12/04/2011

Ainda candidatura de Alegre e os problemas da unidade de esquerda

O meu amigo Brissos, da Essência da Pólvora desafiou-me, de acordo com uma promessa feita por mim, a justificar a escolha de Manuel Alegre para candidato de alguma esquerda.

Este assunto, diria, estava morto e enterrado se não fosse Alegre ter ressuscitado neste Congresso do PS. Parece que quando o Bloco apresentou a Moção de Censura também lhe fez algumas críticas. Espero que Alegre, porque não ganhou as eleições, e não foi por culpa do Bloco, mas sim dos seus amigos socialistas, que não votaram nele, não tente transformar aquele partido no bode expiatório do seu fracasso, que também foi o nosso?

Dito isto, tentemos justificar a escolha que na altura se fez e que considero acertada.

Tenho para mim que o Bloco de Esquerda é, na actual conjuntura, o único partido de esquerda que manifesta uma certa preocupação com a política de unidade. Ainda há bem pouco tempo, neste post, referi umas declarações de Alfredo Barroso afirmando que o PS não tinha uma política de unidade à sua esquerda. Quanto a mim o PCP também não a tinha, pode ser que agora isso se tenha alterado.

Por isso, depois das eleições presidenciais de 2006 e a seguir ao resultado de mais de um milhão de votos no Manuel Alegre, contra o candidato oficial do PS, o Bloco inicia uma aproximação àquele, de que resultou os encontros do Trindade e da Aula Magna. O primeiro foi grande um êxito, tanto mais que o Trindade era uma sala pequena e os milhares de pessoas que por lá apareceram não couberem, nem a metade delas. Já na Aula Magna, apesar de ser um sucesso, esta estava longe de estar cheia. No entanto, estes dois encontros não deixaram de ser um acontecimento político importante, o que levou o Manuel Alegre, naquele momento, a encarar a hipótese de formar um partido, permitindo assim que a ala esquerda do PS rompesse com o PS oficial. Tudo isto são dados objectivos, que não podem ser descartados, nem esquecidos.

Esta operação teve alguns contratempos. Manuel Alegre mostrou alguma indecisão na ruptura com o PS e o Bloco não a forçou, nem a acalentou. Teve algum receio do que é que poderia vir de uma cisão precipitada e que, provavelmente, não teria pernas para andar, a não ser levada às costas pelo Bloco.

Por este motivo, preferiu que Manuel Alegre optasse antes por aquilo que ele indiscutivelmente queria, que era ser candidato outra vez a Presidente da República. Foi isto de facto que veio a suceder. Já se sabe que Manuel Alegre não seria candidato unicamente do Bloco, teria que ser também do PS e aqui é que a porca torce o rabo. O tempo que mediou entre a decisão bloquista de insinuar que o apoiava para candidato a Presidente, na sua última Convenção, em 2009, a apresentação da sua candidatura, parece-me logo no início de 2010, com o apoio imediato do Bloco, o arrastamento da decisão do PS, já no Verão de 2010, a degradação do Governo de Sócrates e o agravamento da crise económica, permitiram que em Janeiro de 2011, quando tiveram lugar as eleições, já fosse bastante penoso o Bloco aparecer de mãos dadas, por interposta pessoa, o Manuel Alegre, com o PS de Sócrates.

Este facto foi tão difícil que nem os bloquistas estavam convencidos em votar Manuel Alegre, mas mesmo assim acho que cumpriram com escrúpulo os seus compromissos, nem o PS estava motivado para votar em Alegre. O que de facto sucedeu. Por outro lado, os eleitores de 2006, raivosos com o socratismo, fugiram desta vez do candidato, distribuindo os seus votos por Nobre, que cumpriu de facto a missão que Mário Soares lhe destinou, por Coelho, pela abstenção e pelos brancos e nulos. Esta é de facto a minha interpretação dos factos. Muita gente poderá estar em desacordo com isto.

No entanto, podemos dizer que o êxito do Bloco quer nas europeias, quer depois nas legislativas, que só foi ofuscado por ser ultrapassado pelo CDS, deveu-se em grande parte ao esforço unitário desenvolvido no Trindade e na Aula Magna.

A “esquerda grande” defendida por Louçã correspondia a esta aliança entre o Bloco, independentes e a ala esquerda do PS. Hoje percebe-se quão fraca é essa ala esquerda e como facilmente foi seduzida pelo canto de sereia do PS de Sócrates. Neste Congresso estavam lá todos, até o Ferro Rodrigues. Só não vi a Maria de Belém.

Esta não será uma história edificante, até porque não houve uma alteração de forças a favor da esquerda, que era o objectivo da vitória de Alegre. Mas só quem não mete as mãos na massa é que pode depois vir dizer que sempre previu o que iria acontecer.

PS.: Sobre este mesmo assunto já escrevi este post, no entanto todo o meu blog está cheio de referências aqui e acolá às actividades e posições de Manuel Alegre ao longo destes últimos anos.

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