26/10/2008

Umas trapalhadas curiosas


Recebi recentemente, via e-mail um texto em português denominado O capitalismo tentou romper seus limites históricos e criou um novo 1929, ou pior da autoria de François Chesnais, e com a data de 16/10/08, e que tinha sido publicado inicialmente em castelhano, pela revista electrónica Herramienta, em 30/09/08. Perguntei de imediato a quem mo enviou qual a sua proveniência. Não me soube responder.
Como na net ninguém traduz nada de graça, ou seja, sem qualquer objectivo, suspeitei que o texto já devia ter sido publicado noutro site ou blog, mas apesar disso dei-me ao trabalho de o ir confrontar com o original, de modo a verificar se a tradução estava correcta e a podia reproduzir. Como sou um dos editores do site Comunistas.info pensava publicá-la lá.
Antes do o fazer, achei que devia confirmar se aquele texto tinha aparecido naqueles sites que, em português, normalmente transcrevem textos de autores marxistas, ODiário e o Resistir.info , que depois são reproduzidos nos vários blogs de pessoal ligado ao PCP. Lá estava ele em ODiário, com aquela data e numa tradução de Coutinho Duarte.
Achei por bem, para não dizerem que o Comunistas.info reproduzia um texto de ODiário, do Miguel Urbano Rodrigues, que não devia publicar aquela tradução e sim a versão original do Herramienta, onde tinha o título “Como la crisis del 29, o mas… Um novo contexto mundial”, que eu aportuguesei para uma frase semelhante.
Depois deste trabalho todo, e praguejando contra aqueles que me tinham enviado um texto sem saberem a origem, vim a descobrir, num trabalho quase de detective, o seguinte:
1 – A primeira tradução para português tinha sido publicada pelo Esquerda.net, em 8/10/08, com o título Crise vem pôr a nu os limites históricos do sistema capitalista , numa tradução de Luís Leiria. A versão de ODiário diferia pouco desta, apesar de não ser rigorosamente igual.
2 – O site Carta Maior , brasileiro, que também reproduz todos estes textos de autores marxistas famosos, publicou, a 9/10/08, duas versões iguais da tradução do Esquerda.net, mas alterou-lhes os títulos e fez introduções ligeiramente diferentes, mas em qualquer delas indicando o autor da tradução e a origem. Assim, a versão incluída numa secção chamada Economia tinha o título O capitalismo tentou romper seus limites históricos e criou um novo 1929, ou pior, e que foi o título que ODiário utilizou, a outra, com o mesmo título do Esquerda-net, inseriu-a na secção dos Colunistas. Já agora, porque me pareceu interessante, recomendo este site.
3 – O Comuneiro, revista electrónica portuguesa, que também reproduz textos deste tipo, publicou a tradução do Esquerda.net, indicando a sua origem, e com um título igual .
4 – A par de tudo isto, descobri numa pesquisa rápida no Google que havia igualmente blogs que tinham reproduzido o texto com o nome dado pela Esquerda.net, indicando a origem. Assim, encontramos aquele artigo no blog brasileiro Outra Política, no de João Vasconcelos, militante do Bloco de Esquerda, Fénix Vermelha, e, espantosamente, em Notícias Evangélicas, Política, que remete a sua leitura para o Esquerda.net. De onde menos se espera é que elas aprecem. Louvado seja o Senhor.
5 – Com o nome que aparece na outra versão do Carta Maior, que me parece que foi a mais acessível para o público brasileiro, existe uma variedade enorme de sites e blogs que reproduzem aquele texto.
A conclusão que se pode tirar de todo este arrazoado, aborrecido, mas que resulta do meu espírito de coca-bichinhos, como “bom” biólogo que sou, é que à esquerda, provavelmente também à direita, há uma série de autores que tiraram assinatura para escreverem sobre o os males do mundo, e que são transcritos por todo o bicho-careta. Nada disto é grave, podemos até dizer que é bom, convém é que haja alguma ética, de modo a que a origem dos textos fique sempre assegurada.
Este facto também ilustra a guerra política que vai pela nossa Internet. Nada custava ao ODiário dizer que o seu texto é uma revisão da tradução efectuada pelo Esquerda.net, que foi publicada muito antes, e que foi buscar o título ao site Carta Maior, para que não houvesse confusões com o do portal do Bloco de Esquerda. Eu próprio, reconheço, também alinhei nisto, dado que me recusei a publicar a tradução de ODiário. Simplesmente não fiz uma revisão do texto e pus o meu nome, achei que o melhor era publicar a versão original, em castelhano.
Termino com uma recomendação piedosa: espero que, no futuro, haja mais solidariedade entre todos aqueles que se reclamam da esquerda e publicam textos na net.
A fotografia é de François Chesnais

2 comentários:

Luis Leiria disse...

Caro Jorge,
Só falta esclarecer um pormenor da sua correcta investigação: eu tomei a liberdade de alterar o título do texto publicado na Herramienta, porque era uma transcrição de uma intervenção oral. Se fosse um texto escrito, até poderia ter mudado o título, mas antes teria pedido autorização.
Saudações,

Jorge Nascimento Fernandes disse...

Obrigado pelo seu esclarecimento. Como percebeu do meu texto, nunca pus em dúvida o título que atribuiu à comunicação do François Chesnais. Mas já me tinha interrogado o porquê dessa diferença. É evidente que o título que escolheu está muito melhor, tal como aquele que também foi dado pelo Carta Maior.
Como já deve ter reparado se consultou Comunistas.info já fiz referência a uma série de artigos que você traduziu e que foram publicados no Esquerda.net e que eu desconhecia.
Um abraço
Jorge