
Sobre estes dois textos escreverei a seguir, quero no entanto dar a minha impressão subjectiva sobre o que penso da maçonaria.
Há tempos fui proferir uma conferência a um grupo de “rotários” que se reunia regularmente em jantares. A conferência era sobre o meu trabalho como biólogo, mais concretamente sobre organismos geneticamente modificados (OGM). Quando dei por mim vi-me envolvido numa série de práticas não tão absurdas como as da maçonaria, mas igualmente ridículas, que me causaram algum mal-estar, mas, como não queria ser indelicado para quem me tinha convidado, aceitei participar nelas. Não sei se na maçonaria também se verifica o mesmo, quando, nos seus encontros, convida algum “profano” a dar uma conferência? Como nunca fui a nenhuma, desconheço.
O texto de Gramsci que o meu amigo referia era a intervenção daquele no Parlamento Italiano, nessa altura já dominado pelos fascistas. O texto está publicado em português (Escritos Políticos, vol. IV, Seara Nova, 1978).
Gramsci afirma que a maçonaria, “dada a fraqueza inicial da burguesia capitalista italiana”, “foi o único partido real e eficiente que a classe burguesa teve por muito tempo” (pag. 30). Hoje, sabendo-se que os principais próceres do liberalismo português, do século XIX, eram mações, não andaremos muito longe da realidade se afirmarmos que o mesmo aconteceu em Portugal. Quem eram, em Itália, os principais inimigos desta política seguida pela burguesia maçónica? Era o Vaticano e os jesuítas que defendiam as “velhas classes semi-feudais, tendencialmente burbónicas no Sul ou tendencialmente austriazantes no Lombardo-Veneto” (pag. 31). Para os cinéfilos podemos recorrer a dois exemplos marcantes destes dois casos que nos são dados pelos belos filmes de Visconti, O Leopardo, sobre os agrários do Sul, que provisoriamente fizeram uma aliança com a burguesia em ascensão, e o Sentimento que nos mostra a resistência dos patriotas burgueses contra as classes aristocráticas amigas dos austríacos. E continua Gramsci “a lei contra a maçonaria não é prevalentemente contra a maçonaria, o fascismo chegará facilmente a um compromisso comos mações” (pag. 36), “a lei é feita especialmente contra as organizações operárias” (pag. 37).
O meu amigo só tinha feito referência ao discurso de Gramsci no Parlamento italiano, mas eu lembrava-me de já ter lido qualquer coisa daquele revolucionário sobre o Rotary Club e a Maçonaria. Assim, nos Cadernos do Cárcere, na parte dedicada ao Americanismo e Fordismo (vol. IV, Civilização Brasileira, Rio de Janeiro, 2007) Gramsci afirma que o “Rotary é uma maçonaria sem os pequeno burgueses e a mentalidade pequeno-burguesa” (pag. 248), e mais adiante afirma “o Rotary não pode ser confundido com a maçonaria tradicional, sobretudo com a dos países latinos. Trata-se de uma superação orgânica da maçonaria e representa interesses mais concretos e precisos. Característica fundamental da maçonaria é a democracia pequeno-burguesa, o laicismo, o anticlericalismo, etc. O Rotary é a organização das classes altas e só se dirige ao povo indirectamente. É um tipo de organização essencialmente moderna.” (pag. 298) E depois continua desenvolvendo este tema, que só por limitações de espaço não transcrevo.
Depois da leitura deste pequeno trecho de Gramsci percebe-se porque é que os nossos republicanos eram na sua maioria mações e como essa tendência prevaleceu no PS, estendendo-se hoje, já muito desligada da realidade inicial, à pequeno-burguesia arrivista do PSD.
Depois de lido esta posição de Gramsci e o delicioso ataque de Fernando Pessoa ao deputado da Assembleia Nacional que propôs a proibição das associações secretas (texto para o qual forneço link), só me resta acrescentar que a posição da Ministra da Justiça e a facilidade com que alguns partidos da esquerda deram cobertura a tais posições, ou seja, o dos mações candidatos a cargos públicos terem de declarar se pertencem ou não a tal associação, são hoje intoleráveis, porque na prática visam menorizar a liberdade de associação e, em último lugar, as associações políticas e partidos não favoráveis ao Governo. Depois do Expresso relatar uma reunião dos deputados do PSD em que estes chegaram a pedir a criminalização dos jornalistas e alterações à Lei de Imprensa, porque não gostaram da forma como esta tratou a nomeação de boys para os cargos públicos, tudo já é possível.
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