fôlegos de um combatente” um texto do informe de Cunhal ao III Congresso do PCP, de 1943, em que este escreve: “Nós tornamos bem claro que sempre fomos e continuamos sendo pelo Poder Soviético. Mas as condições não estão maduras para a Revolução Proletária. Todas as energias e todas as forças se devem unir no momento presente para bater o inimigo comum – o fascismo”, o que reafirma tudo aquilo que temos vindo a dizer.
Para Carlos Brito o primeiro grande fôlego da Álvaro Cunhal foi sem dúvida o Rumo à Vitória, de 1964, onde era plasmada a situação política portuguesa e as tarefas indispensáveis para o derrube do fascismo e a proposta da Revolução Democrática e Nacional como tarefa central a realizar a seguir à queda do fascismo. Brito afirma mesmo: “O eixo ideológico central do Rumo à Vitória é a Revolução Democrática e Nacional, uma criação teórica a que Álvaro Cunhal chegou depois de profundo estudo sobre a realidade do país, que lhe permitiu fixar a etapa da revolução portuguesa e as respectivas tarefas no processo mundial”.

Retomamos aqui a originalidade de RDeN já defendida por Cunhal e que anteriormente critiquei. No entanto, ainda muito recentemente, num livro com vários autores, todos eles dirigentes do Bloco de Esquerda, Os Donos de Portugal, se faz referência à proposta da RDeN como tendo “em vista uma aliança anti-monopolista abrangendo, para além dos trabalhadores, o campesinato e a pequena e média burguesia do comércio e da indústria. A Revolução não visava apenas substituir a ditadura fascista pela democracia. Iria mais além. O Estado sob a coligação das forças progressistas, tomaria conta dos grupos económicos industriais e financeiros e expropriaria o capital estrangeiro.
Percebe-se hoje que essa seria a última hipóteses do projecto de Fomento, daquilo que se convencionou chamar “o projecto nacional desenvolvimentista”, do desenvolvimento da indústria, da reforma agrária, da substituição das importações, já sem colónias, nem o sorvedouro da guerra colonial, em vidas e orçamento. Um Estado auto-suficiente, com a revolução industrial clássica completa. Da mina à máquina complexa.
Era… a chamada do proletariado à primeira linha da ideologia do Fomento. Apontando para uma etapa de uma democracia progressiva, prévia a um esperado e ulterior regime socialista, cuja transição era indefinida e indefinível. Até porque
segundo Cunhal, no Rumo à Vitória
a liquidação do poder dos monopólios terá de ser acompanhada por uma política de rápido desenvolvimento industrial, onde a direcção superior do Estado não só não exclua como anime a iniciativa das empresas privadas”.
Esta longa citação confirma tudo aquilo que vimos dizendo sobre RDeN, acrescentando-lhe no entanto um ponto novo que é a sua ligação a linhas programáticas anteriores, de autores não alinhados com a classe operária, que defendiam para Portugal um projecto de Fomento. E este texto, que vimos citando, quase que termina com esta afirmação cheia de espírito, de que Ferreira Dias “nunca pensaria que a classe operária poderia cumprir o programa dos engenheiros”. Aquele autor era um conservador afascistado, que defendia nos anos 40 a industrialização do nosso país,

Atendendo ao que anteriormente foi escrito, a RDeN pode-se inserir, com os objectivos que o PCP entendeu formular, e que evidentemente reflectem algumas das características da situação portuguesa da época, dentro das “etapas intermédias” que visavam, por um lado, derrotar o fascismo, e os seus apoios de classe, e, por outro, instalar um regime democrático, sem os monopólios e sem a subordinação ao capital estrangeiro, tendo como objectivo último a instauração do socialismo. Foi fundamentalmente com a experiência da luta anti-fascista, com as “frentes populares” primeiro e com as “frentes nacionais” depois, que o movimento comunista enriqueceu a sua experiência histórica e aprofundou a sua formação teórica, de que, sem qualquer dúvida, é também devedor o PCP. Isto implicou alguma ruptura, nunca assumida, com o leninismo e com a sua teoria da revolução socialista. E se para justificar estas novas concepções, novas para a época, sempre se socorre de alguma frase de Lenine, como esta citada por Cunhal: “todas as nações virão ao socialismo, … mas não virão todas de forma absolutamente idêntica, cada uma trará a sua originalidade, nesta ou aquela forma de democracia, nesta ou naquela variedade de ditadura do proletariado …”, a verdade é que este só escreveu sobre as “etapas intermédias” ou de “transição” a propósito de coisas bem diferentes, como era a revolução democrático-burguesa ou as lutas pela independência nacional. O que é justificável dado que Lenine não foi contemporâneo da ascensão do fascismo. Por isso, compreende-se mal que haja hoje quem no PCP, sem nunca ter feito qualquer crítica ao conceito de RDeN, se assanhe em divulgar uma declaração como a do PC Grego, já por mim referida.

Gostaria de realçar dois aspectos relevantes antes de terminar. Primeiro referiria que, para concretizar a RDeN e derrubar o fascismo, o PCP defendia o “levantamento nacional”, que, segundo a opinião de Cunhal, encaixou como uma luva com o que se passou no dia 25 de Abril. Pode-se afirmar que à época (1961), com a defesa feita no XX Congresso do PCUS (1956) da transição pacífica para o socialismo, era difícil um partido comunista assumir que defendia um caminho de violência para o derrube do Governo do seu país. A seguir àquele Congresso, o Comité Central (CC) do PCP entendeu formular a concepção da “solução pacífica do problema político português” abandonando mesmo a expressão “derrubamento do fascismo”. Mas já com Cunhal em liberdade (Janeiro de 1960), depois da sua fuga de Peniche, o CC decide, em reunião efectuada em Março de 1961, fazer a crítica daquilo que considerou ser “o desvio de direita no Partido nos anos de 1956-59”, reponde de novo a linha de “levantamento nacional”. É justo pois assinalar esta diferença, que Cunhal valoriza extraordinariamente, pelo menos em relação às posições assumidas pelo PC espanhol.

Segundo, assinalar que Cunhal considera no seu livro, O PCP e o VII Congresso da Internacional Comunista, que algumas das acções empreendidas por aquele partido são devedoras daquele Congresso, principalmente a luta pela unidade, apesar de reconhecer que, na situação particular de Portugal, era difícil implantar a “frente popular” e a actuação dos comunistas nos sindicatos fascistas, abandonando a ideia de manter a todo o custo sindicatos paralelos ilegais. No entanto, em parte alguma do livro referido se considera a RDeN como a continuação das propostas avançadas pelo VII Congresso.

III Conclusão

Pelo que atrás ficou dito pode-se afirmar que o conceito de Revolução Democrática e Nacional, estando intimamente ligado à realidade nacional, é no entanto devedor das formulações teóricas, principalmente da ideia de etapa intermédia, entre o derrube do fascismo e a chegada à sociedade socialista, já formuladas no VII Congresso da Internacional Comunista. Simplesmente, este conceito, que informou durante anos o movimento comunista internacional, rompe, mesmo sem o assumir, com o conceito leninista de revolução. Esta ideia teve necessariamente implicações na atitude que o PCP tomou durante a revolução de Abril. E hoje tardiamente, alguns militantes do PCP, sem uma visão crítica do seu passado, retomam, pela porta do cavalo, alguns dos velhos conceitos anteriores àquele Congresso.

Sites onde explano as minhas ideias sobre este tema:

O Desvio Esquerdista e Sectário da Internacional Comunista (1929-1934), 28 Julho de 2007, inComuistas.info.

Os desvarios ideológicos de um militante do PCP, 10 de Novembro de 2007, in DOTeCOMe

Lenine e a Revolução, de Jean Salem – Uma análise crítica – Parte I, 5 de Dezembro de 2007, in DOTeCOMe

Lenine e a Revolução, de Jean Salem – Uma análise crítica – Parte II, 19 de Dezembro de 2007, in DOTeCOMe

O PCP, a Revolução Democrática e Nacional e o rumo ao socialismo – Algumas contribuições para a caracterização do 25 de Abril, Parte I, 25 de Junho de 2008, in Trix-Nitrix.
O PCP, a Revolução Democrática e Nacional e o rumo ao socialismo – Algumas contribuições para a caracterização do 25 de Abril, 27 de Junho de 2008, in Comunistas.info.

O PCP, a Revolução Democrática e Nacional e o rumo ao socialismo – Algumas contribuições para a caracterização do 25 de Abril , Parte II, 28 de Junho de 2008, in Trix-Nitrix.

Álvaro Cunhal, sete fôlegos de um combatente, 9 de Julho de 2010, in Trix-Nitrix

12/11/2010

Os Comunistas em Portugal 1921-2010. 3º Colóquio



AUDITÓRIO DA LIVRARIA LER DEVAGAR

ESPAÇO LXFACTORY-ALCÂNTARA-LISBOA


PROGRAMA


SÁBADO 13 NOVEMBRO

10.00 h – Abertura

10.30 h - Cartas de um preso político para a sua filha
Ana Barradas

11.00 h - O PCP e a PIDE perante a homossexualidade
São José Almeida

11.30 h – Debate

12.00 h – Almoço

14.00 h - Desertar contra a guerra colonial – os núcleos de desertores na Europa
José Manuel Lopes Cordeiro

14.30 h - Um maoísmo português?
Miguel Cardina

15.00 h - A segunda vaga do movimento operário português
Ângelo Novo

15,30 h - Debate


DOMINGO 14 NOVEMBRO

10.00 h - O PCP e a Revolução Democrática Nacional
Jorge Nascimento Fernandes

10.30 h - Os Cadernos de Circunstância
Ricardo Noronha

11.30 h - Debate

12.00 h - Almoço

14.00 h - O PCP e o V Governo
Raquel Varela

14.30 h - Do 25 de Abril do Povo à 3ª cisão do PCR/UDP e a constituição da Política Operária
António Barata

15.00 h – Debate
Como já repararam vou intervir Domingo, às 10h00 da manhã. Espero que alguém acorde a tempo de me ir ouvir.
O Resumo da minha intervenção é o seguinte:

Pretende-se provar que o PCP ao inscrever no seu Programa, aprovado em 1965, os oito objectivos da Revolução Democrática e Nacional, que visavam derrubar o fascismo e instalar um regime democrático, sem monopólios e sem a subordinação ao capital estrangeiro, se socorreu do conceito de “etapas intermédias”, que foi inicialmente formulado no VII Congresso da Internacional Comunista (1935) e pelo movimento comunista internacional, ao defender a formação de Frentes Populares e depois, já durante a II Guerra Mundial, de Frentes Nacionais. Este conceito abandonava ou relegava para mais tarde a ideia leninista de revolução socialista imediata. O abandono deste conceito trouxe sem dúvida consequências ao nível da actuação do PCP durante a revolução de Abril e que estão expressas na presente intervenção nas declarações iniciais de Lenine ao chegar a Petrogrado e de Álvaro Cunhal, a Lisboa. Por outro lado, confronta-se esta posição anteriormente assumida pelo PCP com a divulgação recente entre os militantes daquele partido de um texto do PC Grego (KKE) muito crítico da defesa daquelas etapas intermédias e das alianças de classe que daí resultam.

07/11/2010

7 de Novembro - aniversário da Revolução de Outubro

Não quis acabar o dia sem uma pequena homenagem ao 7 de Novembro, que corresponde ao 25 de Outubro no antigo calendário russo. Inspirei-me num post do Nuno Ramos de Almeida, do blog 5 Dias. Simplesmente tentei arranjar um vídeo que não fosse igual ao que ele lá colocou ou aos que foram depois acrescentados em comentário. Este, não sendo propriamente sobre a Revolução, é sobre o III Congresso da Internacional Comunista, que teve lugar em 1921, e onde estão assinalados algumas personagens importantes da Revolução, que Estaline se encarregou de eliminar. Não será o melhor, mas foi o que se pôde arranjar. Percebi que o tema no YouTube é inesgotável.

06/11/2010

Como às vezes um blogger distraído escreve as mesmas coisas que uma cronista de direita.


Já houve tempo que me dava ao trabalho de ler as crónicas que Helena Matos escreve no Público. Cheguei a responder-lhe com posts inflamados de indignação (ver aqui e aqui). Hoje considero-a das mais tontinhas e reaccionárias escrevinhadoras que povoam o espaço público. Às vezes por desfastio, já que o Público destaca em bold algumas das suas pérolas, costumo lê-las. Na última, de quinta-feira passada, vinha uma intitulada Dissidentes ou resistentes: descubra as diferenças. Depois de falar em países democráticos como a Colômbia, afirma “por que razão os opositores às ditaduras de direita são apresentados como resistentes, oposicionistas, … enquanto no caso das ditadura de esquerda só temos dissidentes”. Depois citas os dois casos já por mim abordados em dois posts anteriores e termina “O dissidente é um produto do totalitarismo estatista:” – não podia faltar este disparate – “indivíduos reduzidos a si mesmos e que na absoluta impossibilidade de se organizarem enquanto oposição transformam o acto de existir numa forma de resistência”.
Ora se leram o meu post sobre o prémio Sakharov eu explicava que não concordava que se chamassem a estes resistentes, combatentes, activistas, etc., dissidentes e até escrevi este termo entre aspas. Achei que eles lutavam por uma causa, que no caso do chinês ganhador do Prémio Nobel até era colectiva, visto que ele tinha organizado um abaixo-assinado, enquanto que a do cubano é menos clara a sua ligação a outros movimentos de resistência. Chegava mesmo a afirmar, provavelmente, crime dos crimes, que Cunhal nunca foi considerado um dissidente mas sim um opositor ou um resistente.
Simplesmente, esta tontinha, para zurzir na esquerda, inventa uma designação de que a esquerda, principalmente os regimes onde aquelas duas personagens vivem, ou noutros casos mais antigos, nunca utilizaram. Ninguém, de certeza, na China chamará ao Prémio Nobel um dissidente, mas sim um criminosos que violou as leis do seu país. O mesmo se passará em Cuba. Foi durante a Guerra-fria que o “ocidente”, as forças dominantes ocidentais e os seus partidos e até as organizações dos direitos humanos chamaram dissidentes a personagens que por uma ou outra razão se opunham aos regimes que vigoravam nos seus países. O termo dissidente não é utilizado pelos comunistas ou outra esquerda não social-democrata. Por isso, percebo mal a indignação desta senhora. Só se acha que de futuro, os do seu grupo, devem chamar a estes dissidentes. resistentes. Por mim nada tenho contra. Só espero que não lhes chamem combatentes da liberdade, como Ronald Reagan chamava aos talibãs quando estes se opunham à União Soviética.

A quadratura do círculo de Manuel Alegre


Na semana que agora finda houve três afirmações que me merecem alguma opinião. No entanto, para tentar tornar mais curtas as minhas intervenções irei fazer um post para cada uma.

No programa Contraste, da SIC Notícias, transmitido às terças, às 23h00, e que junta Francisco Assis e Morais Sarmento, o primeiro defendia abertamente uma junção de esforços entre o PS e o PSD para porem em prática o orçamento aprovado pelos dois partidos. É engraçado que este ponto de vista mereceu uma graçola de Morais Sarmento, a propósito do apoio que o PS está a dar a Manuel Alegre. A que Assis deu troco. Já não me recordo da graçola, nem da resposta de Assis. - Podem, dentro de alguns dias, consultar na SIC on-line o vídeo deste Contraste. - Mas o que interessa aqui reter é esta esquizofrenia que está a atravessar o PS, que defende e pratica acordos à sua direita e acusa os partidos à sua esquerda de extremistas e de protesto e depois apoia um candidato que está a travar uma batalha que é o contrário disso tudo. Por isso percebe-se o apelo de Manuel Alegre para que os socialistas acordem e se envolvam mais na campanha.

De facto a situação está muito complicada e eu não gostaria de ignorar este facto. Com um PS claramente comprometido com o centrão, ou mesmo com as políticas de direita, não há nenhum candidato de esquerda, mesmo independente e super partidário, que resista a que uma das suas bases de apoio não só não esteja nada interessada na sua eleição, dado que isso provavelmente só iria irritar os “mercados” internacionais a que ela está atada de pés e mãos, como esse facto inverteria a sua lógica de apoio à formação do um bloco central.
Se o candidato não perceber esta situação e continuar a tentar trazer todo o PS atrás de si está condenado à derrota mais clamorosa.
O PS, desde que José Sócrates tomou o poder, nunca teve uma estratégia de vitória em relação a eleições que não fossem aquelas a que o seu chefe concorria. Perdeu, as presidenciais de 2006 para Cavaco Silva, já antes tinha perdido as autárquicas de 2005, com principal relevo para a vitória de Carmona em Lisboa. Perdeu as europeias, em 2009, sacrificando o seu compagnon de route Vital Moreira e também as autárquicas de 2009, que só foram ganhas em Lisboa, por António Costa, devido à táctica política seguida por este, ao arrepio provavelmente de alguns vozes mais influentes do PS.
Por isso, não será de estranhar que sacrifiquem mais uma vez no altar das conveniências partidárias de José Sócrates o seu candidato presidencial.