Estão-se a avolumar à esquerda fortes pressões para que haja entendimento entre o PS e as forças à sua esquerda, particularmente o Bloco de Esquerda.
No post anterior, fiz uma ligeira referência ao assunto a propósito das declarações de Paulo Rangel num comício em Aveiro. Parece que primeiro foi Ana Gomes, depois Mário Soares a afirmar que não lhe repugnaria um acordo com o Bloco. Hoje, são dois artigos no Público assinados por André Freire e Elísio Estanque (para os quais não há links) sobre o mesmo assunto. Para terminar, e sem ter a importância das declarações anteriores, temos um artigo de Cipriano Justo para o site da Renovação Comunista.
De todas estas acções, aquela que poderá ter mais significado político é sem dúvida a de Mário Soares, que gosta sempre de mandar barro à parede para ver se pega.
Não tenho nada contra acordos pós-eleitorais entre as diferentes forças de esquerda, mas está-me a parecer que este tipo de propostas, vindas de destacados militantes do PS, se assemelham a uma célebre encenação protagonizada por Mário Soares, nos distantes anos setenta, em que, depois de ter visto o seu Governo de PS sozinho ser chumbado no Parlamento, propôs às diferentes forças políticas um acordo. Por esse motivo entrou em negociações com o PCP e o CDS, já que o PSD se recusava a colaborar, e depois de muitas negociações escolheu o CDS, dizendo que o PCP não queria coligar-se. O PCP afirmou na altura, ao contrário do que dizia o PS, que no campo da Reforma Agrária o que o PS tinha para propor era umas páginas em branco. Ou seja, tudo não passou de uma encenação para, atribuindo culpas ao PCP, fazer uma aliança com o CDS.
Não estou a dizer que é isto que vai suceder, temo é que, apesar das boas intenções de muitos, o PS como é seu hábito mude o bico ao prego e parecendo virar à esquerda, se prepare para se aliar à direita ou governar com o apoio dela.
Sem querer entrar em polémicas escusadas com os dois autores que publicam artigos hoje no Público, e que me merecem todo o respeito e consideração, gostaria de realçar algumas partes dos seus artigos que são objecto de alguns reparos.
Assim, André Freire diz: “há um certo défice de cultura democrática na “esquerda radical”: em democracia os números contam e, por isso, nunca poderão ser os pequenos a determinar as principais linhas de uma coligação. A não ser que só consigam governar em maioria absoluta … Claro que, num tal acordo, os pequenos obtêm geralmente um poder acrescido. Mas isto não significa que sejam eles a determinar o grosso do programa.” Verifica-se aqui uma crítica a um acontecimento que ainda não sucedeu, nem se sabe se irá suceder e que a prática continuada anterior nada faz prever.
O artigo de Elísio Estanque tem quanto a mim, pelo menos neste seu parágrafo, a virtude de tentar sossegar os espíritos mais irrequietos com a presença do Bloco numa coligação de esquerda. Diz ele: “a eventual influência do Bloco no governo (com ou sem ocupação de pastas no executivo) poderia garantir mais transparência e eficácia na acção reguladora do Estado, e, em contrapartida, essa eventualidade significaria que o Bloco assume o reformismo e a economia de mercado como eixos estruturantes socioeconómica”. E depois assegura que isso tem um preço para os sectores mais radicais do Bloco, mas seria um bem para a “história da esquerda e da democracia portuguesa.” Nada melhor para apaziguar os ânimos e fazer as ovelhas voltarem ao redil.
Citei longamente estes dois autores porque me parece que já há aqui demasiados aprioris para que qualquer concertação à esquerda tenha lugar.
Mas acima de tudo, nada faz pensar que, com Sócrates e a sua entourage, possa haver um acordo. Pressionar nesse sentido só poderá acarretar fracassos, quando não, e não quero fazer comparações com o que se passou com a Câmara de Lisboa, levar a água ao moinho de Sócrates e companhia.
Esperemos pelos resultados das eleições e estejamos atentos ao que dizem os seus principais protagonistas e depois falaremos sobre o assunto.
PS: já este post estava escrito, quando ouvi António Vitorino, no Notas Soltas, da RTP, com meridiana clareza, defender que não devia haver qualquer coligação com o Bloco de Esquerda e que, se o PS ganhasse, formaria Governo sozinho. Cada um assumiria depois as suas responsabilidades. Normalmente este tipo de declarações costumam conter uma chantagem implícita, típica do PS, se a direita não avalizar o orçamento é responsável por alianças à esquerda. Se a esquerda não o fizer corre o risco de apanhar com um Governo de direita. Ao longo dos anos o PS já nos habituou a esta chantagem. Esperemos que desta vez não resulte.
No post anterior, fiz uma ligeira referência ao assunto a propósito das declarações de Paulo Rangel num comício em Aveiro. Parece que primeiro foi Ana Gomes, depois Mário Soares a afirmar que não lhe repugnaria um acordo com o Bloco. Hoje, são dois artigos no Público assinados por André Freire e Elísio Estanque (para os quais não há links) sobre o mesmo assunto. Para terminar, e sem ter a importância das declarações anteriores, temos um artigo de Cipriano Justo para o site da Renovação Comunista.
De todas estas acções, aquela que poderá ter mais significado político é sem dúvida a de Mário Soares, que gosta sempre de mandar barro à parede para ver se pega.
Não tenho nada contra acordos pós-eleitorais entre as diferentes forças de esquerda, mas está-me a parecer que este tipo de propostas, vindas de destacados militantes do PS, se assemelham a uma célebre encenação protagonizada por Mário Soares, nos distantes anos setenta, em que, depois de ter visto o seu Governo de PS sozinho ser chumbado no Parlamento, propôs às diferentes forças políticas um acordo. Por esse motivo entrou em negociações com o PCP e o CDS, já que o PSD se recusava a colaborar, e depois de muitas negociações escolheu o CDS, dizendo que o PCP não queria coligar-se. O PCP afirmou na altura, ao contrário do que dizia o PS, que no campo da Reforma Agrária o que o PS tinha para propor era umas páginas em branco. Ou seja, tudo não passou de uma encenação para, atribuindo culpas ao PCP, fazer uma aliança com o CDS.
Não estou a dizer que é isto que vai suceder, temo é que, apesar das boas intenções de muitos, o PS como é seu hábito mude o bico ao prego e parecendo virar à esquerda, se prepare para se aliar à direita ou governar com o apoio dela.
Sem querer entrar em polémicas escusadas com os dois autores que publicam artigos hoje no Público, e que me merecem todo o respeito e consideração, gostaria de realçar algumas partes dos seus artigos que são objecto de alguns reparos.
Assim, André Freire diz: “há um certo défice de cultura democrática na “esquerda radical”: em democracia os números contam e, por isso, nunca poderão ser os pequenos a determinar as principais linhas de uma coligação. A não ser que só consigam governar em maioria absoluta … Claro que, num tal acordo, os pequenos obtêm geralmente um poder acrescido. Mas isto não significa que sejam eles a determinar o grosso do programa.” Verifica-se aqui uma crítica a um acontecimento que ainda não sucedeu, nem se sabe se irá suceder e que a prática continuada anterior nada faz prever.
O artigo de Elísio Estanque tem quanto a mim, pelo menos neste seu parágrafo, a virtude de tentar sossegar os espíritos mais irrequietos com a presença do Bloco numa coligação de esquerda. Diz ele: “a eventual influência do Bloco no governo (com ou sem ocupação de pastas no executivo) poderia garantir mais transparência e eficácia na acção reguladora do Estado, e, em contrapartida, essa eventualidade significaria que o Bloco assume o reformismo e a economia de mercado como eixos estruturantes socioeconómica”. E depois assegura que isso tem um preço para os sectores mais radicais do Bloco, mas seria um bem para a “história da esquerda e da democracia portuguesa.” Nada melhor para apaziguar os ânimos e fazer as ovelhas voltarem ao redil.
Citei longamente estes dois autores porque me parece que já há aqui demasiados aprioris para que qualquer concertação à esquerda tenha lugar.
Mas acima de tudo, nada faz pensar que, com Sócrates e a sua entourage, possa haver um acordo. Pressionar nesse sentido só poderá acarretar fracassos, quando não, e não quero fazer comparações com o que se passou com a Câmara de Lisboa, levar a água ao moinho de Sócrates e companhia.
Esperemos pelos resultados das eleições e estejamos atentos ao que dizem os seus principais protagonistas e depois falaremos sobre o assunto.
PS: já este post estava escrito, quando ouvi António Vitorino, no Notas Soltas, da RTP, com meridiana clareza, defender que não devia haver qualquer coligação com o Bloco de Esquerda e que, se o PS ganhasse, formaria Governo sozinho. Cada um assumiria depois as suas responsabilidades. Normalmente este tipo de declarações costumam conter uma chantagem implícita, típica do PS, se a direita não avalizar o orçamento é responsável por alianças à esquerda. Se a esquerda não o fizer corre o risco de apanhar com um Governo de direita. Ao longo dos anos o PS já nos habituou a esta chantagem. Esperemos que desta vez não resulte.
A fotografia é dos dirigentes da Frente Popular, que teve lugar em França em 1936. Destaca-se, de punho erguido, Leon Blum dirigente da corrente socialista francesa (SFIO).
5 comentários:
100% de acordo, Jorge. Penso exactamente o mesmo.
Mas afinal, qual a alternativa boa para o BE? M'explica? (Isto também se aplica à Joana)
Obrigado Joana, estimo que tenha apreciado.
Quanto à pergunta que me fazem, direi que é muito cedo para fazer cenários pós-eleitorais. Há uma coisa que desde o princípio tenho dito, o Bloco de Esquerda não se pode pôr, como alguns desejavam, em bicos dos pés para entrar para o Governo. Porque agora é fácil a uma ala do PS dizer que quer alianças como Bloco, cria boa impressão, mas o seu núcleo duro, de que faz parte o António Vitorio, tem provavelmente em mente outra solução. Nesse sentido temos que esperar pelos resultados, ouvir as declarações dos principais dirigentes e depois logo se verá. Diz-me a experiência que o PS, como sempre fez, se ganhar as eleições irá propor, como diz o António Vitorino, um Governo minoritário e depois, chantageando, cada um que assuma as suas responsabilidades. Não sei se o esclareci. Mas sendo eu votante do Bloco e até seu candidato independente à Assembleia Municipal de Lisboa, não sou nem filiado nem porta-voz, por isso as minhas opiniões são sempre solitárias e na base da minha experiência pessoal, que já é longa.
-Por falar em bicos de pés.
-Aquela do Louçã, não ver problemas em fazer campanha do be com o poeta do tal de possível - não será já um indicio da tal esquerda pequenina rasteirinha tipo António Vitorino, O Duro
Zé Carlos,
Publiquei agora um post no Brumas (sobre voto útil) que responde em parte. Eu sou simples eleitora do BE, junto a minha à voz do Jorge...
Mas o cenário que prefiro é governo PS, em minoria, e acordos parlamentares à esquerda.
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