24/03/2011

A união da esquerda e as suas dificuldades

Publicou Ricardo Paes Mamede no blog Ladrões de Bicicletas um post, chamado Momento de verdade para a esquerda portuguesa, donde sublinharia estes dois parágrafos:

E a esquerda? PCP e BE estão mais uma vez encurralados. Num cenário em que a situação interna e os constrangimentos externos deixam pouco espaço de manobra, não têm conseguido fazer muito mais do que anunciar que vem aí o desastre. Podem até ter razão. Mas para a maioria das pessoas, inclusive muitos dos seus eleitores, serão vistos ou como parte do problema (contribuindo para a ingovernabilidade) ou, pelo menos, como não sendo parte de qualquer solução.

Mas PCP e BE poderiam dar um sinal diferente. Poderiam ter a iniciativa de se apresentar com uma plataforma comum, propondo ao PS um conjunto de condições mínimas para apoiar uma solução para a crise assente numa maioria de esquerda no Parlamento. Uma solução que mostrasse que existem outros caminhos possíveis, mesmo com todos os constrangimentos internos e externos.

A transcrição é longa, mas parece-me que é indispensável para se poder compreender o que vem a seguir. José Neves, logo de seguida, No Vias de Facto, não assina por baixo, mas gosta de ler. Victor Dias, no Tempo das Cerejas, dá-lhe uma corrida em forma, a que Paes Mamede responde educada e contidamente. Não é como eu, que atiro a matar. Nuno Ramos de Almeida, no Cinco Dias, recomenda vivamente a leitura dos dois posts de Paes Mamede, num texto que denomina Para um programa comum das esquerdas em copy lefte e a finalizar José Neves volta novamente ao tema em A esquerda em Portugal nas próximas eleições .

Feita esta descrição rápida da agitação que este tema motivou na blogosfera, é evidente que associado à queda de José Sócrates e à proximidade de eleições, passemos àquilo que me interessa comentar.

Em vivi muito traumaticamente um período da política portuguesa que vai desde o lançamento do Apelo à Convergência de Esquerda nas eleições para Lisboa (ver aquiaqui, aqui  e aqui), penso que faz agora dois anos, a um Compromisso à Esquerda – Apelo à estabilidade governativa (ver aqui), publicado logo a seguir às eleições legislativas de finais de Setembro de 2009. Qualquer dos dois apelos assentava no pressuposto de que o PS estaria disposto a fazer unidade à esquerda e que a sua a esquerda estaria disposta a se “amarrar” aos interesses do PS. Lamento, mas muito da argumentação na altura aduzida para fundamentar aqueles dois apelos era um pouco a mesma do post inicial de Paes Mamede A esquerda à esquerda do PS propunha qualquer coisa ao PS e se ele não aceitasse a responsabilidade era de quem não aceitava. Em qualquer dos casos, o PS deu resposta, com mais êxito em Lisboa, porque levou Helena Roseta consigo, ridícula, excepto para os convertidos, em relação ao Governo do país, ao convocar todo o mundo para S. Bento.

Em resposta a esta recusa da esquerda, neste caso o Bloco, de alinhar como o PS, publicou recentemente André Freire, no Público, um artigo chamado A moção, o passado e o futuro (sem link disponível) que propunha a criação de um novo partido que correspondesse àquilo que André Freire considerava que deveria ser a missão do Bloco, que, por palavras minhas, seria a muleta do PS. Francisco Louçã, no Esquerda.net, já lhe deu a resposta política devida.

Neste mesmo sentido, iniciaram-se movimentações para criar um novo partido, que parece já estarem em marcha, tendo em vista que, com mais um partenaire, se consegue finalmente unidade de todos. Já se sabe o que é que este novo partido pretende, sem o dizer, é dispor dos deputados que faltam ao PS para governar.

Por isso quando vi o artigo do Paes Mamede e a recomendação da sua leitura pelo José Neves, pensei que novamente uma loucura mansa estava a atacar a esquerda portuguesa.

Pela postura posterior do José Neves, na sua análise de como se deve comportar a esquerda, e no artigo do Ramos de Almeida já encontro matéria suficiente para concordar. Ou seja, parece-me claro que com o PS oficial, o de José Sócrates, que mais uma vez vai concorrer às eleições, é impossível qualquer acordo. Ele e o seu partido representam aquilo que mais negativo existe na política portuguesa, a de estarem a fazer o “mal”, a atacarem as classes mais desfavorecidas e os interesses de quem trabalha, convencidos que estão a fazer o “bem” e a tentarem convencer-nos disso. Nesse sentido qualquer aliança ou proposta de entendimento com este PS e José Sócrates deve ser combatida. Evita-se assim criar ilusões nas massas populares e a presunção num conjunto de eleitores de que, se falarmos todos uns com os outros, nos entendemos para bem da esquerda.

Mas o que propõe José Neves e Ramos de Almeida já me parece razoável que é a unidade ou a colaboração ou qualquer outra forma de enlace entre o Bloco e o PCP, com a adesão de independentes, de gente do MIC ou mesmo algum PS de esquerda que para aí esteja mais virado. Por isso acho que Vítor Dias não tem razão no seu último parágrafo quando diz e sublinha: as pré-campanhas as campanhas eleitorais, por natureza e definição, não são um território para negociações entre partidos por via da comunicação social, antes são, por excelência, o território central da exposição dos projectos e propostas de cada partido, do seu diálogo directo com os eleitores e do esforço tenaz, combativo e confiante para conquistar uma influência maior e criar uma diferente correlação de forças que influencie a evolução da vida política e das soluções políticas e governativas após as eleições.

Já se sabe, que ninguém estaria à espera que houvesse negociações através da comunicação social, mas lá que a esquerda, à esquerda do PS, tinha muito mais força se aparecesse unida e com projectos exequíveis, é um facto. Não votaram os dois partidos na Assembleia da República em conjunto os segundos pontos das suas Resoluções em que propunham uma alternativa aos ditames do PEC e não votou o PS com a direita contra esses mesmos pontos? Se isto foi possível, porque não nos esforçarmos para apresentar em conjunto ao eleitor qualquer alternativa viável em vez de cada um por si.

Parece-me que isso está ao alcance da esquerda.

Imagem da Frente Poular de 1936, em França, vendo-se León Blum, da SFIO (Secção Francesa da Internacional Socialista - Partido Socialista da época) e Maurice Thorez, do PCF (Partido Comunista Francês).

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