Claude Chabrol morreu recentemente e a blogosfera, como é seu costume, nestes assuntos de necrologia, teve a preocupação de lhe prestar uma homenagem relembrando cada qual as obras que mais gostava (por exemplo, ver aqui).
João Tunes, um bilioso blogonauta do Vias de Facto e de Água Lisa resolveu, na sua constante guerra com os fantasmas do seu passado, participar nessas homenagem.
Dado que Chabrol não era dos meus autores preferidos, apesar de haver um conjunto de filmes que ele fez na sua maturidade que me agradaram especialmente, não pensava escrever nada sobre o assunto. Não pude no entanto resistir depois de ver o post de João Tunes sobre aquele autor. Primeiro começa por escrever: “Para a cinefilia marxista dos anos sessenta e setenta, sectária como convinha à luta e sobretudo entrincheirada nos cineclubes, Chabrol era o “pior” na herética galeria da nouvelle vague. A alguém que foi dirigente de um cine-clube (o ABC Cine Clube Lisboa) não fica bem vir escarnecer da crítica marxista da época “entrincheirada” nos cineclubes, cujo epígono mais conhecido era provavelmente o seu amigo, já falecido, Manuel Machado da Luz, que de facto era colaborador activo daquele cine-clube. Segundo não sei em que provas materiais se baseia para considerar que para aqueles críticos Chabrol era o “pior” da nouvelle vague. Por último, reúne um conjunto de nomes que de facto constituíram a galeria eclética daquilo que se considerou chamar a nouvelle vague, mas depois acrescenta que essa “turma” estava “reunida à volta de uma revista de cinema (os Cahiers du Cinéma) e tão motivada a escrever sobre cinema e praticando um culto fanático pelo cinema americano que levou a maioria dos seus colaboradores a tornarem-se realizadores.”. Ora de facto três, dos sete autores citados, nada tinham a ver com os Cahiers du Cinéma e alguns nem nunca passaram pela crítica de cinema. Do grupo só os quatro primeiros, em que se inclui Chabrol, passou pela crítica naquela revista. Nada tinham a ver com ela Louis Malle, Agnès Varda e Alain Resnais.
João Tunes pergunta depois: “Mas porque calhava a Chabrol o papel de "inimigo nº 1"? Pois, pela forma sem pudor como se assumia como burguês dos quatro costados e pela mestria como contava tudo o que sabia, que era tanto que soava a demais, replicando Hitchcock, sobre as intimidades perversas da burguesia francesa.” Já se conhece a técnica, cataloga-se o autor e depois garante-se, perante a tipificação feita, que a crítica marxista não gostaria de um autor “que se assumia como burguês”. Termina depois o post com a análise à obra de Chabrol sobre a qual nada tenho a acrescentar.
Mas passemos aos factos. Era conhecido que nos cineclubes não havia uma especial predilecção pelos autores da nouvelle vague, principalmente os provindos dos Cahiers du Cinema. Já, pelo contrário, tinha-se um especial carinho por Resnais e Varda. Simplesmente os filmes que constituíram a primeira vaga da nouvelle vague eram completamente desconhecidos em Portugal. Só muito mais tarde é que vimos a primeira obra de Jean-Luc Godard, About de Soufle (O Acossado), de 1960, ou de Chabrol, Le Beau Serge (Vinho Difícil), de 1959. O primeiro filme que se viu de Chabrol em Portugal foi A Double Tour (Pedido de Divórcio), de 1961, que era já o seu terceiro. E que foi, para informação, do João Tunes exibido pelo ABC Cine Clube, em Maio de 1962, com uma crítica favorável.
Depois realiza mais filmes, nos anos 61 e 62, que não são exibidos em Portugal, até que aparece Landru em 1962, que foi igualmente exibido pelo Cine Clube Universitário de Lisboa (CCUL) em 1969, com uma crítica favorável. Enterra-se a seguir, ainda em meados dos anos 60, numa série de filmes policiais que tinham por título o Tigre contra… A partir de 1966 começa finalmente a entrar na problemática que o iria tornar mais ou menos importante com Le Scandale (Champanhe Escandaloso), de 1966.
Desse período é exibido Que la Bête Meure (Requiem por um Desconhecido) de 1969, também no ABC Cine clube, em 1973. Muito mais tarde, já depois do 25 de Abril, o ABC exibe Violette Nozière, de 1979, em 2 de Abril de 1991. Mas por esta altura já o movimento cine clubista não tinha as características que o distinguiram no tempo do fascismo.
Com tudo isto só quero adiantar que se conheciam mal as suas obras da juventude, e que por isso é um bocado de estultícia vir-se afirmar que Chabrol era o nosso principal inimigo. Segundo, o estilo que depois iria caracterizar a sua obra, a descrição da pequena burguesia rural, só é retomado mais tarde, quando a decadência dos cineclubes já é um facto.
Por tudo isto parece-me este post mais uma batalha perdida de João Tunes com os fantasmas do seu passado, que no caso da crítica marxista e das actividades cine clubistas já seria merecedora de uma análise histórica e não de um ajuste de contas.
João Tunes, um bilioso blogonauta do Vias de Facto e de Água Lisa resolveu, na sua constante guerra com os fantasmas do seu passado, participar nessas homenagem.
Dado que Chabrol não era dos meus autores preferidos, apesar de haver um conjunto de filmes que ele fez na sua maturidade que me agradaram especialmente, não pensava escrever nada sobre o assunto. Não pude no entanto resistir depois de ver o post de João Tunes sobre aquele autor. Primeiro começa por escrever: “Para a cinefilia marxista dos anos sessenta e setenta, sectária como convinha à luta e sobretudo entrincheirada nos cineclubes, Chabrol era o “pior” na herética galeria da nouvelle vague. A alguém que foi dirigente de um cine-clube (o ABC Cine Clube Lisboa) não fica bem vir escarnecer da crítica marxista da época “entrincheirada” nos cineclubes, cujo epígono mais conhecido era provavelmente o seu amigo, já falecido, Manuel Machado da Luz, que de facto era colaborador activo daquele cine-clube. Segundo não sei em que provas materiais se baseia para considerar que para aqueles críticos Chabrol era o “pior” da nouvelle vague. Por último, reúne um conjunto de nomes que de facto constituíram a galeria eclética daquilo que se considerou chamar a nouvelle vague, mas depois acrescenta que essa “turma” estava “reunida à volta de uma revista de cinema (os Cahiers du Cinéma) e tão motivada a escrever sobre cinema e praticando um culto fanático pelo cinema americano que levou a maioria dos seus colaboradores a tornarem-se realizadores.”. Ora de facto três, dos sete autores citados, nada tinham a ver com os Cahiers du Cinéma e alguns nem nunca passaram pela crítica de cinema. Do grupo só os quatro primeiros, em que se inclui Chabrol, passou pela crítica naquela revista. Nada tinham a ver com ela Louis Malle, Agnès Varda e Alain Resnais.
João Tunes pergunta depois: “Mas porque calhava a Chabrol o papel de "inimigo nº 1"? Pois, pela forma sem pudor como se assumia como burguês dos quatro costados e pela mestria como contava tudo o que sabia, que era tanto que soava a demais, replicando Hitchcock, sobre as intimidades perversas da burguesia francesa.” Já se conhece a técnica, cataloga-se o autor e depois garante-se, perante a tipificação feita, que a crítica marxista não gostaria de um autor “que se assumia como burguês”. Termina depois o post com a análise à obra de Chabrol sobre a qual nada tenho a acrescentar.
Mas passemos aos factos. Era conhecido que nos cineclubes não havia uma especial predilecção pelos autores da nouvelle vague, principalmente os provindos dos Cahiers du Cinema. Já, pelo contrário, tinha-se um especial carinho por Resnais e Varda. Simplesmente os filmes que constituíram a primeira vaga da nouvelle vague eram completamente desconhecidos em Portugal. Só muito mais tarde é que vimos a primeira obra de Jean-Luc Godard, About de Soufle (O Acossado), de 1960, ou de Chabrol, Le Beau Serge (Vinho Difícil), de 1959. O primeiro filme que se viu de Chabrol em Portugal foi A Double Tour (Pedido de Divórcio), de 1961, que era já o seu terceiro. E que foi, para informação, do João Tunes exibido pelo ABC Cine Clube, em Maio de 1962, com uma crítica favorável.
Depois realiza mais filmes, nos anos 61 e 62, que não são exibidos em Portugal, até que aparece Landru em 1962, que foi igualmente exibido pelo Cine Clube Universitário de Lisboa (CCUL) em 1969, com uma crítica favorável. Enterra-se a seguir, ainda em meados dos anos 60, numa série de filmes policiais que tinham por título o Tigre contra… A partir de 1966 começa finalmente a entrar na problemática que o iria tornar mais ou menos importante com Le Scandale (Champanhe Escandaloso), de 1966.
Desse período é exibido Que la Bête Meure (Requiem por um Desconhecido) de 1969, também no ABC Cine clube, em 1973. Muito mais tarde, já depois do 25 de Abril, o ABC exibe Violette Nozière, de 1979, em 2 de Abril de 1991. Mas por esta altura já o movimento cine clubista não tinha as características que o distinguiram no tempo do fascismo.
Com tudo isto só quero adiantar que se conheciam mal as suas obras da juventude, e que por isso é um bocado de estultícia vir-se afirmar que Chabrol era o nosso principal inimigo. Segundo, o estilo que depois iria caracterizar a sua obra, a descrição da pequena burguesia rural, só é retomado mais tarde, quando a decadência dos cineclubes já é um facto.
Por tudo isto parece-me este post mais uma batalha perdida de João Tunes com os fantasmas do seu passado, que no caso da crítica marxista e das actividades cine clubistas já seria merecedora de uma análise histórica e não de um ajuste de contas.
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