Foram publicados ontem no Público dois artigos interessantes pelo contraditório que estabelecem entre si a propósito de coligações governamentais ou acordos de incidência parlamentar que poderiam resultar da eleição de uma maioria de esquerda para o Parlamento.
Assim, Sarsfield Cabral escreve um artigo, a que chama A retórica da esquerda unida, afirmando liminarmente que o PS está muito mais próximo politicamente do PSD e do CDS do que da sua esquerda, Bloco e PCP.
Cipriano Justo, assinando o artigo como dirigente da Renovação Comunista, retira lições das recentes eleições autárquicas para Lisboa – Lisboa é uma lição – e afirma que existe um bloco social que não se revê na fragmentação da esquerda.
Sou daqueles que mais tenho falado do problema da maioria de esquerda, da sua unidade e alianças. Não vou enumerar todos os posts em que já fiz referência a este tema, mas porque ele está na ordem do dia, vou, como se compreende, voltar a ele.
Sendo rápido e incisivo, direi que não é por acaso que à direita, entre PSD e CDS é tão fácil estabelecer acordos e que à esquerda, entre PS e PCP, isso tem sido impossível. É mais fácil, como já se verificou no passado, entre o PS e os outros dois partidos da direita, do que com os da sua esquerda. Este facto assenta na história recente da democracia portuguesa, mas igualmente na inserção de Portugal, no confronto da Guerra-Fria, num dos Blocos militares. Hoje estes já desapareceram, mas a sua memória e a nossa integração na NATO é ainda motivo para oposição a alianças entre o PS e a sua esquerda.
Como sabem, no tempo do PREC, a ruptura política deu-se entre os “moderados” do MFA, tendo por detrás o PS e toda a direita, e a esquerda militar gonçalvista e a extrema-esquerda otelista. A primeira era apoiada pelo PCP e a segunda por uma míriade de pequenos partidos da extrema-esquerda. Como eleitoralmente o PCP era o único que tinha votos, a acção dos partidos da extrema-esquerda esteve extremamente limitada, só tendo expressão eleitoral nas eleições presidenciais, como foi a primeira candidatura de Otelo, em 1976, à presidência da República e a de Maria de Lurdes Pintassilgo, anos depois.
Nesse sentido, sempre que houve na Assembleia da República maioria de esquerda, o PS tudo fez para que o PCP não entrasse para o Governo. Temos assim, o primeiro Governo PS sozinho ,em 1976, seguido depois do PS-CDS, com fingidas negociações com o PCP, e já posteriormente, nos anos 80, um Governo do Bloco Central, PS-PSD.
Guterres governa também em minoria, tentando no seu último Governo, quando já só lhe restava o queijo limiano, fazer acordos com o PCP, mas aí, verdade se diga, a situação, já era um bocado diferente dentro deste partido.
Mas não foi só a própria história da Revolução de Abril a influenciar estas opções do PS, foi como afirmei as pressões internacionais dos “nossos amigos” da NATO e das forças económicas dominantes em Portugal a impedirem que tal sucedesse.
Sem vos querer maçar com história da última metade do século XX, remeto-vos para um filme que está presentemente em exibição, chamado Il Divo, de Paolo Sorrentino, que é a biografia, dos últimos anos, de um dos políticos mais importantes da Democracia Cristã Italiana, um dos mais corruptos e dos mais comprometidos com a Máfia, e onde por meias palavras se fala na estratégia seguida em Itália, por uma facção da democracia-cristã, da extrema-direita, dos serviços secretos e da loja maçónica P 2, para numa estratégia de tensão, que implicava atentados bombistas e assassinatos, de que o de Aldo Moro é um possível exemplo, impedir o acesso do euro-comunista Partido Comunista Italiano ao poder.
Por isso, todos aqueles que, com alguma facilidade, falam das coligações ou alianças do PS com os partidos à sua esquerda não podem esquecer o peso histórico dessa interdição e, a meu ver, José Sócrates não tem o mínimo perfil político para ser capaz de na sociedade portuguesa romper com esta chantagem que a direita sempre impôs ao PS.
O artigo de Sarsfield Cabral é mais uma acha para as pressões de direita e do capital, já também expressas pelo patrão dos patrões, de impedir qualquer aliança do PS com a sua esquerda.
Gostaria, no entanto de chamar a atenção para que o texto daquele articulista é uma resposta a um abaixo-assinado, que por aí circula e de que Cipriano Justo é um dos principais subscritores, para um Compromisso de Esquerda. Apelo à estabilidade governativa. Assim, diz Sarsfield Cabral: “O tema da unidade da esquerda é propício a tiradas retóricas. Um mínimo de honestidade intelectual, sobretudo por parte de políticos com currículo e responsabilidades, deveria desfazer o nevoeiro ideológico e sentimental, evitando o palavreado oco para analisar o que, de facto, une e separa os partidos que se dizem de esquerda.” Sarsfield Cabral da sua superioridade de direita e de amigo do capital resolve falar da desonestidade intelectual dos outros. Sobre o conteúdo do próprio artigo e do seu desmascaramento já se pronunciaram, e bem, Ricardo Noronha, no 5 Dias, e Vítor Dias, em O Tempo das Cerejas.
Mas este exemplo só vem ilustrar, como em muitos outros que eu já descrevi, de que as alianças do PS com a sua esquerda não é um assunto fácil, de que se entra e sai, como nos acordos entre Paulo Portas e Santana.
Resta o artigo de Cipriano Justo, que analisarei numa segunda parte.
Assim, Sarsfield Cabral escreve um artigo, a que chama A retórica da esquerda unida, afirmando liminarmente que o PS está muito mais próximo politicamente do PSD e do CDS do que da sua esquerda, Bloco e PCP.
Cipriano Justo, assinando o artigo como dirigente da Renovação Comunista, retira lições das recentes eleições autárquicas para Lisboa – Lisboa é uma lição – e afirma que existe um bloco social que não se revê na fragmentação da esquerda.
Sou daqueles que mais tenho falado do problema da maioria de esquerda, da sua unidade e alianças. Não vou enumerar todos os posts em que já fiz referência a este tema, mas porque ele está na ordem do dia, vou, como se compreende, voltar a ele.
Sendo rápido e incisivo, direi que não é por acaso que à direita, entre PSD e CDS é tão fácil estabelecer acordos e que à esquerda, entre PS e PCP, isso tem sido impossível. É mais fácil, como já se verificou no passado, entre o PS e os outros dois partidos da direita, do que com os da sua esquerda. Este facto assenta na história recente da democracia portuguesa, mas igualmente na inserção de Portugal, no confronto da Guerra-Fria, num dos Blocos militares. Hoje estes já desapareceram, mas a sua memória e a nossa integração na NATO é ainda motivo para oposição a alianças entre o PS e a sua esquerda.
Como sabem, no tempo do PREC, a ruptura política deu-se entre os “moderados” do MFA, tendo por detrás o PS e toda a direita, e a esquerda militar gonçalvista e a extrema-esquerda otelista. A primeira era apoiada pelo PCP e a segunda por uma míriade de pequenos partidos da extrema-esquerda. Como eleitoralmente o PCP era o único que tinha votos, a acção dos partidos da extrema-esquerda esteve extremamente limitada, só tendo expressão eleitoral nas eleições presidenciais, como foi a primeira candidatura de Otelo, em 1976, à presidência da República e a de Maria de Lurdes Pintassilgo, anos depois.
Nesse sentido, sempre que houve na Assembleia da República maioria de esquerda, o PS tudo fez para que o PCP não entrasse para o Governo. Temos assim, o primeiro Governo PS sozinho ,em 1976, seguido depois do PS-CDS, com fingidas negociações com o PCP, e já posteriormente, nos anos 80, um Governo do Bloco Central, PS-PSD.
Guterres governa também em minoria, tentando no seu último Governo, quando já só lhe restava o queijo limiano, fazer acordos com o PCP, mas aí, verdade se diga, a situação, já era um bocado diferente dentro deste partido.
Mas não foi só a própria história da Revolução de Abril a influenciar estas opções do PS, foi como afirmei as pressões internacionais dos “nossos amigos” da NATO e das forças económicas dominantes em Portugal a impedirem que tal sucedesse.
Sem vos querer maçar com história da última metade do século XX, remeto-vos para um filme que está presentemente em exibição, chamado Il Divo, de Paolo Sorrentino, que é a biografia, dos últimos anos, de um dos políticos mais importantes da Democracia Cristã Italiana, um dos mais corruptos e dos mais comprometidos com a Máfia, e onde por meias palavras se fala na estratégia seguida em Itália, por uma facção da democracia-cristã, da extrema-direita, dos serviços secretos e da loja maçónica P 2, para numa estratégia de tensão, que implicava atentados bombistas e assassinatos, de que o de Aldo Moro é um possível exemplo, impedir o acesso do euro-comunista Partido Comunista Italiano ao poder.
Por isso, todos aqueles que, com alguma facilidade, falam das coligações ou alianças do PS com os partidos à sua esquerda não podem esquecer o peso histórico dessa interdição e, a meu ver, José Sócrates não tem o mínimo perfil político para ser capaz de na sociedade portuguesa romper com esta chantagem que a direita sempre impôs ao PS.
O artigo de Sarsfield Cabral é mais uma acha para as pressões de direita e do capital, já também expressas pelo patrão dos patrões, de impedir qualquer aliança do PS com a sua esquerda.
Gostaria, no entanto de chamar a atenção para que o texto daquele articulista é uma resposta a um abaixo-assinado, que por aí circula e de que Cipriano Justo é um dos principais subscritores, para um Compromisso de Esquerda. Apelo à estabilidade governativa. Assim, diz Sarsfield Cabral: “O tema da unidade da esquerda é propício a tiradas retóricas. Um mínimo de honestidade intelectual, sobretudo por parte de políticos com currículo e responsabilidades, deveria desfazer o nevoeiro ideológico e sentimental, evitando o palavreado oco para analisar o que, de facto, une e separa os partidos que se dizem de esquerda.” Sarsfield Cabral da sua superioridade de direita e de amigo do capital resolve falar da desonestidade intelectual dos outros. Sobre o conteúdo do próprio artigo e do seu desmascaramento já se pronunciaram, e bem, Ricardo Noronha, no 5 Dias, e Vítor Dias, em O Tempo das Cerejas.
Mas este exemplo só vem ilustrar, como em muitos outros que eu já descrevi, de que as alianças do PS com a sua esquerda não é um assunto fácil, de que se entra e sai, como nos acordos entre Paulo Portas e Santana.
Resta o artigo de Cipriano Justo, que analisarei numa segunda parte.
Sem comentários:
Enviar um comentário