Em tempos antigos, nos Governos de Mário Soares, Sá Carneiro ou Cavaco Silva, era normal o Telejornal, da RTP 1, estar ao serviço dos interesses destas personagens, que para isso nomeavam administrações obedientes e submissas. Era vulgar, e lembro-me bem disso, que uma greve da função pública fosse noticiada lá para o fim do Telejornal e fosse despachada, muitas vezes em termos provocatórios, em meia dúzia de segundos. Com o advento dos canais privados de televisão e devido às necessidades da concorrência, os telejornais, de um modo geral, passaram a noticiar as manifestações da CGTP ou as greves da função pública com mais objectividade e pormenor, apesar daqueles não deixarem de ser controlados pelo poder político.
Vem isto a propósito do modo como no Telejornal de hoje se noticiou a manifestação da CGTP, por mim anunciada no post anterior.
José Rodrigues do Santos (JRS), logo no início do Telejornal, depois das notícias dos primeiros ataques à Líbia, começa por dizer que funcionários do Sector Público concentraram-se em Lisboa num protesto nacional organizado pela CGTP. Grande mentira. Depois temos a reportagem do local para onde o sector público tinha sido convocado, dizendo que os 600 mil (onde sei onde foram arranjar este número) funcionários se fizeram representar por uns milhares. Pouca gente, porque ainda estávamos no início da concentração, digo eu, com a repórter a tentar apanhar o anedótico e a fazer comparação com a manifestação do dia 12, da geração à rasca e, terminando, dizendo que estas pessoas queriam protestar contra o Estado por este ser um mau patrão. No fundo, ainda descobríamos que aqueles manifestantes eram adeptos do Passos Coelho e queriam emagrecer o Estado. A finalizar, a repórter lá diz que estes trabalhadores se juntaram aos restantes manifestantes.
Corta e regressamos ao JRS, que seguir fala da manifestação do sector privado que teve início no Saldanha. O mesmo tipo de reportagem, mas termina com a repórter a afirmar que milhares de pessoas do sector público e privado se juntaram da Avenida da Liberdade. Finalmente lá temos só uma manifestação.
Quase no final do Telejornal, passado que foram cerca de quarenta minutos sobre as imagens iniciais, diz-se que Carvalho da Silva atacou o Plano de Austeridade, o Governo e também o PSD “na manifestação”. Aqui já nos perdemos e não sabemos a que manifestação se está a referir o JRS. Finalmente, é apresentado um pequeno excerto do discurso do dirigente da Intersindical, dizendo que ele tinha sido pronunciado na manifestação da CGTP. Esta reportagem é mais abrangente, pois são entrevistados os lideres do PCP e do Bloco e é mostrada a intervenção musical dos Homens da Luta. Imagens, não muitas, da Avenida cheia de gente.
Deste pequeno relato, ressaltam duas coisas ou um desejo deliberado de enganar os telespectadores, baralhando-o com duas manifestações que não existiam e depois, no final, quando as pessoas já estavam noutra, dar-se a verdadeira reportagem, ou então uma amostra da grande incompetência que vai por aquela casa. O jornalista que alinhou o noticiário não foi capaz de perceber que as duas primeiras reportagens se referiam ao início da concentração que, como sempre sucede, é em locais diferentes, consoante as áreas laborais, associativas ou partidárias dos manifestantes. O alinhamento no final do Telejornal da intervenção de Carvalho da Silva pode-se também justificar com a chegada tardia da reportagem para ser editada. Mas em qualquer dos casos revelando um desinteresse, que roça mesmo a provocação, que já só se justifica pelo fim de festa homens do PS na Televisão Pública.
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