Mas comecemos por aquilo que está relacionado com o post anterior, a tolerância de ponto. Também neste programa os comentadores residentes se atiraram como gato a bofe à tolerância de ponto concedida pelo Governo aos funcionários públicos. Pedro Marques Lopes chegou a afirmar que um sindicalista dos quadros técnicos tinha criticado essa decisão. Ora esse sindicalista é Bettencourt Picanço, da direcção do PSD. Era natural que tomasse essa posição, já que o seu partido fizera o mesmo. Depois chegou-se a sugerir que os outros sindicalistas tomassem igual posição e os dislates continuaram por aí fora. Tenho para mim que esta gente não percebe o que está em jogo.
Quando um funcionário entra para a administração pública tem um certo número de regalias e um certo número de deveres. Apesar de hoje as formas de contratação na função pública serem muito diferentes do que eram no meu tempo, sei que não existe nenhum contrato colectivo de trabalho entre os funcionários e o patrão-Estado, é a legislação que regularmente vai sendo produzida, com a consulta, muitas vezes formal, dos órgãos representativos dos trabalhadores, que rege as suas regalias e deveres. Por isso o Estado não pode ter para os funcionários público mais dias de descanso do que estabelece a legislação geral. Pelo contrário, um Contrato Colectivo de Trabalho, na parte que regula os dias de descanso dos trabalhadores, pode ter maior ou menor número do que aqueles que são estabelecidos por lei. E há ainda os contratos de empresa e as práticas das empresas. Sei que no sector bancário também é concedida a tarde de Quinta-feira Santa e igualmente a véspera de Natal. Ora bem, um funcionário público sabe que ao longo dos anos lhe têm sido concedidos esses dias. Não faz parte do seu contrato, porque não o têm, mas o normal é verificar-se, e este normal tem-se registado sempre. Como eu dizia a minha memória chegava aos anos 50.
Só ultimamente, com a demagogia que assola os Governos, as oposições e os media é que aquilo que era um facto de gestão corrente da administração pública, se transformou, num caso nacional que merece sempre os comentários sarcásticos dos media, e muitas vezes das oposições e desta vez até de uma funcionária do FMI.
Penso que sobre este assunto fui claro, apesar de não ser jurista.
Quanto ao título que encabeça o post só me limitaria, para não azedar as excelentes relações estabelecidas no grupo Manifesto, uma das associações políticas que compõem o Bloco de Esquerda, a dizer o seguinte. Parece-me que cada um dos comentadores tem a possibilidade de escolher os temas a tratar em cada programa. Daniel de Oliveira deve de certeza ter escolhido o tema a posição do Bloco perante a invasão da Líbia, num programa anterior, e agora este sobre a recusa do PCP e do Bloco em “negociar” com o a troika. Digo isto porque em qualquer deles foi unicamente o Daniel de Oliveira que falou, os outros comentaristas limitaram-se a “mandar as bocas” costumeiras, sem terem nada a acrescentar àquilo que Daniel de Oliveira disse. No primeiro caso até nem se estava a perceber a quem se referia Daniel de Oliveira e foi Pedro Marques Lopes que esclareceu que ele se referia ao Bloco de Esquerda.
No fundo foi o Daniel que escolheu os temas, o que não é simpático para o Bloco.
Acrescentaria só mais uma coisa, como o próprio Daniel de Oliveira disse, não se está neste momento a tratar de uma negociação, a troika só está a ouvir para formular uma política para Portugal. Daniel de Oliveira chegou mesmo a ridicularizar o PSD por pensar que estava a negociar. Mas no caso do Bloco e do PCP, mudou rapidamente de opinião e citou Lenine, quando este teria dito que até com o Diabo negociava para salvar a Revolução e de facto fê-lo, ao assinar com os alemães um tratado de paz que era quase a confissão de uma derrota nacional. Mas fê-lo e salvou a Revolução. Mas aqui, com diz Daniel de Oliveira, não se está a negociar, simplesmente a informar o inimigo das nossas posições. Parece-me desinteressante fazê-lo. Simplesmente acho que isto é discutível, ou seja, tudo se discute, mas só o devemos fazer quando há contraditório, estarmos a pô-lo em prática, sabendo que o nosso partido não tem as mesmas possibilidades de o concretizar, nem o acesso privilegiado aos media que o Daniel tem, não me parece justo. E mais não digo para não azedar as relações.
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