25/02/2010

Tragédia na Madeira: Um desastre já anunciado há dois anos



Poderão dizer que é demasiada insistência, mas encontrei mais este vídeo, via Spectrum, tão actual e com imagem de boa qualidade que não resisti em incluí-lo no blog. O vídeo é do programa Biosfera, da RTP 2, que foi transmitido em Abril de 2008. A sua autora é Sílvia Camarinha, imagem de Sérgio Morgado, Edição de Marco Miranda, da Equipa Farol das Ideias.

É espantoso que estava tudo previsto pelos técnicos antes de acontecer. Só o Jardim é que não sabia ou não queria saber.

24/02/2010

Ribeiras - Perigo no Funchal

Depois de ouvir o Presidente do Governo Regional, Alberto João Jardim, chamar canalhas a quem duvidasse das suas palavras sobre a bondade do seu ordenamento do território, só me resta fazer uma canalhisse e mostrar este vídeo feito por Hélder Spínola, da Quercus, em 4 de Agosto de 2007, que já levantava todos os problemas relacionados com esta situação trágica que se está a viver na Madeira.

20/02/2010

Uma posição sobre Fernando Nobre


Porque tenho tomado posição sobre o que de mais importante tem vindo a suceder na vida nacional, principalmente em relação à área da esquerda, não posso deixar de opinar sobre a nova candidatura à Presidência da República e que pelo menos, em teoria, disputará um espaço que é de esquerda. Assim, e não querendo recorrer à chalaça para apreciar este novo candidato, irei mais uma vez maçar-vos com a prosa séria e pesada com que normalmente analiso a política nacional.

Vou utilizar como guião, porque facilita os meus objectivos, um texto de Fernando Teixeira, do 5 Dias , que se denomina Fernando. Nobre?, e que descreve as dez virtudes que aquele blogger encontra no candidato.
A primeira virtude é que esta candidatura entala a de Manuel Alegre, a segunda ridiculariza o Bloco de Esquerda, e a décima é que deixa o oportunismo à beira de um ataque de nervos, aqui o oportunismo resume-se às posições do Daniel de Oliveira, do Arrastão.
O texto em questão é uma das versões modernas do velho esquerdismo de antes de Abril e da altura do PREC. Ou seja, para este senhor o inimigo principal é Manuel Alegre, o Bloco de Esquerda e o oportunista mor, mas isso é uma questão pessoal do 5 Dias, o Daniel de Oliveira. No fundo retoma-se, com novas vestes, a velha linguagem dos esquerdistas que consideravam o PCP como o seu principal inimigo e alguns dos seus escribas como a expressão última do social-fascismo, socialistas nas palavras e fascista nos actos. Mas mesmo que não queira chamar-lhes estes nomes feios, quer o candidato Manuel Alegre, quer o Bloco de Esquerda, quer o “pobre” do Daniel de Oliveira, comportam-se para este opinador como novos oportunistas. Temos pois todos os condimentos para ressuscitar a velha linguagem de palha de antigamente.
Como se vê a direita passa nesta descrição, como se não existisse e como se não fosse, ela e o seu candidato, Cavaco Silva, o inimigo principal.

A terceira virtude é de que pressiona o PCP para apresentar uma candidatura não sectária. Nesta virtude destaca-se o desejo de alguém que, não sendo do PCP, quer influenciar este partido a apoiar o candidato de quem a priori se gosta. Já se sabe que aqui, e ainda bem, o PCP é suficientemente sectário para não ir nas melodias maviosas que lhe querem tocar. Bem pode o Vítor Dias no seu blog começar, mesmo que indirectamente, a fazer propaganda do Fernando Nobre, ou melhor contra o Manuel Alegre (vejam-se estes dois posts: aqui e aqui), porque o PCP irá sempre apresentar na altura própria o seu candidato, tal como foi, penso eu, decidido no último Congresso. Poderá sempre desistir na primeira volta. Mas sem candidato próprio não fica.

A quarta virtude é de não ser um candidato do Governo e do PS. Aqui, vem novamente à baila o sectarismo. O que pensa esta gente que é um candidato a Belém? Ou é um instrumento de agitação da esquerda e nesse caso Fernando Nobre não serve, ou é um candidato com possibilidades de ganhar e nesse sentido tem que contar sempre com o PS e por detrás deste partido está o Governo. Este facto foi sempre percebido pelo PCP, que nunca embarcou em aventuras esquerdistas. Não apoiou Otelo, não apoiou Maria de Lurdes Pintassilgo e, em último caso votou em Mário Soares, cuja prestação nos seus governos não era melhor que a de José Sócrates.
Eu não sei o que é que esta gente preferia, se era o PS ir apoiar o Jaime Gama, por exemplo, ou ser obrigado a apoiar o Manuel Alegre. A visão deles é sempre ao contrário da lógica da esquerda.

As outras virtudes já são de ordem da fezada política e literária. A quinta fala de que Nobre tem curriculum enquanto Manuel Alegre foi um mau deputado e é um poeta medíocre, sobre esta então nem me pronuncio. Quanto ao curriculum de Manuel Alegre lembro que não começou só com o 25 de Abril, ainda provavelmente Fernando Teixeira andava de cueiros já Alegre conspirava contra o fascismo e sofria na carne a prisão. Coisa que, eu saiba, é completamente omissa em Fernando Nobre.
A sexta é mesmo divertida: Fernando Nobre cria pontes com o movimento social. Mas qual movimento social? Será que o autor se quer referir às ONGs, coisa que toda a gente sabe que estão ao serviço da manutenção do stato quo. Hoje qualquer artigo de jornal de esquerda – este facto é mais engraçado porque ele cita na nona virtude uma entrevista do Fernando Nobre a propósito disso mesmo – critica as intervenções destas organizações no Terceiro Mundo. Em Portugal o único movimento social que verdadeiramente está implantado na sociedade e tem força real são os sindicatos e esses não me consta que tenham qualquer ligação a Fernando Nobre.
A sétima virtude contrapõe o internacionalismo de Nobre à visão patrioteira de Alegre e Cavaco. Meter no mesmo saco um homem da CEE, da Nato e do bloco ocidental e o Manuel Alegre, que de facto tem uma posição patriótica da nossa posição no mundo, é no fundo a visão sectária da realidade política nacional. Mas acho engraçado como na apresentação da candidatura de Fernando Nobre se acabou, com grande entusiasmo, a cantar o hino nacional. Só por grande distorção do pensamento se pode pensar que alguém que anda sempre em missões internacionais é um internacionalista.
Na oitava virtude diz que Nobre não andou nos últimos anos a preparar a sua candidatura a Belém como Alegre. Aqui não distingo que é mau do que é bom. Aquilo que para uns pode ser perserverança para outros é carreirismo.
A nona virtude já foi referida, é uma entrevista de Fernando Nobre à revista Rubra e a décima, é a dedicada ao Daniel de Oliveira.

É evidente que o post de Fernando Teixeira, que eu venho citando, põe ainda uma série de reticências em relação ao candidato. Mas, não ligando a muitos outros que entretanto publicou, ater-me-ia ao seu último, onde afirma: “É o primeiro candidato a dizer coisas de esquerda (ainda que poucas e vagas) sem qualquer compromisso com o PS e com este Governo.” Vai-se depois a ver e o post remete-nos para umas declarações que a TSF reproduz, de uma entrevista que F. Nobre deu ao Miguel Sousa Tavares, agora na SIC, em que diz que falou previamente com Mário Soares, mas não é lebre dele, mal seria se dissesse que era, e que Manuel Alegre, por ter estado sempre na Assembleia da República, é um dos responsáveis por esta situação política, enquanto ele, virgem política, aparece agora sem quaisquer responsabilidades. Francamente se isto é dizer coisas de esquerda, então o que será ser de esquerda. Perfeitamente lamentável, não Fernando Nobre, mas o nosso articulista.

Dito isto é perceptível que apoio Manuel Alegre, pelas razões que já invoquei noutros post anteriores (ver aqui e aqui) e que considero mau para a esquerda o aparecimento desta candidatura. Mas ao longo do ano, se puder, terei muito mais oportunidades de escrever sobre este assunto.
PS. (21/02/10): Nuno Ramos de Almeida em comentário a este post corrige-me o nome do blogger criticado, não se chama Fernando Teixeira mas sim Renato Teixeira. Ao visado as minhas desculpas.

Guia para um homem volúvel - o episódio




Fernando Penim Redondo, do DOTeCOMe, exibe no seu blog o episódio que eu relato, baseando-me unicamente na minha memória. Para que os meus leitores possam também rir às gargalhadas e confirmar aquilo que eu descrevi fui igualmente buscá-lo, na versão italiana, ao YouTube. Obrigado ao Fernando pelo seu trabalho inicial de pesquisa.

19/02/2010

Guia para um homem volúvel


Gene Kelly, num filme que se chamava em português Guia para um homem volúvel, tradução inventada pelas nossas distribuidoras de A Guide for the Married Man (1967), contava em diversos episódios como era possível um homem casado enganar a mulher, sem ser descoberto.
Aquele que me ficou na memória era a história de um homem que estava deitado com a amante na cama e é apanhado pela “legítima” nessa situação difícil para negar a existência de adultério. Com esta premissa começa uma das rábulas mais engraçadas que vi em cinema. A todas as perguntas que a esposa lhe faz ele nega que exista qualquer mulher naquele quarto. Negando sempre, dá tempo para se vestirem, fazerem a cama onde estavam deitados e a amante poder sair. Ele continua sempre a negar, e quando ela sai, diz que não sabe de quem é que a mulher está a falar. Esta perante a total negativa do marido e depois do próprio desaparecimento do objecto da sua inquirição chega mesmo a duvidar que tivesse visto o marido na cama com outra mulher. Não sei se o episódio tinha este nome, mas ele podia-se resumir nesta frase: nega, nega sempre.
Veio-me à memória este episódio tão engraçado do filme de Gene Kelly a propósito das declarações de José Sócrates sobre as escutas. E não só de José Sócrates, também de António Costa, na Quadratura do Círculo. Eles negam com tanta convicção aquilo que toda a gente está a ver que chegam a convencer-nos que nada daquilo que ouvimos e vemos é verdade. Porque não há qualquer dúvida. Apesar de todos garantirem que José Sócrates tinha mentido no Parlamento este vem hoje com toda a desfaçatez garantir mais uma vez que não sabia de nada. Tal como o homem casado que enganava a mulher, José Sócrates nega, nega sempre.

17/02/2010

A contra ofensiva


Resolveu José Sócrates convocar os órgãos dirigentes do PS para desencadear uma ofensiva contra todos aqueles que o andavam a criticar por querer dominar os meios de informação que lhe eram hostis.
Mas antes disso, enviou os seus homens de mão para abrirem caminho a essa contra ofensiva. Primeiro vem a artilharia pesada, comandada por Mário Soares que, em adiantado estado de senilidade e em nome da solidariedade militante, tenta, em artigo no Diário de Notícias, encobrir o chefe do Governo. No mesmo dia, Vital Moreira escreve no Público um artigo sobre a Censura Imaginária. Victor Dias, em O Tempo das Cerejas, já lhe deu a resposta devida. Ontem também, na SIC Notícias, em cantinho encantador, Mário Lino veio debitar a sua teoria. Para aquele ex-ministro, quando os administradores da PT, que foram apanhados nas escutas, se referem ao chefe, qualquer pessoa normal, diz ele, entenderia, que era do Presidente da PT que estavam a falar. Mas não, afirma ele indignado, vieram logo dizer que o chefe era o Primeiro-Ministro. Para quem não leu o Sol esta afirmação pode ter sentido, mas no contexto das escutas percebe-se perfeitamente que são referentes a Sócrates
Mas, o povo miúdo começa também a agitar-se, isto para não falar da convocação da manifestação e do Manifesto que, como diz Joana Lopes, virou Petição que por aí circulam. Assim, um conjunto de activistas do PS começou a encher as caixas do correio com notícias, comentários, transcrição de post, um mar de coisas.
Mas qual é o centro da questão. Já não estamos na fase de dizer que o conteúdo das escutas eram conversas privadas, que violam o segredo de justiça e que os media que as utilizam fazem um jornalismo de buraco da fechadura. Agora começou a fase de desvalorizar quem as denuncia e as suas intenções ocultas.
Demos um exemplo, em que facilmente a esquerda caiu. Daniel de Oliveira num post que chama Não falamos todos do mesmo quando falamos de liberdade de imprensa, reproduz uma notícia do Angola Digital que escreve que o jornalista Mário de Carvalho, não confundir com o escritor, tinha se demitido de coordenador do Sol em Luanda, por considerar diminuta a liberdade editorial de que dispunha. Pouco tempo antes recebi na minha caixa de correio um e-mail onde se transcrevia um texto de Joffre Justino, penso que militante do PS e antigo colaborador da UNITA, onde se diz: “Direito de antena? Zero! Criticas ao SOL? Zero! O caso de Mário Carvalho já era um caso sério e não um acto de entretenimento e manipulação. Resultado? Anule-se o caso.” Eu sei que não é preocupação do Daniel de Oliveira desvalorizar o caso das escutas e que o seu post só pretende separara o trigo do joio, mostrando que aqueles que aparecem como paladinos da liberdade de imprensa fazem o mesmo ou ainda pior que os outros que denunciam. Simplesmente como se viu este assunto serve logo para discredibilizar a denúncia das escutas feita pelo SOL e para mostrar que os media estão todos feitos uns com os outros para denegrirem o Governo.
Mas há mais. Nesse mesmo e-mail é dito que “a PT fechou os primeiros nove meses do ano com receitas operacionais de 4,9 mil milhões de euros…”. A seguir acrescenta-se “Apetecível empresa não?” Este tem sido o raciocínio mais divulgado: é tudo uma tramóia para se ficar com a golden share do Estado na PT ou então para a poder comprar. É como sempre a teoria da conspiração a funcionar. Falam das escutas mas o que querem é a PT. E o e-mail termina deste modo: “Por isso entendo bem quem decidiu marcar a Manifestação do dia 20, na Fonte Luminosa, pelas 15h, em defesa deste Governo, da Estabilidade, da Democracia, da Liberdade de Expressão e não de manipulação.” Sobre isto estamos conversados.

Mas este não é caso único, recebi outros e-mails em que o tom era o mesmo, ou desvalorizavam as escutas e quem as tinha feito ou então que toda esta operação visava o favorecimento dos grupos privados da comunicação.
Aquilo que eu desejo é que a esquerda, à esquerda do PS, tenha a cabeça fria e que, para não dar armas à direita, se embrulhe em tais contradições que a determinada altura pareça que está a defender Sócrates.
Fotografia de Robert Capa referente ao desembarque na Normandia, Omaha beach, em 6 de Junho de 1944.

15/02/2010

O que nos está a acontecer – a Situação Política


Não quero deixar de começar este meu novo post sem referir um outro que encontrei no blog António Garcia Pereira, pela mão de Joana Lopes, do Entre as Brumas da Memória.
Aquele dirigente do MRRP, primeiro, levanta-se indignado contra a divulgação das escutas e o incumprimento da providência cautelar e depois termina dizendo: “É óbvio que Sócrates deve ser derrubado do poder, e merece-o por inteiro devido não apenas à política anti-popular e anti-patriótica do seu Governo como também à sua insuportável e ditatorial arrogância. Mas deve sê-lo pelos métodos políticos democráticos, abertos e claros e não por manobras executadas como meios ínvios, ilegais e democraticamente incontroláveis. Mas a verdade é que agora, e fruto dessa mesma sua postura de altivez, a saída de Sócrates do poder é já e cada vez mais, inclusive dentro do próprio PS, uma mera questão de calendário…
Apesar de Garcia Pereira ser professor de direito e, por isso, respeitar intransigentemente a lei, isso não lhe deve toldar o raciocínio político. Enquanto Sócrates, com o apoio da direita, praticava aquela política "anti-popular e anti-patriótica" tinha índices de popularidade elevada e o PS garantia a maioria absoluta. Quando se começou a falar da sua licenciatura e depois do Freeport essa popularidade começou a baixar e o PS ficou-se pela maioria relativa. Bem pode agora Garcia Pereira dizer que é “uma mera questão de calendário” a “saída de Sócrates”, não fossem os casos que o Primeiro-Ministro foi criando, por culpa dele, evidentemente, ainda hoje o teríamos vitorioso à frente de uma nova maioria. Isto não quer dizer que valha tudo na luta política, apesar de não estarmos muito longe disso, mas as informações que obtivemos do que ele andava a tramar e sobre o seu carácter foram indispensáveis para o país perceber quem o governa.

Dito isto, eu compreendo o que atormenta Garcia Pereira e toda esquerda. No PCP por exemplo, quase que não se fala das escutas. Num blog, como o Castendo, de António Vilarigues não há uma única referência a este caso. É que quem está a comandar as operações ou a usufruir vantagens dela é a direita. São os seus homens de mão os principais actores deste melodrama. Garcia Pereira cita os exemplos de José Eduardo Moniz, que é fresco, ou das atitudes passadas do Arquitecto Saraiva, do SOL. Ninguém vê neles, excepto Pacheco Pereira (último Ponto, Contraponto), paladinos da liberdade. Mas, como diz o povo, “zangam-se as comadres sabem-se as verdades”. Por isso, considero esta situação de desgaste do Sócrates importante. Porque, lamento informar, ela dificilmente se alcançaria unicamente pela luta popular, conseguiram os professores em circunstâncias muito particulares e com uma Ministra que era um desastre.
Pelo que atrás se disse a esquerda teme que o apodrecimento da situação política traga a vitória da direita e de tudo aquilo que ela tem vindo a ameaçar fazer. Por isso trata este assunto com pinças. Só os meninos rabinos do 5 Dias (sem links específicos) é que resolveram, com grande ardor revolucionário, misturara-se, numa manifestação fracassada, com a gente da direita que defendia a liberdade de expressão.
Mas não podemos adiar por muito mais tempo o esclarecimento da situação política. Temos que nos preparar para novas eleições, para descermos à rua ou para exigirmos um novo Governo do PS, que dê um novo ânimo à esquerda e ao país. Não podemos deixar a situação arrastar-se e depois esperar, por milagre, que alguns votos da desagregação do PS nos caiam no regaço.
Pode ser que tudo passe e só depois das eleições presidenciais esta situação se resolva. É este o timing do Professor Marcelo. Mas quanto a mim pode ser que o assunto se resolva mais cedo. Mas tudo isto tem que ser discutido e pensado, mas acima de tudo temos que nos organizar para a luta, que os tempos que aí vêm não vão ser fáceis.

14/02/2010

O que nos está a acontecer – a Legalidade Democrática


Ainda recentemente numa discussão que não irei aqui aprofundar, nem fazer link, os meninos rabinos do blog 5 dias meteram-se com o Daniel de Oliveira, do Arrastão, devido à defesa que este último fazia do princípio tão caro às actuais sociedades capitalistas desenvolvidas do ocidente: a legalidade democrática.
Tenho para mim, sem querer fazer teoria sobre o Estado, que aquela depende da correlação de forças entre as classes dominantes e as dominadas, em que se chegou a um modus vivendi que permite uma confrontação pacífica entre estes dois grupos sociais. A legalidade democrática é a regra que permite essa convivência. Já se sabe que as classes dominantes tentam sempre modificá-la a seu favor, impondo cada vez maiores limites à acção das dominadas, enquanto estas lutam para fazer cumprir o contracto estabelecido e poder, em certas circunstâncias, ampliá-lo. Por vezes este equilíbrio rompe-se a favor das primeiras, temos as ditaduras e o fascismo, outras vezes, mais raras, a favor das segundas, podendo originar uma alteração revolucionária.
Dito isto, convém que as classes dominadas exijam sempre o cumprimento da legalidade democrática, nunca permitindo que a mesma seja subvertida.
Como exemplo, para mim dos mais flagrante, é exigência constitucional que estabelece o direito à manifestação, que foi regulamentado por lei e que permite que todos se manifestem, desde que informem previamente as autoridades. Portanto, quando o Governo e os meios de comunicação, numa clara ignorância do que está estipulado, vêm dizer que a manifestação não foi autorizada, estão claramente a exercer a prepotência e a romper a legalidade democrática. Mas apresentemos também o exemplo contrário. Como sucedeu há uns anos e foi agora rememorado por Ricardo Noronha, no 5 Dias, um conjunto de jovens resolveu convocar uma manifestação anti-autoritária, e, como o próprio nome sugere, não disseram nada às autoridades. Foram reprimidos selvaticamente e pelos vistos vai-se agora processar o julgamento de alguns, provavelmente os identificados. Neste caso temos, deliberadamente uma fuga à legalidade democrática. Situação perigosa, que dificulta a sua defesa e torna mais difícil as exigências de cumprimento daquela. Discutir isto levaria provavelmente a nunca me entender com os seus promotores e neste momento não é este o meu objectivo. Foi só um exemplo.

Escrita toda esta longa introdução, gostaria de afirmar que a divulgação pelos meios de comunicação social de escutas em segredo de justiça não é ilegal, no sentido em que a lei ignora este caso. Todos sabem que eu não sou jurista, mas por aquilo que tenho lido e ouvido, este assunto já tinha sido aventado a quando da discussão sobre a divulgação do segredo de justiça e recordo-me de se ter dito na altura que a sua divulgação pelos media não estava proibida, apesar de haver quem na altura o quisesse fazer.
Por isso, se bem percebi, o Ministro da Justiça já pediu ao Procurador da República que lhe apresente uma lei para regular este assunto, que espero que nunca seja aprovada.
Sobre a divulgação das escutas penso que estamos falados. O criminoso é quem as obteve, não quem as divulga nos media.
Sobre a providência cautelar já tenho mais dúvidas. Pelo ar indignado com que vi na SIC Notícias o magistrado Eurico Reis, próximo, penso eu, da ala esquerda do PS, deve ter havido grossa violação da legalidade democrática. Apesar do Sindicato dos Funcionários Judiciais garantir que devido à privatização de alguns serviços aquela notificação tinha sido mal entregue, pois o funcionário, que era privado e não público, não tinha recorrido, como era seu dever, à polícia para testemunhar que ninguém dos notificados a queria receber. Só ouvi estas declarações na TSF e não as li, nem as vi em mais parte nenhuma.
Acho que fez bem o SOL em revelar as escutas. Isto para além dos interesses particulares do seu director ou dos interesses comerciais de quem autoriza. A sua revelação constitui uma fonte de informação de indiscutível interesse para o público e para revelar as tramóias que são feitas nas nossas costas, mas quase sempre com o nosso dinheiro. A história dos países está cheia de episódios deste tipo e aqueles que marcam uma época foram os que foram revelados e não os silenciados. Aqui a legalidade democrática foi rompida, por interesses ainda não definidos, mas que necessariamente não irão na direcção das classes dominadas, mas que permitem alcançar uma vida pública mais sadia, ao desmascarar os poderosos e torná-los vulneráveis perante a opinião pública. Aqui tivemos um exemplo de uma manifestação anti-autoritária.

Dito isto e para não arrastar mais o post deixo as reflexões sobre a situação política para a próxima vez.

O que nos está a acontecer – a Liberdade de Imprensa


Com este título suficientemente vago, pretendo iniciar uma reflexão sobre o que se está a passar neste país.

Começo por um lamento. Escrevi já alguns textos (aqui e aqui) de índole pessoal sobre José Sócrates e o seu comportamento numa reunião internacional, ainda como Ministro do Ambiente, em que eu também participei, e que quanto a mim não tiveram quaisquer comentários significativos. Hoje, depois de tudo o que se sabe dele, até no modo como se relaciona com os seus homens de mão (veja-se o Sol desta semana), a apreciação que eu faço do seu carácter parece-me corresponder à realidade. Mas este é só um dos aspectos do problema que representa a manutenção de José Sócrates à frente dos destinos do país. Irei abordar outros.

Vamos agora às tão faladas liberdades de expressão e de imprensa. Quanto à primeira é visível que não está ameaçada. Isto porque é uma liberdade que, se não tiver suporte físico, não significa nada. Ou seja, eu posso em qualquer lugar dizer mal do Governo e de José Sócrates e até, com algumas limitações, na Internet, nos blogs pessoais – mesmo aqui, que eu saiba, já houve processos contra alguns bloggers –, mas se eu o quiser fazer nos media, já tenho algumas limitações. Dependo dos meios de comunicação que existem e de quem os controla. Aquela minha liberdade, para ser eficaz e poder extravasar o círculo de amigos onde vivo, precisa de ter um meio onde se expressar e ele nem sempre está acessível, mesmo que a minha opinião tenha qualidade. Exceptua-se deste caso os fóruns que alguns meios de comunicação criaram, nos canais de informação por cabo e na TSF, que eu conheça, que são autênticas catarses colectivas de crítica ao Governo.
Mas aprofundemos um pouco a questão. Na sociedade capitalista, nos dias de hoje, os media são propriedade de grandes grupos financeiros – que no caso português estão muito dependentes do Governo –, cuja liberdade está condicionada não só pelos interesses desses grupos mas também, em geral, pelo sistema ideológico dominante. Isto é um facto, e mesmo que na lei se fale da independência do director, dos conselhos de redacção e haja algumas garantias para os seus jornalistas, a verdade é que em última instância quem manda é quem paga o salário ao fim do mês. Apesar de achar bem que todos os jornalistas reivindiquem esta sua liberdade e independência – temos sempre que confrontar o poder com os seus limites – dificilmente pudemos fugir às imposições do patrão. É evidente que hoje qualquer órgão de informação não transmite só as directrizes do patrão. Para poder ser vendável tem que mostrar alguma independência, que lhe permita ter alguma credibilidade junto da opinião pública. Simplesmente, e de acordo, com aquilo que eu tenho escrito nos meus últimos posts (ver aqui e aqui) essa liberdade é condicionada pelas múltiplas escolhas e opções dos seus responsáveis, sejam eles quais forem.
Por isso, dizer que há liberdade absoluta de informar não é verdade. Não há, ela está condicionada nos grandes meios de comunicação.
O que é que Sócrates queria? Era tomar conta, por “interposta pessoa”, de uma série de órgãos de informação, onde não só podia condicionar a opinião, mas também correr com alguma gente incómoda. É evidente que os programas que se pretendiam eliminar não eram de esquerda. A esquerda, à esquerda do PS e mesmo a esquerda do PS, não tem qualquer órgão de informação que lhe seja favorável. Por isso, o que se pretendia suprimir eram os ataques que vinham da direita e é por isso que ela está neste momento a berrar tanto.
A indignação que percorre alguns comentaristas, políticos e jornalistas, provem daqueles a quem José Sócrates e os seus “amigos” estão a tentar cortar o pio. Porque convenhamos, quando são ataques à esquerda, que consistem normalmente em ignorar os seus pontos de vista, ninguém protesta.
Esta é quanto a mim aquilo que destaco politicamente deste assunto, no entanto isso não significa que possamos ficar indiferentes às acções de Sócrates contra a liberdade de imprensa. Não podemos é alinhar com o coro de virgens ofendidas em que se transformaram os arautos da direita. Temos que desmascarar não só os ataques à liberdade de informação, mas também todos aqueles que por omissão ou adulteração são quotidianamente cometidos contra as diversas opiniões da esquerda.
Só um exemplo, quando Pacheco Pereira, com razão, se indigna com o que se está a passar, esquece que no programa a Quadratura do Círculo, onde pontifica desde sempre, há muito que não a aparece alguém à esquerda do PS. Naquele programa quando se diz mal, por exemplo, do Bloco de Esquerda, os três comentaristas, com riso alvar, estão sempre de acordo e não há ninguém para contestar essa opinião. Por aqui vemos em que é que consiste a liberdade de imprensa para alguns, é só para eles e para os seus amigos, os outros que vão à vida.
Por isso, aquilo que quero afirmar é que a liberdade de imprensa quando nasce é para todos, o que não significa que ilibe Sócrates daquilo que está a fazer que é silenciar as vozes incómodas e influenciar a opinião pública.

Por aqui me fico, esperando noutros posts desenvolver outros aspectos da crise actual.
Imagem retirada do blog Wehave Kaosinthegarden

10/02/2010

Governo, José Sócrates e PS


As declarações que hoje o primeiro-ministro fez sobre o caso das escutas, para lá de representarem um completo desatino em matéria de transmissão de mensagem – está convencido que quanto mais gritar e criminalizar os jornalistas mais as pessoas lhe dão razão – revelam, ao mesmo tempo, um jogo de sombras preocupante.
Assim, nas primeiras declarações que fez, já lá vão uns meses, não sabia nada de nada. Até o seu correligionário António Vitorino declarou, nas Notas Soltas, que eram erradas, porque já todos sabiam que a TVI estava à venda. Depois, mais tarde, quando se começou a falar no processo Face Oculta, já veio dizer que oficialmente não sabia de nada, o que é muito diferente. Hoje finalmente vem declarar que o Governo nunca deu ordem para que a PT comprasse a TVI. Ou seja, o discurso foi-se afinando, de modo a se chegar a este preciosismo de que o Governo não decidiu em Conselho de Ministros que a PT iria comprar a TVI para afastar José Eduardo Moniz e Manuela Moura Guedes.
É interessante que no telejornal da hora do almoço, da RTP, o locutor ao resumir o que disse Sócrates declara que ele nunca tinha dado ordem para se comprar a TVI. Enquanto Sócrates falava no Governo o locutor já estava a transpor a decisão para Sócrates, coisa que de facto ele não se atreveu a declarar.
Torna-se portanto claro que Sócrates vai-se cada vez mais refugiar na acção do Governo, para garantir de que nada de que o acusam é verdade, quando não é difícil perceber que a actuação de um primeiro-ministro e da sua entourage é uma coisa que nunca estará de certeza vertida para decreto-lei. Já outra, diferente, é a acção do Governo que, segundo penso, terá que ser decidida em Conselho de Ministros ou pelo menos em despacho ministerial.
Portanto, Sócrates ainda não desmentiu que, com a cumplicidade de uma série de homens de mão, que espalhou por empresas públicas e privadas e que só o conseguiu fazer porque é primeiro-ministro, estava a preparar-se para calar de vez vozes incómodas, para ele, que não para a direita, verdade se diga.
É aqui que entra o PS. José Sócrates não toma estas atitudes enquanto Secretário-geral daquele partido, mas sim enquanto primeiro-ministro que tem o poder para o fazer. O PS só serve, primeiro, para lhe fornecer quadros fieis e depois para justificar a posteriori estas suas acções. Vimos hoje uma série de militantes, provavelmente com a morte na alma, a justificarem o injustificável, na certeza porem de que se não o fizessem tudo isto revertia para o PSD e para a direita. E é sempre para não dar armas ao adversário que se justificam as piores vilanias cometidas pelos nossos. A gente séria e de mãos limpas, que ainda existe naquele partido, se não toma qualquer atitude, não só se afunda com Sócrates, como é corresponsáveis pelo que tem vindo a acontecer.

07/02/2010

Agarrem-me, se não eu bato-lhe


Num programa da Quadratura do Círculo, António Costa disse que um Governo minoritário só se podia manter no Poder se governasse com altos índices de popularidade. Foi de facto o que sucedeu com os governos de Guterres.
Esta afirmação foi feita ainda em tempo de vacas gordas, quando se fingia que se desconhecia o valor do deficit e não se tinha ainda apresentado o orçamento. Hoje ela seria impossível, porque com as medidas restritivas que vão ser impostas, ninguém acredita que se possa governar com elevados índices de popularidade.
É evidente que esta opinião de António Costa era provavelmente só partilhada por ele, porque desde o princípio se percebeu que o Governo de José Sócrates não iria por aí. Iria utilizar a manobra política e a encenação como método de Governo, tentando dar o ar de que tinha sido muito correcto com a oposição e que esta o manietava, podendo a qualquer momento rebentar uma crise política.
Foi este o caminho seguido desde o princípio. Primeiro, a encenação com quem iria fazer governo. Comportou-se como a carochinha que estava à janela e se oferecia para qualquer um que passasse. Depois, tentando fazer jogo duplo com a oposição, prometendo ao CDS a resolução do problema dos professores e acabando por o solucionar com o PSD, que permitiu que este problema passasse para os sindicatos. A seguir a estratégia da vitimização, ao classificar um conjunto de medidas aprovadas na Assembleia da República, relativamente a impostos, como uma 6º feira negra, dia em que tinha verificado uma “coligação negativa” para o derrotar. Depois destas encenações, consegue, com a ajuda do Presidente da República, fazer passar orçamento, que era aquilo que no fundo lhe garantia a sobrevivência. Mas ainda este assunto estava a ser discutido, quando começa a encenação sobre a Lei das Finanças Regionais, esticando a corda até ao limite do possível, acabando ridiculamente com a palestra do Ministro das Finanças, na quinta-feira, onde depois da ameaça, nunca dita, mas sempre sugerida da sua demissão, acaba com o ministro a dizer que até 2013, não iria aplicar a tal lei. Estava de pedra e cal e nunca lhe passou pela cabeça demitir-se, isto não disse, mas é aquilo que se deduz de toda esta trágico-comédia.
Tenho para mim, que estas encenações e rábulas não poderão durar muito. Pode-se mentir uma vez, duas, três, mas a determinada altura já ninguém acredita nisso, daí o título do meu post: agarrem-me, se não eu bato-lhe.

Dito isto, penso que este Governo já ultrapassou o prazo de validade. José Sócrates é um incapaz e uma perigosa personagem, que as últimas revelações sobre as escutas da operação Face Oculta vieram pôr mais uma vez em destaque. O Partido Socialista corre o risco com este primeiro-ministro de se afundar nas próximas eleições.
O problema central desta crise é que não é só política, é também económica, com uma forte componente de terror junto da opinião pública, mas acima de tudo de quem vive do seu trabalho ou, pior ainda, da ausência dele. E esta situação nem sempre é boa conselheira. A história está cheia de exemplos de como podem acabar as crises económicas. A ascensão do nazi-fascismo foi a resolução pelas classes dominantes da crise de 1929, mas também a solução que as camadas intermédias e alguns trabalhadores encontraram para superar a situação de desgraça económica em que se encontravam.
Sem de modo algum considerar que estamos à porta do fascismo, a verdade é que esta crise, para que o PS de Sócrates nos está a arrastar, pode ser resolvida lamentavelmente a favor da direita. PSD e CDS, apoiados em Cavaco, podem muito bem resolver a situação a favor do grande capital e dos patrões, introduzindo os cortes que ultimamente se tem reclamado em relação aos salários da função pública e que rapidamente se estenderiam a todos os outros trabalhadores.
A esquerda, à esquerda do PS, tem que estar prevenida para isso. Não podendo cair nos braços de Sócrates, tem que mostrar que é também uma alternativa credível para a saída da crise. Sexta-feira parece que derrotámos o Governo ao aprovar a Lei das Finanças Regionais, e provavelmente não havia outra saída, mas amanhã pode ser a direita a derrotar-nos. Está tudo em aberto.

02/02/2010

Não é bílis, é indignação


Como é costume não tenho qualquer reacção dos meus leitores, até o operário para todas as horas e circunstâncias se foi embora, no entanto, imagino que andarão todos a pensar este tipo anda bilioso, irritado com os comentadores - até lhes promete pancada -, com as agências de rating, com a direita, com o programa de Mário Crespo, Plano Inclinado, com José Sócrates e o seu Governo, no fundo, com os media dominantes.
A verdade é que posso andar zangado com o mundo, mas quem como eu passa o dia a ver, nas horas certas, os noticiários da TV e principalmente os comentários que a toda a hora as televisões por cabo nos impingem, não posso, sendo de esquerda, andar muito feliz da vida. Ainda hoje no noticiário da 14h00, da SIC Notícias, lá vem um fiscalista, parece-me que foi assim que o apresentaram, propor uma redução nos vencimentos da função pública, aí de uns 20%, que, segundo ele, não acarretava a pobreza dos seus trabalhadores e dava muito jeito para a redução do deficit do Estado. E como exemplo citava a Irlanda e outros países que já o tinham feito. Ora a verdade, que eu saiba, isso só se verificou na Irlanda, acho que a Grécia ainda não o fez, portanto acrescentar “e outros países” parece-me uma maneira hábil de dizer que baixar salários, principalmente os dos outros, é o pão nosso de cada dia por essa Europa fora.

Mas já agora conto-vos o que é o dia de um aposentado que quer estar a par do que vai pelo mundo. De manhã, como me levanto tarde, já só vejo os noticiários das 10h00 das televisões por cabo: SIC Notícias e RTP N. As duas têm uma revista de imprensa. Foi na primeira que ouvi as afirmações do José Manuel Anes. Vocês achavam que eu devia ficar calado? Quem cala consente e eu penso que eram suficientemente graves, apoiando-se num artigo ainda pior, para não merecerem qualquer referência. Vieram logo a público e pessoalmente garantir-me que eu estava a ser injusto para com tão simpática personagem. Partindo do princípio que há afirmações mais graves, que eu deixo passar, pode ser que tenham razão.
Mas voltando às revistas de imprensa. A da SIC Notícias é, de um modo geral, inócua, leva lá pessoas que, por uma razão ou por outra, vão sobressair nos próximos dias. Já na RTP N temos logo o comentador de serviço que nos dá a orientação ideológica para a leitura dos jornais do dia. Fica-se com a ideia que os comentadores oscilam entre os afectos ao PS e os ligados à direita, partindo do princípio que em termos ideológicos não há diferença entre PSD e CDS. Já se sabe que da esquerda, à esquerda do PS, nunca vi lá nenhum. Se os há, estão tão bem escondidos que não se notam.
Depois, na hora do almoço e ao jantar, eu escolho a RTP, a televisão oficial. Sobre essa remeto-vos para a opinião do Pacheco Pereira, que já escreveu muito sobre o assunto, principalmente sobre as intervenções do primeiro-ministro que não têm qualquer contraditório. Depois às 14h00 temos a SIC Notícias, lá vêm os comentadores do costume, escolhidos a dedo, que só por mero acaso terão alguma coisa a ver com a esquerda e isto repete-se no noticiário das 19h00 e durante toda a noite com o Mário Crespo, às 21h00, e a Ana Lourenço, às 22h00. Sempre as mesmas opiniões, as dos partidos do arco governamental, como lhes gostam de chamar.
Ainda hoje, o tal fiscalista, amigo dos funcionários públicos, garantia que os partidos à esquerda do PS não contam, já que não apresentam propostas exequíveis para governar. Como se o problema fosse deles e não deste pensamento dominante que impregna os partidos da direita, o Governo de Sócrates e os media que os apoiam, que são todos.
Não será isto motivo suficiente para indignação?


PS.: ainda esta noite, para discutir os 100 dias de Governo a SIC Notícias convidou José Miguel Júdice, pelo Governo – e que apoio – e Maria João Avilez, pela oposição de direita, e assim lá completamos o arco constitucional.

01/02/2010

As Comemorações da Implantação da República


Muitos de nós tivemos um avô que andou envolvido com a República. Eu também não fujo à regra e as coisas que sei e conheci desse avô mais me levam a pensar que a República, aquela que se implantou, parece com a sua ajuda, em 1910, era amada pelas camadas populares citadinas e transportava nela um espírito de transformação e de melhoria para o nosso povo. A República era, no início do século XX, o progressismo possível.
Depois, quando eu nasci, os meus pais ainda me falavam da República como uma coisa boa, em oposição à ditadura que então imperava em Portugal. Com a adolescência e depois jovem adulto habituei-me, nem sempre, a ir ao Cemitério do Alto de S. João prestar homenagem aos vultos da República e a fugir à frente da polícia pela Morais Soares abaixo, ou até, mas isso não me recordo, de ir até à estátua de António José de Almeida, dar vivas à República. A República era também a nossa resistência ao fascismo.
Depois, com andar dos tempos, começamos a saber que a República também reprimia as greves e prendia e deportava os sindicalistas. Sabíamos também, nos tempos da ditadura, das dificuldades que existiam em fazer unidade com os velhos republicanos ou os seus herdeiros sociais-democratas. Mas, mesmo assim, a República foi sempre para mim a expressão progressista dos ideais de avanço social. Tenho sempre na memória a descrição da ida com o pai a um comício republicano do miúdo da Escola do Paraíso, do José Rodrigues Miguéis. Por isso quando hoje oiço e vejo o ar jesuítico com que os comentadores falam das comemorações da República, dizendo que teve coisa boas e más e uns inclinando-se mais para as coisas más e outros, muito poucos, para as coisas melhorezinhas sinto um arrepio e uma profunda indignação, porque a República ou se toma como todo e se encara como um dos passos para o progresso do país, como foi o 25 de Abril, ou então estas comemorações não passarão de um pastiche ou de uma recordação serôdia.

Vem tudo isto a propósito de uma série de coisas que fui ouvindo ontem, dia 31 de Janeiro. Primeiro, foi na SIC Notícias, António da Costa Pinto, bastante contido, a responder a uma perguntinha malandra da locutora de serviço se não seria altura de referendar a República. Achava que não. Depois foi às 19h00, na mesma estação, o locutor a pôr a mesma pergunta e a pedir comentários aos discursos que Sócrates e Cavaco tinham feito nesse dia de manhã. Luís Delgado, um dos comentadores de serviço, a afirmar que era monárquico – só nos faltava esta – e um jovem jornalista do Expresso, daqueles que devem querer fazer carreira rápida, bastante delambido, a dizer que era republicano, mas que achava que a República tinha sido um horror, mostrando uma ignorância profunda sobre a obra inicial da República: desconhecendo que a maioria das instituições civis existentes actualmente no país – casamentos civis, registo civil, lei do divórcio, etc. – são obra da República. Depois dizendo que bem andava o CDS em fazer comemorações separadas e falando mal do discurso de José Sócrates e bem do de Cavaco.
Depois, li um artigo no Público, daqueles que dá uma no cravo outro na ferradura, mas tem várias apreciações, uma de Rui Ramos – Um camelot de roi à portuguesa, como eu lhe chamei num post antigo – que tem esta pérola sobre a República: "Em termos de democratização, não foi um avanço, foi um dos mais graves retrocessos desde meados do século XIX." E outra de Manuel Loff, um historiador progressista, que comenta não só a opinião de Rui Ramos, afirmando que este "quer fazer da I República, se não um regime totalitário, uma espécie de estalinismo, pelo menos um projecto de natureza intrinsecamente revolucionária, que atacou de forma violenta e ilegítima as tradições mais enraizadas da sociedade portuguesa", como também dá a sua. Leiam, que vale a pena.
Por último, já hoje, este post de Victor Dias, que afirma, de acordo com o Público, que “um capelão militar discursou na cerimónia inaugural das comemorações do Centenário da República”.
Começam mal estas comemorações.

Mário Crespo ou o “Plano Inclinado” da direita


Dei de caras hoje com a notícia de que Mário Crespo tinha sido vítima de uma conversa hostil entre o Primeiro-ministro e os seus adjuntos, que pelos vistos queriam solucionar o problema que ele constitui na SIC Notícias. Foi o próprio que o escreveu em artigo que teve que ser publicado na página da net do Instituto Sá Carneiro, já que a sua crónica de opinião não foi admitida pelo jornal para onde vulgarmente escreve, o Jornal de Notícias.
Não me irei referir a Mário Crespo, nem o que penso dele, simplesmente num post anterior tinha dito horrores do seu programa na SIC Notícias, Plano Inclinado, provavelmente aquilo que mais incómodo está a causar ao Governo.
Ora bem, pode haver gente de esquerda que goste muito deste bota-abaixo sistemático encabeçado por Medina Carreira, acolitado por João Duque, um daqueles economistas de direita sempre prontos a pontificar na comunicação social, e por Nuno Crato, parece que bom cientista, mas o que não lhe dá qualquer especial mais-valia para falar de política, e normalmente sempre saindo em defesa da ideologia de direita.
Portanto, este programa, tenhamos consciência disso, leva a água ao moinho da direita, que, por exemplo, nestes temas do orçamento, apesar da “grande crítica” que podem representar as opiniões desbragadas e afascistadas de Medina Carreira, conduzem-nos sempre à ideologia que é preciso menos Estado, menos segurança social, menos defesa dos trabalhadores, maior flexibilidade e que devemos regressar, isso não o dizem, à Inglaterra vitoriana, com 14 e mais horas de trabalho por dia, despedimentos quando se quisesse e segurança social aquela que Deus desse. É esta a gente que nos andam a vender como os grandes ideólogos da reforma do Estado. Por isso, mesmo que Mário Crespo tenha imensa razão quando diz que José Sócrates não suporta a liberdade de imprensa, o que ele está a fazer conduz-nos, mesmo que indirectamente, à defesa dos interesses do Governo.

Já agora, e porque vos contei num post uma deslocação que efectuei ao Canadá, em serviço, e onde a determinada altura apareceu José Sócrates, como Ministro do Ambiente, quero-vos acrescentar mais qualquer coisa. Dizia eu na altura: “Foi acompanhado do seu fiel Secretário de Estado, Rui Gonçalves, e por mais alguns quadros superiores do Ministério, mas acima de tudo por jornalistas, uma delas da RTP I”. Ora a jornalista da RTP I era, nem mais nem menos, do que a Isabel Damásio, que hoje normalmente, entre outras actividades, faz as reportagens do Parlamento ou da actividade política. Ora quando eles chegaram, foi-nos logo dito, por quem de direito, estes até são dos melhores, mas é conveniente que estejam por longe. E assim foi até ao almoço final, onde, como eu vos relatei na altura, se foram sentar cerimoniosamente ao lado de José Sócrates, por imposição deste, e depois levados ao aeroporto nos carros da embaixada e reenviados para Lisboa, em executiva. São estes os jornalistas de que José Sócrates gosta.