30/07/2008

Quanto mais reaccionário melhor


O meu último post terminava com um comentário anónimo, que eu considerava de fina perspicácia e em que se afirmava: “Todos eles, sabem muito bem o que andam a dizer (fazer), eles são pagos para isso!”. Este pequeno comentário referia-se a um artigo de opinião que falava de coisas de esquerda, sem fazer referência directa ao PCP. Já se sabe que esta prosa, que aparece aqui e acolá, reflecte sempre o que os seus mentores espirituais querem que eles digam, às vezes exageram na forma, mas traduzem sempre uma forma de pensar e de agir.
Vem isto a propósito de neste post, aqui já assinado, ir fazer uma afirmação que aparentemente é semelhante à do nosso comentarista anónimo, mas a propósito de outra corrente política, a reccionarice militante de alguns dos nossos comentaristas da imprensa dita de referência. Ou seja, há hoje um conjunto de comentadores políticos que escrevem, e por vezes frequentam a televisão, que primam por manifestar os seus preconceitos políticos e que são pagos para isso mesmo. Quanto mais boçal e alarve for a sua prosa, mais cotação têm na imprensa, pelo menos é isso que se verifica no Público, o órgão por excelência da imprensa dita de qualidade.
Assim, teríamos à cabeça o famigerado Rui Ramos, hoje chefe de fila do reaccionarismo, mas também, com outras características, o Vasco Pulido Valente (VPV) e, por último, a Helena Matos. Isto para só citar três que garantem uma colaboração regular naquele diário e que escreveram sobre os acontecimentos da Quinta da Fonte, em Loures.
A partir do momento que começaram as desordens naquele bairro social era vê-los à compita para ver quem escrevia a prosa mais reaccionária.
Eu sou daqueles que não tenho solução para os problemas da Quinta da Fonte, nem posso garantir que seja um caso de racismo, de indigência social, de guetização de grupos étnicos, etc. Nem sei se a solução passa por criar os chamados bairros sociais ou pela dispersão pela cidade das populações mais carenciadas. Penso que a resolução destes casos ou pelo menos a minimização dos seus efeitos passa, em primeiro lugar, por uma visão política progressista de todos os intervenientes, depois pelas propostas dos técnicos, e por último pela decisão política fundamentada de quem tem essa responsabilidade: autarcas, Governo, poder legislativo.
Mas que nos propõem os nossos comentaristas. Deixar essas populações ao “Deus dará”, que inevitavelmente, sem o apoio do Estado, assumirão a sua “responsabilidade pessoal” e passarão a trabalhar e a serem capazes de angariarem o seu próprio sustento. O Estado Social com os seus subsídios é que é no fundo é o causador de todo este mal-estar. Convém “mantê-los com o estatuto de puras "vítimas", sem culpa nem consciência” (Rui Ramos ) ou então, como afirma VPV (Público, 25/07/08; não há link para o seu texto), “o Estado exclui à partida de qualquer espécie de obrigação pública ou privada a gente a quem ofereceu a sua assistência”, havendo pois a “absoluta ausência de qualquer forma de responsabilidade”.
Por estranha coincidência o termo "responsabilidade" surge nos dois textos. Provavelmente é por ausência de responsabilidade, de que o Estado Social é o culpado, que esta gente é pobre. É a completa inversão dos valores. O Estado Social não minimiza os efeitos da pobreza, contribui para a manutenção das populações na pobreza. Dizem eles.
Ora o que são estes nossos comentaristas senão reaccionário, que propõe nem mais nem menos que regressar ao século XIX, ao início da revolução industrial, quando nada estava regulamentado a favor dos trabalhadores, nem havia qualquer protecção social para as suas dificuldades.
Helena Matos (Público, 29/07/08; não há link para o seu texto) já não faz referência às responsabilidades Estado Social, mas insurge-se contra os jornalistas do Público, denunciando-os como provavelmente perigosos “esquerdistas”, que ao não terem podido escrever uma história com contornos de racismo, em que os brancos apareciam como os principais responsáveis, acham que devem omitir os factos, não os relatando. Já se sabe, tudo isto apimentado por uma prosa cheia de reaccionarices e provocações.
Depois desta denúncia do(a)s jornalistas do Público, que o José Manuel Fernandes agradece, pois tem aí um bom motivo para despedimento, Helena Matos parte para mais reaccionarices agora sobre as notícias que não se fizeram sobre o regresso dos retornados. Pelo meio tem esta espantosa afirmação: “os mesmos jornalistas que anos antes tinham denunciado vivamente a expulsão de Portugal do dançarino Béjart eram agora incapazes de criticar a expulsão de Angola e Moçambique de jornalistas estrangeiros” (refere-se à época da descolonização). Helena Matos era muito nova para se recordar do que era o fascismo, mas ao menos estudasse e não fizesse afirmações tão levianas como esta. Que jornalistas conhece ela que denunciaram publicamente a expulsão do Béjart? Um facto como este nunca era relatado na imprensa, a não ser por intermédio de uma nota do Ministério do Interior e mesmo que um jornalista conseguisse fazer passar a notícia, tinha que ser tão disfarçada, que era impossível esta relatar qualquer indignação daquele. Mesmo que se tenha verificado, coisa que não me constou, ter circulado entre os jornalistas algum abaixo-assinado a protestar contra aquela expulsão, o seu subscritores arriscavam-se à prisão e a interrogatório pela PIDE. Portanto, é manifesta ignorância e declarada desonestidade intelectual fazer afirmações como aquela.
Com isto termino. Esta gente escreve reaccionarices porque há quem lhe pague, e quanto mais boçais mais aceitação têm.

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