30/07/2008

Quanto mais reaccionário melhor


O meu último post terminava com um comentário anónimo, que eu considerava de fina perspicácia e em que se afirmava: “Todos eles, sabem muito bem o que andam a dizer (fazer), eles são pagos para isso!”. Este pequeno comentário referia-se a um artigo de opinião que falava de coisas de esquerda, sem fazer referência directa ao PCP. Já se sabe que esta prosa, que aparece aqui e acolá, reflecte sempre o que os seus mentores espirituais querem que eles digam, às vezes exageram na forma, mas traduzem sempre uma forma de pensar e de agir.
Vem isto a propósito de neste post, aqui já assinado, ir fazer uma afirmação que aparentemente é semelhante à do nosso comentarista anónimo, mas a propósito de outra corrente política, a reccionarice militante de alguns dos nossos comentaristas da imprensa dita de referência. Ou seja, há hoje um conjunto de comentadores políticos que escrevem, e por vezes frequentam a televisão, que primam por manifestar os seus preconceitos políticos e que são pagos para isso mesmo. Quanto mais boçal e alarve for a sua prosa, mais cotação têm na imprensa, pelo menos é isso que se verifica no Público, o órgão por excelência da imprensa dita de qualidade.
Assim, teríamos à cabeça o famigerado Rui Ramos, hoje chefe de fila do reaccionarismo, mas também, com outras características, o Vasco Pulido Valente (VPV) e, por último, a Helena Matos. Isto para só citar três que garantem uma colaboração regular naquele diário e que escreveram sobre os acontecimentos da Quinta da Fonte, em Loures.
A partir do momento que começaram as desordens naquele bairro social era vê-los à compita para ver quem escrevia a prosa mais reaccionária.
Eu sou daqueles que não tenho solução para os problemas da Quinta da Fonte, nem posso garantir que seja um caso de racismo, de indigência social, de guetização de grupos étnicos, etc. Nem sei se a solução passa por criar os chamados bairros sociais ou pela dispersão pela cidade das populações mais carenciadas. Penso que a resolução destes casos ou pelo menos a minimização dos seus efeitos passa, em primeiro lugar, por uma visão política progressista de todos os intervenientes, depois pelas propostas dos técnicos, e por último pela decisão política fundamentada de quem tem essa responsabilidade: autarcas, Governo, poder legislativo.
Mas que nos propõem os nossos comentaristas. Deixar essas populações ao “Deus dará”, que inevitavelmente, sem o apoio do Estado, assumirão a sua “responsabilidade pessoal” e passarão a trabalhar e a serem capazes de angariarem o seu próprio sustento. O Estado Social com os seus subsídios é que é no fundo é o causador de todo este mal-estar. Convém “mantê-los com o estatuto de puras "vítimas", sem culpa nem consciência” (Rui Ramos ) ou então, como afirma VPV (Público, 25/07/08; não há link para o seu texto), “o Estado exclui à partida de qualquer espécie de obrigação pública ou privada a gente a quem ofereceu a sua assistência”, havendo pois a “absoluta ausência de qualquer forma de responsabilidade”.
Por estranha coincidência o termo "responsabilidade" surge nos dois textos. Provavelmente é por ausência de responsabilidade, de que o Estado Social é o culpado, que esta gente é pobre. É a completa inversão dos valores. O Estado Social não minimiza os efeitos da pobreza, contribui para a manutenção das populações na pobreza. Dizem eles.
Ora o que são estes nossos comentaristas senão reaccionário, que propõe nem mais nem menos que regressar ao século XIX, ao início da revolução industrial, quando nada estava regulamentado a favor dos trabalhadores, nem havia qualquer protecção social para as suas dificuldades.
Helena Matos (Público, 29/07/08; não há link para o seu texto) já não faz referência às responsabilidades Estado Social, mas insurge-se contra os jornalistas do Público, denunciando-os como provavelmente perigosos “esquerdistas”, que ao não terem podido escrever uma história com contornos de racismo, em que os brancos apareciam como os principais responsáveis, acham que devem omitir os factos, não os relatando. Já se sabe, tudo isto apimentado por uma prosa cheia de reaccionarices e provocações.
Depois desta denúncia do(a)s jornalistas do Público, que o José Manuel Fernandes agradece, pois tem aí um bom motivo para despedimento, Helena Matos parte para mais reaccionarices agora sobre as notícias que não se fizeram sobre o regresso dos retornados. Pelo meio tem esta espantosa afirmação: “os mesmos jornalistas que anos antes tinham denunciado vivamente a expulsão de Portugal do dançarino Béjart eram agora incapazes de criticar a expulsão de Angola e Moçambique de jornalistas estrangeiros” (refere-se à época da descolonização). Helena Matos era muito nova para se recordar do que era o fascismo, mas ao menos estudasse e não fizesse afirmações tão levianas como esta. Que jornalistas conhece ela que denunciaram publicamente a expulsão do Béjart? Um facto como este nunca era relatado na imprensa, a não ser por intermédio de uma nota do Ministério do Interior e mesmo que um jornalista conseguisse fazer passar a notícia, tinha que ser tão disfarçada, que era impossível esta relatar qualquer indignação daquele. Mesmo que se tenha verificado, coisa que não me constou, ter circulado entre os jornalistas algum abaixo-assinado a protestar contra aquela expulsão, o seu subscritores arriscavam-se à prisão e a interrogatório pela PIDE. Portanto, é manifesta ignorância e declarada desonestidade intelectual fazer afirmações como aquela.
Com isto termino. Esta gente escreve reaccionarices porque há quem lhe pague, e quanto mais boçais mais aceitação têm.

27/07/2008

Quando me vejo envolvido, sem o querer, numa polémica caseira


De repente o nome do meu blog vem à baila sobre uma matéria para a qual eu não meti prego nem estopa. Por esse motivo, sinto necessidade de esclarecer alguns incautos que, apressadamente, me podem envolver nas diatribes que o Victor Dias dirigiu a um artigo respeitável de Elísio Estanque (ver imagem aqui ao lado), Ainda há esquerda dentro das "esquerdas", publicado igualmente no Público e no seu blog.
A história é simples. Fernando Penim Redondo (FPR), do DOTeCOMe_Blog , resolve concordar com o post de Victor Dias e em “comments” insere o mesmo comentário que publicou no meu blog a propósito de outro assunto, citando o site de onde o transcreveu. Ora, um leitor mais apressado pode pensar que o texto é meu ou que concordo com ele. Nada disso é verdade.
O post de crítica ao artigo de Elísio Estanque é retorcido, mas no fundo resume-se a isto: “um elemento estruturante e nuclear de certas reflexões em curso sobre a "esquerda" é, pura e simplesmente, a discriminação e a pretensão de excluir e isolar o PCP”. Lendo isto, FPR acha que aquilo que afirmou no seu comentário a um assunto muito diferente e com protagonistas diferentes se insere na mesma cabala denunciada por Vítor Dias, que visa descriminar e excluir o PCP. Com esta nova transcrição, FPR já entrou na paranóia das teorias da conspiração, que em tudo vê a mão oculta dos inconfessáveis inimigos do PCP.
Mas deixemos o FPR e voltemos ao post do Victor Dias. Quanto a mim, o que é mais elucidativo não é propriamente o post, que eu resumi numa frase, mas sim a resposta que este dá a um longo comentário de Alcides Santos.
Primeiro, com uma grande sobranceria, coisa que não utiliza quando visa esclarecer os argumentos da direita, afirma que será ensinar o padre-nosso ao vigário que alguém tente dar lições ao PCP sobre “as questões de unidade ou convergência entre diversos sectores ou forças democráticas”.
Ora a verdade, e Victor Dias esquece isso, é que o PCP não tem mantido nos últimos anos a mesma opinião. Só o seu acrisolado amor à camisola o faz esquecer as inflexões do PCP sobre esta matéria. Desde o tempo em que aquele Partido defendia a necessidade de transformar a maioria numérica de esquerda existente na Assembleia da República (PS e PCP), em uma maioria política, até às opiniões do seu camarada Jerónimo de Sousa sobre a unidade actual, que Vítor Dias chama de cooperação, que, depois de exprimida se resume a convergir com os Verdes e a Intervenção Democrática, que um longo caminho foi percorrido, tendo-se verificado uma substancial alteração da prática política daquele Partido em relação à unidade das forças de esquerda.
Vítor Dias é incapaz de perceber o declínio teórico que atravessa o PCP, que o faz resvalar facilmente para o esquerdismo e o sectarismo. Com alguma modéstia, tenho tentado em textos recentes fazer uma crítica àquilo que eu considero ser o desvio esquerdista e sectário do PCP. Ver aqui e aqui , aqui e aqui, aqui e aqui e aqui .
Depois responde em três pontos à crítica bem intencionada de Alcide dos Santos.
No primeiro ponto faz um jogo de palavras. Como se a possibilidade e a necessidade fossem coisa incompatíveis e não complementares.
No segundo, tem uma afirmação espantosa em que escreve que não há força eleitoral, mesmo contando com o PCP, para dar base a uma “alternativa política”, contrariando a afirmação sempre repetida de Cunhal, que não devemos lutar unicamente pelos objectivos alcançáveis, mas sim por aqueles que sendo difíceis de atingir nos parecem justos. Porque, partindo do ponto de vista de Vítor Dias, só nos resta defender uma aliança com todo o PS, incluindo o de Sócrates, pois só assim teríamos a maioria numérica indispensável a uma alternativa política.
Depois, no terceiro ponto, ataca todos aqueles que andam a dar corda às tais personalidades de esquerda do PS. Esquecendo que o PCP já deu corda a personalidades bem menos fiáveis que esta esquerda do PS, ao apoiar o projecto do PRD. Já lhe tinha falado nisto e o Vítor Dias respondeu-me com bugalhos, para não falar do FPR que resolveu desconversar e a despropósito atacou a Renovação Comunista, de que tinha feito parte.
Mas o tom dos seus amigos do PCP, sempre elucidativo do que passa pela cabeça de certos militantes daquele Partido e que se traduz muitas vezes nos comentários assinados do Avante, está dado por este comentário de fina perspicácia publicado no seu post: “Todos eles, sabem muito bem o que andam a dizer (fazer), eles são pagos para isso!”

17/07/2008

Ainda o caso de Ingrid Betancourt e das FARC


Nos últimos dias tenho vivido um “grande” drama político. De repente dei-me conta que me encontrava politicamente isolado frente ao combate que, por interposta força guerrilheira, as FARC, se está a travar entre uma esquerda, que eu chamaria “bem pensante”, e os conhecidos “cavernícolas” do PCP.
O caso começou nalguns blogs de consulta diária, passou pelos media e continua em ondas de choque a merecer comentários aqui e acolá. Quase que poderia dizer que é hoje a pedra de toque que separa a esquerda não PCP daquele Partido. Por esse motivo, uma posição como a que expressei aqui é incómoda e acarreta-me necessariamente muitas incompreensões e críticas, valha-me o meu camarada Saboteur, que no Spetrum, fez um elogio à minha intervenção.
Afirmava nesse post que não tinha informação suficiente para me poder pronunciar com inteireza sobre o que eram as FARC e os seus métodos de actuação, nem conhecia em pormenor a Colômbia e o seu Governo para sobre eles traçar uma opinião definitiva, como os comentadores da blogosfera gostam de fazer.
Fui recolher material, abri mesmo um ficheiro dedicado ao assunto. Pode ser que com tempo e vagar comente o que se tem dito na blogosfera.
No entanto, não gostaria desde já de passar em claro dois casos que me parecem paradigmáticos das posições simplistas e acríticas, que resultam de uma opção por tudo ou nada, em que o meio-termo ou uma análise mais rigorosa é deixada ao abandono.
O primeiro refere-se a um post que Daniel de Oliveira colocou no seu site, “Pode alguém ser livre se outro alguém não é?”, em que considera que tanto é crime capturar alguém e levá-lo para Guantánamo, como faz o Governo dos Estado Unidos, como ter raptado Ingrid Betancourt e conservá-la prisioneira durante anos, como fizeram as FARC. Por isso considera que não se pode pedir que o Governo português interdite os voos para Guantánamo, como o fez o Grupo Parlamentar do PCP, e a seguir defender a não criminalização das FARC por terem raptado pessoas que não estão directamente envolvidas na luta que se trava na Colômbia, como disse Jerónimo de Sousa, em declarações citadas aqui.
Daniel de Oliveira esquece que as consequências dos dois actos são completamente diferentes. Enquanto Bush pode passear pelo mundo, indo até uma cimeira do G8 onde, segundo a imprensa, se comeu trufas e caviar, e ninguém, exceptuando meia dúzia de manifestantes enraivecidos, facilmente afastados pela polícia, lhe chama criminoso ou o prende. Já um dirigente das FARC se sair da selva corre o risco de ser morto, como recentemente ocorreu aos dirigentes daquela organização que estavam em solo equatoriano, e a organização a que pertencem é classificada pelo “mundo ocidental” como terrorista, com as consequências que isso acarreta, quer para ela quer para todos aqueles que em qualquer lado lhe manifestem alguma solidariedade. Como se vê pelo que digo o crime não acarreta para todos as mesmas consequências. Ou seja, o crime pode ser o mesmo, como diz Daniel de Oliveira, simplesmente há uns que são mais criminosos do que outros. Isto devia levar a pensar os nossos apressados comentadores.
O segundo caso prende-se com o estado de saúde de Ingrid Betancourt. João Tunes no seu blog, depois de alguns considerandos que eu me abstenho de comentar, para não azedar um conhecimento que foi estabelecido ainda nos tempos “heróicos” do ABC Cine-Clube de Lisboa, fala de “aqueles cínicos que acharam que ela “até vinha em bom estado” e longe da prostração comatosa que lhe competiria como sequestrada”. Vítor Dias no seu blog comenta, com ironia, depois de mostrar uma fotografia de Ingrid toda airosa na Festa do 14 de Julho, em França, que não irá falar da sua saúde.
Quanto a mim, que fico satisfeito por a senhora estar de boa saúde, acho no entanto que não se pode deixar passar em claro a campanha mediática que foi desencadeada a propósito do estado de saúde de Ingrid. Dizia-se que estava bastante doente e que a sua vida estava em perigo. Ou seja, estivemos perante um caso claro de manipulação da opinião pública, coisa que pelos vistos não ofendeu muito os nossos comentaristas de serviço.
Em qualquer dos casos, parecem-me dois exemplos em que se olha muito para a árvore e pouco para a floresta.
PS.: Já depois deste post estar publicado Fernando Penim Redondo queixava-se aqui do fanatismo que atravessava a rede por pessoas com posições ditas liberais. Citava o caso de João Tunes a propósito da China, que eu me abstenho de comentar pelas razões já expostas em cima, e de um blog, com um nome um bocado esdrúxulo, como o meu, que o critica pela sua posição quanto à saúde de Ingrid Betancourt. Neste caso, tal como o de João Tunes, os comentadores não se indignaram com todos aqueles que deliberadamente manipularam a opinião pública, mas sim com os que ficaram espantados por ver a senhora de boa saúde.

E eles disseram qualquer coisa de esquerda!


Ouvi a entrevista que Mário Soares fez a Lula da Silva, o Presidente do Brasil. Para além desse tratamento familiar que é, mesmo chamando-lhe doutor, Lula tratar o Mário Soares por Dr. Mário, facto hoje cada vez mais normal nas relações entre portugueses, tivemos na televisão pública um banho de clareza, a anos de luz destes nossos políticos enviesados, sempre prontos a falar da esquerda moderna, mas a defenderem de facto as políticas de direita e sempre de chapéu na mão para o amigo americano.
Disse-se de facto qualquer coisa de esquerda. Falou-se de Chavez e de Fidel com aquela normalidade e respeito que se devem a importantes chefes de Estado, que em qualquer dos casos empreenderam a luta pela melhoria do destino dos seus povos. Como nos parecem pequenos certos comentaristas, nas suas raivazinhas contra a esquerda no poder na América Latina, sempre a pregarem moral perante a obra daqueles dois políticos.
Valeu a pela ouvir a entrevista ao Lula. Foi um banho de esperança e de lucidez.

15/07/2008

Os nostálgicos de Correia de Campos


É interessante que quando Correia de Campos era Ministro da Saúde não havia cão nem gato que não dissesse mal dele. Era dos ministros mais atacados do Governo de Sócrates. Estava sempre na mira dos comentários de Marcelo devido à sua incontinência verbal. Por isso e por não garantir a imagem de eficácia e de amor acrisolado deste Governo às populações do interior foi demitido por Sócrates, e eis que para a direita se transformou num herói, por oposição à nova ministra que, com alguma candura, vem dizendo umas verdades sobre o Serviço Nacional de Saúde (SNS) e a necessidade de o defender.
José Miguel Júdice, sem papas na língua, com aquele gosto que tem de classificar as esquerdas nesta ou naquela categoria, disse que este Governo era uma aliança entre o PS e Manuel Alegre, já que a ministra da Saúde tinha sido apoiante de Manuel Alegre e, segundo ele, preconizaria uma política de defesa de uma maior intervenção do Estado na Saúde.
Mas este texto vem a propósito de uma artigo que saiu no Diário de Notícias desse beato e desclassificado defensor da Igreja Católica, chamado João César das Neves (JCN), que a televisão pública, muito reverentemente, vai sempre ouvir quando se trata de opinar sobre qualquer nova medida económica.
Que nos diz aquele economista da Universidade Católica: “a nova ministra Ana Jorge apregoa com clareza e dedicação que defende o Sistema Nacional de Saúde. A presença privada no sector, mesmo se maioritária, é explicitamente considerada residual, senão até anómala e nociva.
Voltamos, após duas décadas, às tiradas estalinistas exaltando a elegância do mecanismo central acima da confusão do mundo.
O profissional de saúde, dentro da armadura estatal, está devidamente protegido de preocupações financeiras, comerciais e concorrenciais. Assim pode dedicar-se à sua missão sublime, livre das maçadas que a vida cria a todos os mortais.”
Aqui temos, com a elegância de um elefante, JCN a classificar algumas medidas e opiniões da ministra como estalinistas e, provavelmente, por tabela, o pobre Sócrates, que tudo faz para ser um neo-liberal. Já em tempos a Igreja Católica classificou este Governo como militantemente ateu, hoje é JCN que o classifica de estalinista. Bem feita, por muito que José Sócrates se abaixe, nunca o consideram como um deles. Tem que se rebaixar ainda mais para ser levado a sério pela direita e pelos seus corifeus.
Vem depois a catilinária sobre o excesso de privilégios das classes profissionais, o que poderá ser verdade, mas que nada tem a ver com a defesa do SNS e da sua manutenção contra os privilégios e os benefícios que queriam atribuir aos privados.
Depois o artigo alonga-se sobre este tema, mas na economia deste post o que eu gostaria de sublinhar era, por um lado, como Correia de Campos passou rapidamente de besta a bestial e de como a nova ministra conduziu, pela porta do cavalo, à estalinização do Governo de Sócrates. Deus tenha piedade deles que não sabem o que dizem.

11/07/2008

Trufas e caviar no jantar da cimeira do G8 sobre fome


Vinha ontem uma notícia no Diário de Notícias que referia que tinham sido servidos trufas e caviar no jantar da Cimeira do G8, que era dedicada à fome. Vinha a seguir a descrição dos pratos que tinham sido servidos naquela refeição, o preço que ela tinha custado por participante e o que se podia fazer para ajudar os países em desenvolvimento só com o dinheiro gasto na recepção. Este é o tipo de notícias carregadas de populismo que agradam sempre a quem nunca pôs os pés numa reunião deste tipo e considera que os participantes deviam ingerir uma comida extremamente frugal, já que estavam a discutir a ajuda aos países vítimas da fome.
Eu considero sempre estas notícias de um moralismo rasca. Alguém acredita que o Bush tem qualquer preocupação com a fome. Ele que nem com a do seu próprio país se preocupa, quanto mais com a dos outros.
Se comessem uma refeição de um só prato de certeza que o gesto seria logo propagandeado. Diriam logo os media: “dirigentes mundiais comem pratos simples em memória de todos aqueles que não o podem fazer”.
O problema não está pois naquilo no que comem os dirigentes do mundo em cimeira mediática, mas naquilo que fazem e decidem que conduz às situações como aquela que estamos vivendo, com os preços do petróleo e dos bens essenciais a aumentarem descontroladamente.
È bom que se exija outra política e não a mesma com roupagens mais mediáticas.

05/07/2008

A história virtual de alguns ideólogos de direita


Agora no findar da vida deu-me para ser historiador e tão convencido ando nesta nova veste que já me ponho a criticar os meus confrades.
Vem isto a propósito de seminário sobre História Virtual de Portugal realizado no Instituto de Ciências Sociais e coordenado por Fernando Martins e Rui Ramos.
O Público já tinha dado uma notícia desenvolvida. Hoje resolveu começar a relatar as comunicações e aquela que mais o sugestionou foi o que teria acontecido se Jorge Sampaio não tivesse convidado Santana Lopes para formar Governo. A comunicação foi apresentada por Carlos Gaspar e a conclusão que tirou foi a mais disparatada. Dado que até aí os Presidentes da República tinham convocado eleições sempre que um primeiro-ministro se demitia, se desta vez Jorge Sampaio actuasse do mesmo modo teríamos na prática um “presidencialismo” de primeiro-ministro, pois era ele que influenciava a convocação de eleições, o que levaria os partidos do centrão, em próxima revisão constitucional, a retirarem poderes ao Presidente da República, como seja a sua eleição por sufrágio directo e universal. Isto é um exemplo, quanto a mim feliz, das idiotices que se podem apresentar nesta história virtual de Portugal. Mas este é dos mais inócuos. Nada aconteceria de importante se em vez de ter sido como foi tivesse sido doutra maneira. É mera especulação e brincadeira de historiadores.
Mas o assunto tem outras implicações mais ideológicas, ou não estivesse metido na organização deste evento, Rui Ramos, que já classifiquei, em texto anterior, como um camelot du roi . Assim, no texto de hoje do Público logo no cabeçalho é destacado que esta história virtual é uma “reacção contra as escolas deterministas marxistas e dos “Annales” (revista de história francesa que teve grande influência entre alguns dos nossos melhores historiadores).
Depois desta afirmação de princípio, vamos aos factos e aqui é que "a porca torce o rabo". Rui Ramos tem uma comunicação sobre “O que teria acontecido se o Rei D. Carlos não tivesse sido assassinado em 1908?"; mas uma das que me pareceu mais sugestiva, e que foi resumidamente referida em edição anterior do Público (é muito difícil fazermos links para o Público), é “O que é que teria acontecido se a oposição não tivesse desistido nas eleições de 1945?”, de David Castaño. Nela, o autor diz que foi o sectarismo do PCP o responsável por a oposição não ter ido a votos naquelas eleições (Novembro de 1945), que teriam permitido acabar com o fascismo muito mais cedo. Este autor não intui que depois de Salazar ter garantido, em Agosto desse ano, que pretendia que as eleições fossem “tão livres como na livre Inglaterra”, fez tudo, já depois de ter assegurado o apoio dos ingleses e norte-americanos, para transformá-las em mais uma das suas farsas eleitorais.
Já se percebeu que esta história virtual, não deixa de ser aquilo que os seus autores queriam que tivesse sucedido se as coisas não se tivessem passado como passaram. Os marxistas actuais há muito que já abandonaram qualquer determinismo na história humana, mas certos historiadores, incapazes de aceitarem o rumo que os acontecimentos tomaram, praticam esta história virtual como modo de desvalorizarem os acontecimentos da época e desse modo poderem influenciar para a direita os acontecimentos de hoje. Por isso parece-me pouco séria esta sua história virtual.

PS.: é evidente que não assisti às comunicações. Só li a notícia hoje do Público e a primeira que saiu naquele jornal, que reproduzo de memória, pois não consigo localizá-la na net.

04/07/2008

O caso de Ingrid Betancourt


Sei que vou causar alguma perplexidade, mas não alinho nesta orientação de uma certa esquerda bem intencionada, cheia dos valores, mas incapaz de compreender as situações, os confrontos político-ideológicos do mundo de hoje, no fundo de ser capaz de ir contra a corrente, convencida que por ter apoiado, em alguma fase da sua vida, alguns crimes abomináveis, pode esquecer de que lado está da “barricada” e alinhar, mesmo que inconscientemente, com as posições da direita. É complexo e nem sempre é fácil, mas por vezes temos que tomar partido.
Vem tudo isto a propósito da libertação de Ingrid Betancourt e de mais 15 reféns, que, segundo a versão do Governo colombiano, foi executada com mestria pelos seus serviços de secretos (inteligência é um anglicismo, que alguns querem recuperar para o português) que se infiltraram nas FARC e conseguiram, enganando os seus raptores, retirá-los da selva.
Esta é a notícia resumida por mim. A Esquerda.net dá igualmente a notícia com alguns pormenores curiosos. Primeiro, de acordo com um porta-voz de um Instituto, há sempre um Instituto a pronunciar-se: "Com este resgate, que ganha forte apoio popular, o governo fortalece a sua posição de que a solução para a Colômbia é a saída militar, sem diálogos nem negociações". Segundo, os reféns, além de Ingrid Betancourt, eram três americanos. O que estariam lá a fazer? Sabe-se, porque as televisões o disseram, que um deles era luso-americano e que era segurança de uma companhia norte-americana que estaria ligada ao combate ao narcotráfico. Os restantes onze eram soldados e polícias do Governo colombiano. Terceiro, ainda de acordo com a Esquerda.net, esta operação contou com "estreita cooperação" dos Estados Unidos, segundo confirmou o embaixador americano em Bogotá.
Perante a pressão dos media o PCP elabora uma nota a esclarecer a sua posição. Incapaz de pegar o toiro pelos cornos, fica-se pelas meias palavras e pela ambiguidade costumeira. No entanto, ao contrário do que alguns comentadores acham, a nota contém alguns pontos que eu subscreveria. O primeiro afirma que, dado haver centenas de prisioneiros em ambos os lados do conflito, é necessário encontrar uma solução humanitária entre as partes. O que me parece ser correcto. Segundo que é preciso encontrar uma solução política e negociada para o conflito que se arrasta há mais de 40 anos. O que também é verdade.
Por último acrescenta-lhe uma frase de circunstância que diz que os comunistas portugueses apoiam a luta do povo colombiano contra “a opressão e exploração, pela justiça social, pela democracia e soberania nacional.”
A única coisa importante que não diz, como deixa no limbo muitas outras coisas que deveria dizer, é que se regozija com a libertação de Ingrid Betancourt.
Ao contrário dos nossos comentadores nacionais eu pouco sei do historial das FARC e da realidade colombina. No entanto, um dos exemplos mais flagrantes do que é a pobreza e a necessidade que ela gera, encontrei-o na Colômbia, quando profissionalmente, tive que me deslocar a Cartagena das Índias.
Sei que as FARC são um grupo guerrilheiro, que se declara marxista, pelo menos assim é apodado por todos os media. Mas também no seu tempo, Salvador Allende, quando era referido nos meios de comunicação social, tinha sempre associado ao seu nome o epíteto de marxista.
Sei que a Colômbia é governada por uma oligarquia muito pouco democrática, com grande apoio dos norte-americanos e que a guerrilha conduz há muito tempo uma guerra contra os vários governos. Com estes dados, e apesar das FARC serem consideradas pela União Europeia e pelos Estados Unidos como grupos terroristas, eu tenho muitas dúvidas em classificá-las assim e tenho a certeza que as operações dos Estado Unidos na América Latina visam sempre a manutenção das oligarquias no poder e que não têm qualquer intenção de democratizar e de resolver os problemas sociais daqueles países em que intervêm.
Reconheço que o caso da refém Ingrid Betancourt era sem dúvida uma história infeliz, que Chavez, e bem, tentou resolver a contento de todos, mas que, segundo parece, o Governo de Uribe sempre tentou sabotar, tendo conseguido agora libertá-la, com grande êxito propagandístico. Por isso, nós, comuns mortais, neste mundo onde a propaganda e contra-propaganda são o prato forte da acção política, temos que ter algum distanciamento para não embandeirarmos em arco com qualquer acção dos meios da direita dominantes. Isto para não empregar o termo imperialista que fere tantos ouvidos sensíveis.
Saudemos a libertação de Ingrid Betancourt e reconheçamos que esta operação, a ser verdade aquilo que nos contam, ver um artigo de Rebelion, foi uma operação de propaganda favorável ao Governo de Uribe e aos seu aliados norte-americanos, para não falar de Sarkosy.
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PS. (5/07/08): alguns amigos falaram-me da posição de Fidel de Castro sobre este tema. Fui ler no original o artigo que escreveu, muito mais longo e sobre outros assuntos, mas do qual respigo este texto (em espanhol), que me parece ser a posição mais correcta sobre a libertação dos reféns.
"Ingrid Betancourt, debilitada y enferma, así como otros cautivos en precarias condiciones de salud, difícilmente podrían resistir más tiempo.
Por elemental sentimiento de humanidad, nos alegró la noticia de que Ingrid Betancourt, tres ciudadanos norteamericanos y otros cautivos habían sido liberados. Nunca debieron ser secuestrados los civiles, ni mantenidos como prisioneros los militares en las condiciones de la selva. Eran hechos objetivamente crueles. Ningún propósito revolucionario lo podía justificar. En su momento, será necesario analizar con profundidad los factores subjetivos.
En Cuba ganamos nuestra guerra revolucionaria poniendo de inmediato en libertad y sin condición alguna a los prisioneros. Entregábamos a la Cruz Roja Internacional a los soldados y oficiales capturados en cada batalla, ocupando solo sus armas. Ningún soldado las depone si lo espera la muerte o un tratamiento cruel.
Observamos con preocupación cómo el imperialismo trata de explotar lo ocurrido en Colombia para ocultar y justificar sus horrendos crímenes de genocidio con otros pueblos, desviar la atención internacional de sus planes intervencionistas en Venezuela y Bolivia, y la presencia de la IV Flota en apoyo de la línea política que pretende liquidar totalmente la independencia y apoderarse de los recursos naturales de los demás países al sur de Estados Unidos." Fidel de Castro.

01/07/2008

Caminhos da Memória


Foi criado, no dia 15 de Junho, um novo blog, chama-se Caminhos da Memória. Segundo o editorial é feito por amigos da Associação Não Apaguem a Memória, mas não é o órgão oficioso da mesma, ou seja, como eles afirmam, as suas opiniões não comprometem aquela Associação.
O blog está bem feito, é sério, no sentido das opiniões expressas, não serem “engraçadinhas”, nem provocadoras, e percebe-se ao que vêm e o que querem.
Digo isto, porque hoje muitos blogs são escritos para os amigos, que antecipadamente já conhecem as graças de cada um. São muitas vezes redigidos com os pés, pois não se percebe o querem dizer, ou então estão cheios de provocações, dirigidas aos seus inimigos declarados. Eu que gosto das coisas bem explicadinhas, por isso escrevo grandes laudas, e que me irritam as “private jokes”, sou portanto apoiante deste blog.
Sei que haverá algumas opiniões com que não concordarei, mas como penso que a informação é sempre útil, e este blog é essencialmente informativo, parece-me pois que encontrarei nele ampla matéria para me reavivar a memória.
Um abraço aos blogonautas e que tenham muitos leitores.