14/02/2010

O que nos está a acontecer – a Legalidade Democrática


Ainda recentemente numa discussão que não irei aqui aprofundar, nem fazer link, os meninos rabinos do blog 5 dias meteram-se com o Daniel de Oliveira, do Arrastão, devido à defesa que este último fazia do princípio tão caro às actuais sociedades capitalistas desenvolvidas do ocidente: a legalidade democrática.
Tenho para mim, sem querer fazer teoria sobre o Estado, que aquela depende da correlação de forças entre as classes dominantes e as dominadas, em que se chegou a um modus vivendi que permite uma confrontação pacífica entre estes dois grupos sociais. A legalidade democrática é a regra que permite essa convivência. Já se sabe que as classes dominantes tentam sempre modificá-la a seu favor, impondo cada vez maiores limites à acção das dominadas, enquanto estas lutam para fazer cumprir o contracto estabelecido e poder, em certas circunstâncias, ampliá-lo. Por vezes este equilíbrio rompe-se a favor das primeiras, temos as ditaduras e o fascismo, outras vezes, mais raras, a favor das segundas, podendo originar uma alteração revolucionária.
Dito isto, convém que as classes dominadas exijam sempre o cumprimento da legalidade democrática, nunca permitindo que a mesma seja subvertida.
Como exemplo, para mim dos mais flagrante, é exigência constitucional que estabelece o direito à manifestação, que foi regulamentado por lei e que permite que todos se manifestem, desde que informem previamente as autoridades. Portanto, quando o Governo e os meios de comunicação, numa clara ignorância do que está estipulado, vêm dizer que a manifestação não foi autorizada, estão claramente a exercer a prepotência e a romper a legalidade democrática. Mas apresentemos também o exemplo contrário. Como sucedeu há uns anos e foi agora rememorado por Ricardo Noronha, no 5 Dias, um conjunto de jovens resolveu convocar uma manifestação anti-autoritária, e, como o próprio nome sugere, não disseram nada às autoridades. Foram reprimidos selvaticamente e pelos vistos vai-se agora processar o julgamento de alguns, provavelmente os identificados. Neste caso temos, deliberadamente uma fuga à legalidade democrática. Situação perigosa, que dificulta a sua defesa e torna mais difícil as exigências de cumprimento daquela. Discutir isto levaria provavelmente a nunca me entender com os seus promotores e neste momento não é este o meu objectivo. Foi só um exemplo.

Escrita toda esta longa introdução, gostaria de afirmar que a divulgação pelos meios de comunicação social de escutas em segredo de justiça não é ilegal, no sentido em que a lei ignora este caso. Todos sabem que eu não sou jurista, mas por aquilo que tenho lido e ouvido, este assunto já tinha sido aventado a quando da discussão sobre a divulgação do segredo de justiça e recordo-me de se ter dito na altura que a sua divulgação pelos media não estava proibida, apesar de haver quem na altura o quisesse fazer.
Por isso, se bem percebi, o Ministro da Justiça já pediu ao Procurador da República que lhe apresente uma lei para regular este assunto, que espero que nunca seja aprovada.
Sobre a divulgação das escutas penso que estamos falados. O criminoso é quem as obteve, não quem as divulga nos media.
Sobre a providência cautelar já tenho mais dúvidas. Pelo ar indignado com que vi na SIC Notícias o magistrado Eurico Reis, próximo, penso eu, da ala esquerda do PS, deve ter havido grossa violação da legalidade democrática. Apesar do Sindicato dos Funcionários Judiciais garantir que devido à privatização de alguns serviços aquela notificação tinha sido mal entregue, pois o funcionário, que era privado e não público, não tinha recorrido, como era seu dever, à polícia para testemunhar que ninguém dos notificados a queria receber. Só ouvi estas declarações na TSF e não as li, nem as vi em mais parte nenhuma.
Acho que fez bem o SOL em revelar as escutas. Isto para além dos interesses particulares do seu director ou dos interesses comerciais de quem autoriza. A sua revelação constitui uma fonte de informação de indiscutível interesse para o público e para revelar as tramóias que são feitas nas nossas costas, mas quase sempre com o nosso dinheiro. A história dos países está cheia de episódios deste tipo e aqueles que marcam uma época foram os que foram revelados e não os silenciados. Aqui a legalidade democrática foi rompida, por interesses ainda não definidos, mas que necessariamente não irão na direcção das classes dominadas, mas que permitem alcançar uma vida pública mais sadia, ao desmascarar os poderosos e torná-los vulneráveis perante a opinião pública. Aqui tivemos um exemplo de uma manifestação anti-autoritária.

Dito isto e para não arrastar mais o post deixo as reflexões sobre a situação política para a próxima vez.

2 comentários:

Anónimo disse...

Tenho um certo horror às preversões tenocráticas que, não poucas vezes , ocultam a dinâmica social e mascaram o frentismo para a resolução da problemática politica de fundo.
O problema de Portugal vem de trás e transporta com ele a irresolução da nossa estrutura económica ,das fragilidades do tecido produtivo e, claro está, do desmantelamento de algum potencial de que ainda dispunhamos aquando da nossa integração na UE.Como ignorar que são estes factores que têm uma clara incidência na dependência do país com o exterior e nos obstáculos que travam a nossa saùde económica e financeira? Sócrates, Slogans e Palavras de ordem rebuscadas nas velharias?

Jorge Nascimento Fernandes disse...

Lamento caro anónimo,mas não percebo o que é que aquilo que diz tem a ver com o que escrevo. Por outro lado, também não percebo muito bem o que quer dizer, apesar de achar que talvez esteja de acordo como seu segundo parágrafo.