16/04/2011

A tropa fandanga que nos governa

Ouvi ontem, como e meu costume, a Quadratura do Círculo. Teve a vantagem de dar uma novidade e de ordenar um pouco melhor os meandros da crise política que envolveu o PEC IV.

Comecemos pelo princípio. Criou-se a narrativa de que José Sócrates tinha iniciado as discussões em Bruxelas sobre o PEC IV sem quase dizer nada a ninguém. Não falou na véspera, quando se discutia a moção de censura do Bloco na Assembleia da República. Parece que nessa noite tinha feito um curto telefonema a informar Passos Coelho do que iria suceder no dia seguinte em Bruxelas, mas não disse nada ao Presidente da República. Na sexta-feira, ao mesmo tempo que se apresentava o PEC IV em Bruxelas, Teixeira dos Santos dava uma conferência de imprensa em Lisboa. Segundo a narrativa que nos veio a ser contada pela maioria dos comentadores políticos, José Sócrates, ao ignorar os actores políticos, pretendia abrir uma crise política. Outros achavam que este comportamento tinha sido involuntário, que se devia só ao mau feitio do Primeiro-Ministro. O PS argumentava mesmo que tudo isto era uma questão de forma e que o principal era entabular negociações com os partidos. Houve mesmo artigos a garantirem que a democracia era uma questão formal e o comportamento do Primeiro-Ministro era grave. E entre estas duas interpretações estabeleceu-se uma guerra de palavras entre PSD e PS.

No fim-de-semana passado o Expresso trazia uma caixa em que dizia simplesmente que afinal não tinha havido só um telefonema de Sócrates para Coelho, mas sim uma reunião. Logo a seguir, entrevistando Passos Coelho, Judite de Sousa faz-lhe a pergunta directamente, ao que este responde que é verdade e lá perdemos um dia com os dois partidos, PS e PSD, a insultarem-se. O primeiro dizendo que afinal tinha havido reunião e o segundo a desvalorizar a importância dessa reunião e das informações aí prestadas.

Mas o que é que ontem foi confirmado no programa da SIC Notícias, que Miguel Relvas, do PSD, tinha na manhã da conferência de imprensa apoiado as medidas do PEC IV e Pacheco Pereira afirmou que tinha havido um SMS dirigido aos deputados do PSD para que não fizessem comentários até ao fim do dia da reunião em Bruxelas, para não a prejudicar. Depois também se confirmou que na noite de sexta-feira, Marco António, vice-presidente do PSD, teria dito numa reunião que ou Passos Coelho escolhia ter eleições no país ou tinha eleições no Partido, tendo o líder do PSD preferido eleições no país.

Conclusão desta história. Toda a narrativa que nos foi contada, de Sócrates na sombra a esgueirar-se para Bruxelas e não dizer nada a ninguém é uma mentira pegada. Afinal tinha ido falar com o outro parceiro com quem andou a dançar o tango.

Mas igualmente o que é espantoso é que, perante a mentira de Passos Coelho, dizendo que só tinha havido um telefonema sem importância, Sócrates não tivesse vindo desmentir a situação, deixando avolumar a crise. Só quando lhe foi útil é que resolveu esgrimir contra Coelho esse encontro. Estão pois bem um para o outro e o pior é que é o país está a sofrer. Por outro lado, isto mostra também como muitas vezes se escreve no ar e se inventam narrativas que se enquadram muito bem no discurso, mas que no fundo não correspondem à realidade.

Somos mesmo governados por uma tropa fandanga.

2 comentários:

Armando Cerqueira disse...

Caro Jorge,
o homenzinho do PPD, por sinal muito mal educado, não se chama José Relvas mas sim Miguel, se a memória não me falha.
Um abraço,
Armando Cerqueira

Jorge Nascimento Fernandes disse...

Caro Armando Cerqueira
Tem toda a razão. Sucede que já não é a primeira vez que troco os nomes às pessoas e às coisas. Há sempre um bom amigo a avisar-me. A mais engraçada passou-se quando me referia à chegada do Avaro Cunhal depois do 25 de Abril, tendo dito que ele chegou a Lisboa, ao aeroporto de Pedras Rubras. Como se sabe o aeroporto de Lisboa é o da Portela.